PSD. Leal Coelho criticou Ventura sem falar com Passos

A candidata do PSD à Câmara Municipal de Lisboa acusou André Ventura de discriminação mas Passos Coelho manteve o apoio ao autor da polémica acerca da etnia cigana.

Nem um centímetro. Foi aquilo que mexeu o apoio do PSD a André Ventura depois da polémica em torno da etnia cigana que envolveu o candidato à Câmara Municipal de Loures.

Apesar de ontem Teresa Leal Coelho ter vindo repudiar publicamente as declarações de Ventura sobre aquela minoria (“perpetuam os preconceitos e estigmatizam comunidades”), Pedro Passos Coelho segurou o candidato.

Teresa a jogar sozinha

Ao que o i apurou, a direção social-democrata não apreciou o facto de Leal Coelho avançar – sem aviso prévio – com críticas contra André Ventura, que tal como ela é militante e conselheiro nacional do partido.

“Ela é vice-presidente do partido, tem uma proximidade assumida ao líder e é candidata à Câmara da capital. Não pode jogar sozinha. Ninguém gostou”, aponta fonte próxima da sede nacional. “Se é candidata a Lisboa deve falar sobre Lisboa; se fala sobre o resto do país está a falar como vice de Passos e isso tem um peso”.

Ou tinha.

É que depois de Leal Coelho criticar André Ventura (“Não nos revemos nem em pensamento, nem em discurso de natureza”), Passos fez questão de não deixar cair o candidato que apresentará dias antes em Loures. As “muitas venturas” que o líder da oposição desejou na passada quinta-feira ao professor universitário e comentador mantêm-se, inclusive após o CDS-PP retirar o seu apoio à candidatura conjunta ao município, hoje presidido por Bernardino Soares, do Partido Comunista.

As entrelinhas

Na entrevista que suscitou a polémica de foro já nacional, Ventura havia admitido que Leal Coelho parte “de uma posição de fragilidade” enquanto candidata a Lisboa devido ao modo como o processo de seleção fora conduzido, além de referir que a sua pertença à antiga direção de Vale Azevedo não corresponde “a currículo”.

Prevendo que Leal Coelho terá que “trabalhar a dobrar” para ter um bom resultado, Ventura não deixou de declarar o seu apoio e considerá-la “competentíssima”. Nesse dia, contudo, a vice do PSD condenaria a mesma entrevista, ainda que por razões aparentemente distintas. Ventura considerara seu “dever, como candidato”, a denúncia da etnia cigana por esta achar que “as regras não são para lhes serem aplicadas” e Leal Coelho respondera que “a diversidade e a multiculturalidade devem ser plenamente respeitadas”.

E Ventura fica mesmo

Pedro Pinto, próximo de Passos e recém-eleito presidente da distrital do PSD/Lisboa, afirmou ao i que “com certeza que o PSD mantém o apoio ao candidato André Ventura”. Para Pinto, a entrevista [ao i] que suscitou a polémica “foi mal-interpretada por muita gente”, destacando o facto de Ventura já ter feito “um esclarecimento”.

“Não faz o mais pequeno sentido pôr em causa a candidatura dele. O PSD/Lisboa mantém a confiança na candidatura”, conclui Pedro Pinto ao i, depois de João Gonçalves Pereira, seu homólogo do CDS, anunciar o cancelamento da coligação para Loures.

“O CDS seguirá o seu caminho próprio no Concelho de Loures nestas eleições autárquicas de 2017”, informou Gonçalves Pereira, também porta-voz de Assunção Cristas, depois de no dia anterior já ter exigido um esclarecimento “cabal” a André Ventura.

Os centristas, de Cristas à concelhia local, ainda tentaram segurar o acordo, sugerindo uma mudança de candidato, mas o PSD fez finca-pé. Passos não deixou Ventura cair. “Foi firme. Nem deu hipótese”, descreve fonte próxima do líder do PSD. O Partido Popular Monárquico (PPM) deverá manter-se em coligação com os ‘laranjas’.

Num comunicado enviado às redações, Ventura afirmou ontem alguma “surpresa” perante a opção do CDS, que terá agora um candidato seu, mas realçou a vontade de “seguir o seu caminho triunfante até dia 1 de Outubro, com o apoio expresso do PSD e do PPM”.

“A candidatura aproveita para reforçar que está totalmente empenhada em apresentar e defender junto da população lourense o seu projeto político. É para as pessoas que faço política e sinto nelas uma força cada vez maior, não só em Loures mas no país inteiro”, pode ler-se no documento do homem que saltou para os holofotes após defender que a etnia cigana deveria “interiorizar o manual do Estado de Direito” e cessar o seu sentimento de “impunidade”.

Ainda que na entrevista Ventura tenha saudado a coligação com o CDS-PP (“A ideia de uma coligação com dois grandes partidos (PSD/CDS) para a Câmara de Loures faz crer que, pela primeira vez, é possível chegar lá”), o i sabe que a saída do CDS não apoquenta a candidatura na medida em que o eleitorado de direita em Loures é de dimensão escassa.

Passos faz ouvidos moucos

A posição, até já pública, de Passos Coelho em defesa de André Ventura ignora assim a exortação formal do Partido Socialista. Esta segunda-feira, o PS firmou em conferência de imprensa que se Passos mantivesse a confiança política no candidato a Loures estaria a “semear o discurso da intolerância, do racismo e da xenofobia”.

Ontem, à porta do jantar de fim de legislatura da bancada do PSD, Passos Coelho afirmou que fora “importante que ele [Ventura] tivesse oportunidade de clarificar as suas declarações” e que “a candidatura deve seguir em frente”. E seguiu.