Dez coisas surpreendentes que a ciência já descobriu sobre nós este ano

O nosso coração começa a bater uma semana mais cedo do que se pensava e o prazo de validade do ser humano pode não ir além dos 115 anos. No tempo em que se buscam novas curas, algumas descobertas da ciência sobre nós próprios podem parecer mundanas, mas não deixam de surpreender. O futuro é…

Diz-me o tamanho dos teus dedos

Os investigadores estão cada vez mais convencidos de que o comprimento dos dedos tem algum significado. O último estudo foi divulgado este mês por um investigador norueguês. Carl Pintzka explorou a tese de que os adultos com anelar mais comprido do que o indicador foram expostos a mais testosterona no ventre materno, o que levaria, no caso das mulheres, a um melhor sentido de orientação espacial (competência mais afinada nos homens). Pintzka pôs a teoria à prova com 42 cobaias e concluiu que tanto as que tinham esta aparente vantagem de base como as que tomaram testosterona se saíam melhor em tarefas de rotação mental, o que pode dar vantagem no desporto. Há, porém, “contraindicações”: os anelares mais longos já foram ligados a maior risco de autismo. A estranha ciência dos dedos não se fica por aqui. Um estudo britânico concluiu, em 2015, que anelares mais longos estão ligados a uma menor tendência para ser fiel.

 

O meu cérebro não me deixou ir ao ginásio

Um estudo divulgado em agosto na revista científica “Journal of Health Psychology” veio dar uma nova desculpa aos mais preguiçosos no que toca ao desporto. Uma equipa da Florida Gulf Coast University investigou um grupo de estudantes e concluiu que os tinham maior necessidade de atividade cognitiva tinham menor atividade física, sendo que a diferença era menos acentuada ao fim-de-semana. Para aferir os níveis físicos, a equipa usou um dispositivo para medir a atividade motora (a técnica de actigrafia também usada para despistar alterações no sono). Já a atividade mental foi avaliada com uma escala criada em 1984 para medir a “necessidade de cognição” de cada indivíduo. Pode sempre pesquisar pela escala online para ver se é por ter nota elevada que não consegue sair do sofá, mas tem de preferir problemas complexos aos simples e gostar de desafios abstratos, não basta ser dos que cola com facilidade à televisão.

 

De quanta água precisamos? É prestar atenção à garganta

Beber oito copos de água por dia, litro e meio, dois litros. Os conselhos são muitos e nem sempre batem certo. Agora, cientistas da Universidade Monash, nos Estados Unidos, acabam de tornar o dossiê da hidratação um pouco mais complexo. Num estudo publicado este mês na revista “Proceedings of the National Academy of Sciences” revelam, pela primeira vez, um mecanismo que regula a ingestão de fluidos e nos impede de beber em excesso. Apesar de ser algo complexo, coordenado pelo cérebro, tem um sinal bem visível: ao beber em demasia, temos mais dificuldade em engolir. “Se fizermos o que o nosso corpo nos pede, provavelmente acertamos”, defendeu o autor do estudo Michael Farrell, recusando a tese dos oito copos muito popular nos EUA, mas alertando, ainda assim, que os idosos tendem a beber menos água do que deviam.

 

Prazo de validade: 115 anos?

A esperança de vida tem estado a aumentar e Portugal não é exceção: os últimos dados do INE revelam que a esperança de vida aumentou um ano desde o início da década e atingiu 77,36 anos para os homens e 83,23 anos para as mulheres. Apesar da tendência, atribuída aos avanços da medicina e melhores condições de vida, há quem esteja desconfiado de que o ser humano tem um prazo de validade. Um artigo publicado na “Nature” alega que a esperança de vida depois dos 110 anos não tem aumentado e que a idade da pessoa mais velha no mundo não sobe desde os anos 90. Os autores apontam 115 anos como o prazo de validade normal dos seres humanos, ainda que alguns (poucos) vivam mais. Jeanne Calment (1875-1997) bateu todos os recordes: a francesa viveu 122 anos e 164 dias. Em Portugal, o maior registo cabe a Maria de Jesus. A centenária de Vila Nova de Ourém chegou aos 115 anos e 114 dias.

 

Filhos de mães obesas nascem até dez anos "mais velhos"

Uma equipa de investigadores belgas descobriu que os filhos de mães com índices de massa corporal elevados nascem com um envelhecimento biológico mais avançado do que seria normal. O estudo foi publicado esta semana na revista “BMC Medicine” e vem reforçar o alerta para a necessidade de uma gravidez o mais saudável possível. Em causa estão os telómetros que protegem os nossos cromossomas como se fossem atacadores dos sapatos e vão diminuindo cada vez que as nossas células se multiplicam – fenómeno já ligado a doenças de envelhecimento e alguns cancros. Os investigadores analisaram 743 bebés e descobriram que os que tinham mães com excesso de peso tinham telómeros 2,5% mais curtos do que os filhos de mães com peso saudável. Já os bebés de mães obesas tinham uma redução de 5,5%, o que só devia acontecer depois de cinco a dez anos de vida.

 

Bate, bate coração

É um dos primeiros momentos mágicos da gravidez: o médico liga o ultrassom e ouvem-se os primeiros batimentos cardíacos do filho, muito antes de se saber se será menino ou menina. Pensava-se que os primeiros batimentos só surgiam entre os 22 e 25 dias de gestação, mas uma nova experiência com ratinhos (o modelo mais próximo de nós já que não são feitos estudos deste género com embriões humanos) revelou que o coração – na sua forma mais primitiva – começa a bombear sangue 16 dias após a conceção, uma semana mais cedo do que se pensava. Mais do que uma nova informação para alimentar o nervosismo dos pais se não o conseguirem ouvir tão cedo, a equipa de Oxford que fez a descoberta acredita que saber exatamente quando e como começa a atividade cardíaca nos fetos pode permitir despistar mais cedo problemas do foro cardíaco que possam surgir durante o desenvolvimento.

 

A dor de perder alguém não é só psicológica

Investigadores dinamarqueses estudaram a relação entre a perda de um ente querido e batimentos cardíacos e descobriram que o luto parece alterar a frequência cardíaca, sobretudo nas pessoas com menos de 60 anos e que não esperavam a morte. O estudo, publicado em abril na revista “Open Heart”, analisou 88 612 casos de fibrilação atrial registados entre 1995 e 2014 e um grupo de 886 mil controlos. Descobriram que entre os 88 mil casos, 17 mil pessoas tinham perdido alguém. O risco de arritmia parece ser maior oito a 14 dias depois da perda mas, passado um mês, é ainda 41% superior ao do grupo que não passou por uma situação do género, o que os investigadores defendem que vem clarificar o maior risco de doenças cardiovasculares agudas como enfarte em períodos de stresse psicológico. O risco de arritmia só passa ser idêntico ao dos que não passaram por uma perda ao fim de um ano.

 

E depois da amamentação? As mamas autodestroem-se

Como é que o peito volta ao normal depois da amamentação? O facto é que acontece (com mais ou menos sequelas, diga-se) e a ciência tem uma nova resposta. Em setembro, cientistas britânicos revelaram um mecanismo molecular que faz com que as células que segregam leite sejam eliminadas quando morrem sem que isso resulte num processo de inflamação exagerado. Numa situação normal, o sistema imunitário começaria a atacar as células inutilizadas mas os cientistas descobriram que a mesma proteína que leva as células mamárias a segregar leite faz com que, no final do processo, as células normais engulam as vizinhas e os restos de leite. A autodestruição com um toque de canibalismo não é só uma curiosidade: amamentar está ligado a um menor risco de cancro de mama e os cientistas acreditam que a proteína Rac1 pode ajudar a perceber o efeito protetor.

 

Uma questão de gases

A ideia de que temos mais bactérias dentro de nós do que células ainda custa a processar, mas nos últimos tempos houve mais um trabalho curioso: num artigo publicado em julho, investigadores de Moscovo chamam a atenção para a importância dos gases que resultam da interação destas bactérias. Não são apenas lixo à espera de ser expelido, são fonte de energia até para algumas destes organismos que hoje se sabe serem cruciais no sistema imunitário, mas parecem ter um papel mais acima, no cérebro. Como assim? “O nosso cérebro usa gases como sulfeto de hidrogénio, amoníaco e até monóxido de carbono para transferir informação de umas células para as outras”, explicou Alexander Oleskin. “As bactérias que habitam o nosso corpo, em especial os intestinos, formam gasotransmissores que afetam o nosso cérebro, mente e comportamento”. É caso para pensar duas vezes quando tiver a próxima crise de flatulência.

 

Partículas de poluição no nosso cérebro?

Segundo o último balanço da Organização Mundial de Saúde, a poluição mata sete milhões de pessoas todos os anos e está por detrás de doenças cardíacas, doenças respiratórias crónicas ou mesmo infeções agudas, em particular em crianças. Este ano, um novo artigo veio reforçar a teoria de que a poluição pode também estar a contribuir para a epidemia de doenças neurodegenerativas como Alzheimer. Investigadores da Universidade de Lancaster encontraram partículas de óxido de ferro nos cérebros de 37 pessoas. Os investigadores dizem que é normal a formação deste tipo de partículas no cérebro, em particular em algumas demências, mas estas tinham marcas claras de resultar de tubos de escape de carros e emissões industriais, “de onde quer que se esteja a queimar combustível”, disse Barbara Maher, autora do estudo, alertando para o efeito tóxico.