Medina adjudicou obras de 5,5 ME à TD depois de comprar casa da família

Medina mudou-se para a Av. Luís Bívar em 2016. Este ano, a Teixeira Duarte foi contratada, por ajuste direto, para reparar viaduto e o miradouro de S. Pedro de Alcântara

A Câmara Municipal de Lisboa adjudicou este ano obras no valor de 5 529 726,44 euros à Teixeira Duarte, já depois de Fernando Medina ter adquirido uma casa da família no final do ano passado.

A compra de um duplex na Avenida Luís Bívar, em Lisboa, veio a público esta terça-feira mas teve lugar no ano passado. O imóvel pertencia a Isabel Maria Calainho de Azevedo Teixeira Duarte, uma das netas do fundador da construtora. A descendente chegou a deter uma participação na empresa, mas no último relatório do governo de sociedade da TD, referente a 2016 e disponibilizado pela CMVM, já não surge na estrutura acionista. Isabel Maria, que não é referenciada em nenhum cargo na empresa, é ainda assim irmã de um dos diretores da Teixeira Duarte e prima direita do presidente da construtora.

A relação comercial entre o autarca e a família não impediu, porém, uma relação institucional entre a câmara e a empresa. De acordo com a base de contratos públicos, desde 2015 que a autarquia não fechava nenhum contrato com a Teixeira Duarte – só tornou a recorrer aos serviços da empresa este ano.

O contrato de maior envergadura já tinha feito correr tinta: em julho, a câmara escolheu a Teixeira Duarte para avançar com as obras de estabilização do miradouro de S. Pedro de Alcântara, empreitada no valor de 5,1 milhões de euros contratada por ajuste direto. Na altura, a autarquia justificou a decisão de prescindir de concurso público com o facto de estarem em causa “valores de ordem pública, relativos à salvaguarda de pessoas e bens, face ao risco iminente de deslizamento de terras locais ou globais”, informando ter auscultado informalmente quatro empresas. A opção foi criticada pelo CDS-PP, que denunciou o facto de a autarquia já saber há um ano que o miradouro precisava de obras.

Já depois de S. Pedro de Alcântara, a empresa viria a ser requisitada para uma intervenção de urgência no viaduto metálico de Alcântara, que ontem foi de novo cortado ao trânsito após uma colisão. A obra teve um custo para a autarquia de 349 853,00 mais IVA.

Antes destas duas adjudicações, o Portal BASE contém apenas mais três registos de contratos entre o município e a TD. Só um deles foi feito já com Fernando Medina à frente da câmara, em novembro de 2015. Tratou–se de uma aquisição de serviços para introdução de dados em relatórios geológicos, um ajusto direto, neste caso, dentro do limite legal, sem que seja preciso o Estado invocar urgência na contratação (68 898,80 euros).

A coincidir com a mudança de pasta de António Costa para Medina, na primavera de 2015, já tinha havido um contrato de 49 900 euros relacionado com a mesma plataforma de dados.

Já o primeiro contrato publicitado no Portal BASE foi celebrado a 21 de maio de 2012, ainda Medina não tinha chegado a número 2 de Costa em Lisboa. Também neste ano, o ajuste direto foi a opção da autarquia para adjudicar as obras de demolição de um edifício na Calçada do Lavra, empreitada no valor de 755 mil euros.

O i endereçou questões à Câmara Municipal de Lisboa, no sentido de perceber se o facto de a autarquia ter uma relação comercial com a Teixeira Duarte foi tido em conta como potencial conflito de interesses na aquisição do autarca a uma ex-acionista e irmã de um dos atuais diretores da empresa. Até à hora de fecho, não foi possível obter resposta. O i procurou igualmente perceber se, após a compra, Medina se absteve de participar nas decisões de adjudicação direta a esta empresa, bem como relativamente a outras licenças emitidas à construtora para projetos em curso na cidade – questão à qual também não foi fornecida resposta.

Falhas no constitucional

A compra do imóvel foi avançada pela “Sábado” e pelo “Observador”, que revelaram que o duplex no n.o 40 da Av. Luís Bívar custou ao autarca e à mulher 645 mil euros, um valor abaixo do preço de mercado naquela zona.

Há ainda outro elemento: Medina declarou ao Tribunal Constitucional ter dado um sinal de 220 mil euros para o imóvel, mas não atualizou a sua declaração patrimonial quando a compra foi efetivada, a 27 de setembro do ano passado. Segundo o registo predial que o i consultou, Medina e a mulher – a advogada da PLMJ Stéphanie Sá Silva e membro da lista do PS às Avenidas Novas nas autárquicas de 2013 – recorreram a um empréstimo a partir de uma hipoteca.

De acordo com o “Observador”, o incumprimento junto do TC, mesmo após retificação, requer avaliação por parte do Ministério Público e pode dar azo a perda do mandato.

Medina garantiu à “Sábado” que a aquisição do imóvel foi prontamente comunicada ao TC, ao qual reportou também que o remanescente seria pago com um empréstimo.

O autarca alegou ainda que o registo predial e a existência de hipoteca são dados acessíveis livremente e por qualquer cidadão.