Política em direto

A política está, definitivamente, a mudar. Rui Moreira, presidente da câmara do Porto, já ‘salvou’ um grupo de munícipes que tinha ficado fechado num parque de estacionamento e que resolveu pedir ajuda ao autarca através do Facebook. E André Couto, presidente da junta de freguesia de Campolide, em Lisboa, faz vídeos em direto para esclarecer…

Já é uma verdade La Palice dizer que as redes sociais assumiram o papel de mediador de muitos contactos e que se tornaram num suporte diariamente usado por todos, até porque são uma forma fácil e – acima de tudo -, muito rápida para transmitir mensagens. A política não é exceção. Muitos são os políticos que usam os seus perfis para deixar recados, partilhar links e responder, de forma mais ao menos direta, aos variados assuntos. Rui Moreira é um dos autarcas que faz questão de responder, pessoalmente, às interpelações que lhe fazem nas redes sociais. 

Este é apenas um exemplo de uma nova geração de políticos que, além dos já tradicionais ‘comunicados’ deixados nas páginas do Facebook ou das ideias difundidas no Twitter, começa a usar as redes sociais como uma forma de chegar aos cidadãos. Sem barreiras, sem filtros. Esqueça as mensagens privadas. Falamos dos ‘lives’ do Facebook – que são, ao fim ao cabo, vídeos em direto – em que as pessoas colocam perguntas e, do outro lado, os políticos vão respondendo às dúvidas. 

Em Portugal, este sistema começa a ser realidade especialmente quando falamos do poder local. Fernando Medina, por exemplo, já o fez. Mas há um jovem autarca, presidente da junta de freguesia de Campolide e deputado municipal da câmara de Lisboa que quer levar os vídeos em direto para outro campeonato.

Inspiração do futebol 

Há menos de um mês, André Couto, 34 anos, ouviu na rádio que o futebolista Bernardo Silva tinha feito um destes diretos. «Pensei que se um jogador de futebol fazia vídeos a responder a perguntas sobre a sua carreira, porque não poderia usar este método para prestar esclarecimentos sobre as minhas funções?», conta ao SOL. 

Daí a criar um espaço de direto semanal no seu perfil público do Facebook, em que responde aos moradores da freguesia de Campolide, passou menos de uma semana. Todas as quintas-feiras, às 11h00, André Couto senta-se ao computador, liga a sessão e vai esclarecendo as dúvidas que lhe chegam. 

A segunda destas sessões aconteceu na quinta-feira. «Na semana passada pensei fazer uma espécie de edição zero, divulgámos pouco, queria ver como corria», conta. Acabou por receber dezenas de perguntas e a hora prevista para o vídeo estendeu-se por quase 1h30. 

Esta quinta-feira, durante o direto a que o SOL assistiu – e que pode ser consultado online – o presidente da junta respondeu a perguntas sobre trânsito, obras em alguns locais específicos da freguesia e até sobre passadeiras. 

No final, um balanço. «Está a correr melhor do que aquilo que pensava, as pessoas estão a aderir». Questionado sobre a forma como se prepara para conseguir responder, sem rede, a tudo o que cair na caixa de comentários, é direto: «Essa preparação é feita no trabalho do dia a dia». 

Todos se podem dirigir ao autarca durante os vídeos. Quem não conseguir, também pode deixar as questões por mensagem privada. Mas há limites: «O que espero do outro lado é que as pessoas correspondam a este momento, que para mim é um momento nobre. Podem criticar a minha ação política, podem fazer sugestões, podem discordar, podem fazer elogios. Não podem ser mal educados ou insultar-me, a partir do momento em que o façam, termina o diálogo». 

Uma questão de proximidade

Para André Couto, esta experiência é duplamente importante. A primeira é para deixar memória futura. «Os vídeos ficam online e as pessoas depois podem perceber se as promessas foram cumpridas». 

A segunda resume-se na palavra que assume como mantra da sua ação política: proximidade. 

«A primeira vez que fui eleito, em 2009, tinha 26 anos. E quis pensar o exercício destas funções como um cidadão comum. O que sentia falta quando olhava para os políticos era proximidade, era poder ter uma resposta deles: uma satisfação, em última análise», começa por contar. 

Desde então, são várias as medidas que o autarca tem tomado para diminuir o fosso entre os políticos e os cidadãos. Desde atendimentos individuais aos habitantes da freguesia (a partir de 2009, já fez 2156) a comunicados específicos por rua, são vários os exemplos. 

Para André Couto, estes vídeos são apenas mais uma forma de diminuir o gap. «Vivemos, há alguns anos, uma crise da democracia e acho que essa crise foi sobretudo devida a uma distância entre os eleitores e os eleitos», resume. «Tenho esperança de que esta nova geração de políticos se afirme e faça as coisas com mais competência, com mais preparação e proximidade. Acho que é o caminho certo. Dá muito mais trabalho mas é muito mais gratificante», garante.

Da parte que lhe toca, este é o caminho que irá seguir. E os diretos de Facebook vão continuar enquanto as pessoas «virem utilidade neste instrumento». 

O campeão dos gostos 

 Sabe quem é o político português com mais seguidores no Facebook no país? Rui Moreira. Neste momento, há quase 130 mil pessoas que seguem a página do autarca, que chega a ter um alcance de um milhão e meio de pessoas por semana. 

O presidente da câmara do Porto ainda não fez nenhum vídeo em direto, mas a sua relação diária com os munícipes através da internet concede-lhe entrada em direto para estas páginas. 

Durante a campanha eleitoral, em 2013 [antes dos lives do Facebook, portanto] fez uma aproximação: sentava-se na sede de campanha ao fim da tarde e respondia por escrito, em direto, às perguntas que lhe iam colocando. 

Hoje em dia, continua a fazê-lo e responde aos cidadãos nos posts. Uma interação que já tem a sua cota parte de momentos caricatos. «Lembro-me de um senhor que desconfiou que não fosse eu a responder. Devolvi um comentário com uma selfie minha e o jornal do dia», disse Rui Moreira ao SOL. Mas há mais: «Umas pessoas distraíram-se e ficaram presas dentro de um parque público que encerra à noite. Não conseguiam sair e não sabiam a quem ligar. Enviaram-me uma mensagem no Facebook. Dei-lhes, também em privado, o meu número de telefone e pedi que me ligassem, para ter a certeza que não era uma brincadeira. Falei com elas e resolvi-lhes a questão. Ficaram espantadas por estarem a resolver a questão, ao telefone, com o presidente da Câmara», revela. 

Com uma agenda cheia, todos os tempos mortos servem. «Aproveito viagens de automóvel e intervalos entre reuniões para responder», explica. 

 Para Rui Moreira, a interação sem filtros entre os eleitos e eleitores é importante e os meios digitais são uma das vias para esse diálogo, mas não estão no topo da lista. «O Facebook é um ótimo barómetro. Mas devemos saber ler e relativizar. O mundo digital é importante, mas o mundo real é mais». 

Questionado sobre se esta é uma forma de aproximar a política e o cidadão – e que pode até servir para credibilizar a imagem dos políticos – o autarca acredita «que pode ajudar, mas não deve nunca ser a única ou até a preferencial». 

Por isso, deixa um pedido para que o caminho entre os cidadãos e políticos seja percorrido por ambos. «As pessoas não podem limitar-se a participar nas redes. A sua ação cívica tem que ir mais longe. E esse é o perigo destes meios. A certa altura, por porem um gosto, as pessoas acham que já cumpriram o seu dever cívico e abstêm-se de outras formas».