Calçada portuguesa, património mundial

Quando bem aplicada, a calçada portuguesa assegura todas as exigências de conforto e segurança

Foram esta semana lançadas as bases para o reconhecimento da calçada portuguesa como ‘património imaterial da humanidade’. Deste modo, Lisboa e Portugal afirmam a sua identidade e salvaguardam o seu património, divulgando a cultura. O chão que pisamos é história, cultura e arte. A calçada portuguesa pode e deve ser compatível com as exigências de conforto e segurança. Estes são os desafios.

A decisão da Câmara de Lisboa em se associar a diversas entidades públicas e privadas com o objetivo de preservar, promover e valorizar a calçada portuguesa, bem como de alcançar a classificação de património da humanidade, constitui um marco para a afirmação da identidade de Lisboa no mundo.

A calçada portuguesa inspirou-se nas técnicas de pavimentação utilizadas por romanos e árabes, tendo sido adaptada e desenvolvida tendo em conta os materiais disponíveis e de modo a corresponder às necessidades de utilização.

Com as características que tem hoje, começou a ser utilizada em Lisboa no século XIX, primeiro no Castelo de São Jorge (então uma prisão), aplicada por presidiários a mando do governador de armas do castelo: o tenente-general Eusébio Pinheiro Furtado, a quem foi posteriormente confiada a tarefa de executar a pavimentação em calçada portuguesa da Praça do Rossio.

A partir daqui, a calçada portuguesa espalhou-se rapidamente, primeiro em Lisboa, depois por todo o país e um pouco por todo o mundo onde se fala português, seja nas antigas colónias, seja onde existe ou existiram comunidades de portugueses.

Hoje, a calçada portuguesa constitui um elemento de forte identidade associado a Portugal e, em particular, à sua capital. Os padrões utilizados ajudam a caracterizar os espaços onde se inserem. A riqueza e diversidade dos seus desenhos contribuem para a valorização do espaço público.

Do ponto de vista económico, a calçada portuguesa contribui para a economia nacional, pois utiliza recursos naturais extraídos no nosso país, e as empresas do setor da extração, da transformação e também da aplicação são pequenas e médias empresas nacionais.

A ideia de que a calçada portuguesa é um pavimento antiquado, desconfortável, perigoso e, por isso, incompatível com uma cidade moderna e acessível, não corresponde à verdade e resulta dos problemas de manutenção e massificação. 

A massificação da utilização da calçada conduziu à perda de qualidade deste pavimento. A ausência de fiscalização ou a falta de profissionais qualificados têm conduzido à degradação de pavimentos em calçada, tornando-os pouco confortáveis ou até inseguros.

Mas, quando bem aplicada e adequadamente mantida, a calçada portuguesa é um pavimento capaz de assegurar todas as exigências de conforto e segurança de uma cidade moderna. Se a estas condições se aliar a proteção do património, a formação profissional, a utilização de novas técnicas e a criação artística, então a calçada passa a ser um elemento que transporta a história e a identidade da cidade e a projeta para o futuro, constituindo um elemento de importância estratégica para Lisboa e para o país.

No centro está um ofício e uma arte. O calceteiro tem um trabalho duro, desgastante e pouco valorizado. Importa reconhecer o seu papel central na construção do chão que queremos pisar.