«Com o PS no poder não há ‘jobs for the boys’», assegurou António Guterres, primeiro-ministro, há mais de duas décadas. Estávamos em 1995.
Devolvendo em expressão igualmente anglo-saxónico, ‘old habits die hard’: porque o PS está no poder e à beira de celebrar o seu segundo aniversário como Governo e soma mil quatrocentos e trinta e nove (1439) nomeações para gabinetes. Entre assessores e adjuntos, o Executivo já quase alcança, então, o milhar e meio.
O Governo anterior, (PSD/CDS), nos seus primeiros oito meses havia nomeado 750 membros para gabinetes do Executivo.
À época da remodelação que levou Paulo Portas de ministro dos Negócios Estrangeiros para vice-primeiro-ministro, alargando o número de gabinetes, contava com 515 assessores e adjuntos em funções. Corria o ano de 2013. Pedro Passos Coelho, como primeiro-ministro, tinha em São Bento 53 pessoas consigo, do chefe-de-gabinete às assessorias – um número que não é distante daquele que António Costa tem hoje como líder de Governo.
São Bento o mais normal
Costa conta, olhando para os números a 20 de setembro de 2017 no Diário da República, com 70 indicações. Todavia, como o SOL já noticiou, o número de exonerações do gabinete do atual primeiro-ministro também é volumoso, equilibrando essa balança.
Não é aí, portanto, que estão os casos mais misteriosos nas indicações do Governo do PS.
Se o Ministério das Finanças é cada vez mais a pasta protagonista dos governos – tanto em Portugal como na Europa -, os 35 membros já nomeados para o gabinete de Mário Centeno não passam despercebidos, mas não geram questão.
No entanto, o facto de Ricardo Mourinho Félix, secretário de Estado do Tesouro e das Finanças, ter já indicado 42 pessoas para a sua equipa é algo desproporcional, por exemplo, à equipa do ministro da Educação (Tiago Brandão Rodrigues), que tem que tomar conta de um dos ministérios de maior dimensão do Governo e conta com menos sete pessoas que o secretário de Estado já referido, isto é, 35 indicações.
Ainda no Ministério das Finanças, outra Secretaria de Estado a ultrapassar as quatro dezenas de indicações é o dos Assuntos Fiscais, antes a cargo do entretanto exonerado Fernando Rocha Andrade: foram, até agora, 41 pessoas. Na Secretaria de Estado da Administração e do Emprego Público, insistindo no Ministério de Mário Centeno, são mais 37 nomeações para adjuntos ou assessores até ao início da semana corrida.
Numa pasta, desde que João Soares se demitiu, mediaticamente discreta, a Cultura conta com 52 nomeações para o gabinete do ministro (hoje, Luís Castro Mendes) e 33 para a sua Secretaria de Estado. O ministro da Saúde, por outro lado, conta com uns modestos 20 indicados para o seu gabinete.
No primeiro semestre deste Governo, já haviam sido nomeados mais de mil ‘boys’, com contratações num valor superior a 2 milhões de euros em custos para o Estado. Já aí, à semelhança do ocorrido em Executivos anteriores, as nomeações no Diário da República eram superiores às que constavam no portal do Executivo para a respetiva função.
O número de indicações, as totais 1439, pode parecer invulgar na medida em que o Governo de António Costa ainda não sofreu nenhuma grande remodelação a que assim o obrigasse, como a exemplificada do anterior Executivo, em 2013.
Boys também fora do Governo
A política de nomeações indiscriminadas não é, neste sentido, monopólio de um só partido, nem sequer só de uma face do enorme aparelho do Estado.
Este ano, a Autoridade Nacional de Proteção Civil foi alvo de controvérsia, devido ao facto de o seu presidente, o coronel Joaquim Leitão, ter sido nomeado contra um parecer do Conselho Superior de Oficiais do Exército e manter relação pessoal com o primeiro-ministro, Costa, há vários anos. Leitão, que foi também nomeado comandante dos bombeiros sapadores de Lisboa quando António Costa era presidente da Câmara da capital, é casado com Isabel Leitão, que já foi indicada para múltiplos cargos públicos desde os Governos de José Sócrates, tendo passado por ministérios como o da Agricultura e o da Defesa. Hoje, está na Educação.
No programa da RTP, Sexta às 9, a Proteção Civil foi novamente assaltada por revelações polémicas quando comandantes demitidos este ano acusaram o PS de «politização» da ANPC no que diz respeito a 14 alterações executadas nos comandos distritais.
Isto sem falar das empresas públicas ou participadas pelo Estado e de tantas outras nomeações que têm gerado celeuma.