Esquerda isolada na defesa do referendo

Consulta popular na Catalunha divide ‘geringonça’. Bloco de Esquerda critica atuação do Governo de Rajoy e defende referendo, mas não é acompanhado pelos socialistas.

Esquerda isolada na defesa do referendo

O governo português encara com preocupação a situação na Catalunha, mas prefere não fazer comentários sobre o referendo independentista por se tratar de «uma questão interna do Estado espanhol». A situação delicada que se vive em Espanha divide a geringonça e o próprio PS. Os bloquistas têm assumido uma posição clara em defesa do referendo, mas muitos socialistas alinham com os argumentos do governo de Mariano Rajoy.

O eurodeputado socialista Carlos Zorrinho considera que a «situação é preocupante, mas a ordem constitucional deve ser mantida». Para o deputado do PS no Parlamento Europeu, «o governo cometeu muito erros e não compreendeu o fenómeno a tempo, mas perante estas circunstâncias não tinha outra alternativa».

Uma posição idêntica tem o coordenador do PS na Comissão Parlamentar de Negócios Estrangeiros, Paulo Pisco, que é contra um referendo realizado «à revelia da Constituição e da lei do Estado espanhol. Isso não me parece que seja uma decisão acertada e pode criar, como tem criado, uma enorme tensão em Espanha que é prejudicial para todo o país. O socialista considera que «a Catalunha poderia até ter a possibilidade de realizar um referendo», mas teria de ser realizado «dentro dos preceitos constitucionais que o permitissem ou mesmo no âmbito de um acordo parlamentar».

Bloco fez os ataques mais duros ao Governo de Rajoy

O Bloco de Esquerda e o PCP foram os primeiros a assumir uma posição sobre o referendo independentista para condenar a atuação do governo do PP. «Aquilo que é mais preocupante é o facto de haver uma resposta repressiva do Estado espanhol e do governo do PP, que queimou os mecanismos de interlocução política e está a transformar esta questão num braço de ferro perigoso”, afirma, em declarações ao SOL, o deputado do Bloco de Esquerda, José Soeiro. 

Os bloquistas defendem que «a clivagem que existe não é entre os que são a favor ou contra a independência da Catalunha» mas «entre quem acha que o povo deve poder pronunciar-se ou deve ser proibido de o fazer».

Os maiores ataques ao governo de Rajoy, em Portugal, foram feitos Bloco de Esquerda.  Num comício da campanha para as eleições autárquicas, o fundador do partido, Fernando Rosas, condenou «um abuso autocrático e antidemocrático do Governo do Partido Popular, como sempre, inspirado num nacionalismo agressivo, insolente, diretamente bebido das mais sinistras tradições da ditadura franquista».

Deputado socialista critica «intolerável repressão de Madrid»

A causa catalã também tem adeptos no PS. Tiago Barbosa Ribeiro, deputado socialista e coordenador do partido na comissão parlamentar de Trabalho e Segurança Social, considera que as ações desenvolvidas pelo governo espanhol são «mais próprias de Franco do que de democratas». O socialista anunciou, nas redes sociais, que vai participar «num grande evento» para «repudiar a intolerável repressão de Madrid perante o silêncio de muitos» e está convicto de que «a República Catalã vai ser uma realidade».

Nada que alegre um dos principias dirigentes do PS. «Não tenho pachorra nenhuma para nacionalismos. Muito menos para nacionalismos egoístas, que o que querem é deixar de ter o ´peso` de ´pagarem´ para regiões mais pobres. E não consigo de todo entender o entusiasmo de pessoas de esquerda com nacionalismos secessionistas», escreveu Porfírio Silva, na sua página do facebook. 

O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva,  comentou o assunto, a meio desta semana, com todas as cautelas. Não deixou, porém, de referir que «a Espanha saberá resolver» esta questão «de acordo com a sua própria Constituição e a sua lei».

Todos perdem com independência da Catalunha

O PSD prefere não assumir uma posição. Fernando Negrão, presidente do Grupo Parlamentar de Amizade Portugal-Espanha, diz ao SOL que o referendo «não faz sentido». O deputado social-democrata considera, porém, que o governo espanhol devia ter tido uma intervenção «atempada no sentido de privilegiar a negociação. Chegou tarde e de forma musculada».

A independência da Catalunha não seria boa para ninguém. «Perde a Catalunha, porque perde dimensão no plano económico. Perde a Espanha porque perde a província mais desenvolvidas economicamente e nós perdemos porque podemos assistir a uma Espanha em inicio de desmoronamento e, portanto, a Península Ibérica perde com isso”, diz o ex-ministro social-democrata. 

O governo português está a acompanhar a situação e tem mantido contactos regulares com o governo espanhol. «Claro que nós estamos atentos a todos os processos sociais e políticos que ocorrem na grande região a que todos pertencemos, que é a Europa, e que ocorrem no interior de uma unidade política a que todos pertencemos, que é a União Europeia. Mas essa unidade política, que é a União Europeia, baseia-se também, um dos seus fundamentos é a soberania dos Estados-nação que a constituem», afirmou, em Bruxelas, Augusto Santos Silva.