Jean-Claude, europeo vero!

A 25 de março de 2007, os líderes dos 27 membros da União Europeia reúnem-se em Berlim para celebrar os 50 anos do Tratado de Roma. Apesar do impasse institucional, o ambiente é de eurotimismo. Durão Barroso e Angela Merkel querem reforçar a posição europeia de ‘gigante económico’. Como ninguém no clube quer que a…

Uma década depois, os sonhos de grandeza europeia estão em cacos.

Vergastada por nacionalismos, hostilizada pela Rússia, menorizada pela administração americana, pressionada pelos refugiados, perseguida pelo terrorismo radical islâmico, afastada dos seus cidadãos e ameaçada pelas tendências separatistas, a Europa chega aos 60 anos com muita gente cheia de vontade de a obrigar a apresentar a papelada para a reforma. 

Hoje, em Roma, no sexagésimo aniversário dos Tratados que instituíram a CEE, é Jean-Claude Juncker que fala ao povo europeu. Podia pedir emprestada a primeira linha do discurso de Churchill em Zurique, 1946: «Desejo falar-vos da tragédia da Europa». Mas fazendo justiça a Sir Winston, um dos pioneiros dos Estados Unidos da Europa, talvez as lideranças comunitárias sejam muito mais realistas se adaptarem o seu popular aforismo sobre a democracia: a União é a pior forma de Europa com exceção de todas as outras conhecidas e tentadas de tempos a tempos.  

Em Roma, a Europa regressa às origens. E essa viagem simbólica não deverá ser desperdiçada nos discursos. Esqueça as narrativas sobre défices, mercados, união bancária ou pacto de estabilidade – essa é a Europa de que os cidadãos nem querem ouvir falar. Já Jacques Delors dizia que não nos apaixonamos pelo mercado.
Há, contudo, três objetivos retóricos que, neste quadro, Juncker quer atingir. 

Primeiro objetivo: mostrar unidade. Mandando o Brexit para trás das costas, a Europa vai forçar a nota do «melhor juntos que separados». A escala dos desafios – do aquecimento global aos refugiados, do belicismo russo ao terrorismo – evidencia a insuficiência nacional. Paradoxalmente, é no tempo em que o supranacionalismo parece ser mais necessário que a renacionalização política ganha terreno.    

Segundo objetivo: mostrar liderança. Depois da vitória dos moderados na Holanda, o momentum está temporariamente do lado das forças pró-europeias. Bruxelas quererá aproveitar para determinar os termos da discussão. Juncker e Tusk têm de ser claros na identificação dos riscos, sobretudo dos provenientes das forças populistas, ao mesmo tempo que apresentam aos cidadãos uma visão para o futuro.  

Terceiro objetivo: mostrar ousadia. «Para que serve a Europa?». é a pergunta que muitos cidadãos fazem. Bruxelas tem obrigação de lhes dar a resposta certa. A dissertação sobre os valores (democracia, paz, estado de direito, liberdade) é importante. Mas as pessoas nas ruas de Lisboa a Varsóvia estão preocupadas com questões muito mais prosaicas como o emprego e segurança. Juncker sabe-o e quer reconstruir a ponte entre Bruxelas e os cidadãos com propostas ambiciosas – como o salário mínimo europeu ou o combate à precariedade laboral. 

Suficiente para salvar a União dos seus vícios? Ninguém sabe. Mas pelo menos, em Roma, num palácio com o traço de Miguel Ângelo, talvez se assista ao Renascimento da Europa social.