O insustentável peso dos juros da dívida

A primeira subida de juros do ano e a segunda em quase uma década nos EUA contagiou o mercado das obrigações na Europa. Após a decisão da Fed (ver texto ao lado) subiram em todos os prazos e os juros a dez anos das obrigações portuguesas aumentaram para quase 4%.

A questão dos juros é decisiva para a evolução da economia portuguesa e com as limitações do BCE em continuar a apoiar a economia tornam cada vez mais urgente uma política orçamental que permita debelar os constrangimentos estruturais do país.

Estes avisos têm sido reiterados por diversas entidades. O boletim económico de Dezembro de 2017 do Banco de Portugal (BdP), divulgado na quarta-feira, frisava esse ponto e já no início da semana o Conselho das Finanças Públicas (CFP) alertava para a dificuldade do país conseguir aguentar juros mais elevados.

Ainda ontem indicadores coincidentes revelados pelo BdP apontavam para um menor crescimento do consumo privado e estabilização da atividade económica. Este subiu 0,6% em novembro, menos que os 0,9% em outubro e o crescimento do consumo privado baixou no mês passado em relação a outubro de 2% para 1,9%.

Estes indicadores procuram antecipar os movimentos da economia e nas previsões reveladas a meio da semana o BdP prevê que o consumo privado será de 1,3% em 2017 e 2018 e 1,4% a 2019.

O banco central estima que o Produto Interno Bruto deverá subir ser de 1,4% em 2017, e 1,5% em 2018 e 2019, assente nas exportações e do investimento.

Segundo o documento, as exportações terão uma «aceleração em 2017 em linha com a procura externa» manterão «um crescimento robusto em 2018-2019 consistente com a manutenção de ganhos de quota de mercado». Já o investimento terá uma recuperação da Formação Bruta de Capital Fixo, sempre com taxas acima de 4% nos próximos três anos, em «particular da componente empresarial, após uma queda em 2016».

O Banco de Portugal defende que em 2017 terá um «padrão de crescimento mais sustentado» mas alerta para a «persistência dos constrangimentos estruturais ao crescimento».

Para os combater é «crucial que o processo de reformas estruturais seja aprofundado» tal como um «esforço adicional de consolidação orçamental».

A questão da dívida pública está também na análise do documento do BdP, que salienta «a natureza temporária do conjunto alargado e medidas não convencionais de política monetária na área do euro reforça a urgência e importância de progressos estruturais».

Mudança

De acordo com a presidente do Conselho das Finanças Públicas, «o problema é que temos uma dívida muito elevada e por enquanto os juros estão muito baixos porque as políticas monetárias têm ido nessa direcção» . No entanto, Teodora Cardoso alerta para a mudança vinda da política norte-americana: «Sem fazermos nada, sem ser nossa responsabilidade, as taxas de juro a que nos financiamos subirão».

Para a economista, aguentar uma taxa de juro de 5% «é extremamente difícil, e cada vez mais difícil», sobretudo porque «implica uma restrição cada vez maior em termos orçamentais». Teodora Cardoso lembra que «já temos dificuldades em nos mantermos» nos atuais níveis de dívida e défice e se estes se agravarem «é evidente que isso terá impacto sobre a economia e sobre a política económica». A presidente do Conselho das Finanças Públicas defende que «temos de ser capazes de convencer os mercados de que estamos a pôr em prática uma política que efetivamente vai resolver os problemas».

A política de estímulos do Banco Central Europeu (BCE), que começou em maio de 2012 com o discurso de salvar o euro «whatever it takes» e em junho de 2015 prosseguiu com o programa de Quantitative Easing, vai terminar no fianal de 2017.

Sem o seu efeito Portugal estaria a pagar juros a 5%, tendo em atenção os chamados fundamentos da economia portuguesa e olhando para o histórico a longo prazo.

O BdP lembra que esta política permite manter as taxas de juro baixas, mas que com o crescimento baixo da economia será preciso um esforço adicional para conseguir excedentes primários (o saldo primário é o resultado das contas públicas exceptuando os juros) para se conseguir baixar a dívida.

A instituição liderada por Carlos Costa alerta para a necessidade de sustentar os excedentes primários. Para o fazer, além das reformas estruturais, as finanças públicas terão de estar sob estreito aperto e controlo. «A prossecução de um esforço adicional de consolidação orçamental é crucial para que o nível de endividamento público apresente uma trajetória descendente sustentada e robusta a choques adversos», alerta a instituição liderada por Carlos Costa.