Pedro Santana Lopes é um personagem sui generis da nossa época. Sempre lhe achei graça, mesmo quando o critiquei.
Tem um lado de criança grande, que é a sua fraqueza e a sua força: associa-o a uma certa irresponsabilidade mas simultaneamente contribui para o seu encanto.
É um intuitivo, um impulsivo, e não um cerebral.
Racionalmente, faria mais sentido ficar onde está até ao fim do mandato, ir fazendo o papel de senador da República, ‘andar por aí’, e depois de sair da Santa Casa esperar por outro cargo respeitável.
E, de caminho, espreitar uma oportunidade para suceder a Marcelo em Belém.
Mas não: Santana pôs o bicho da política à frente de outras considerações e avançou para a presidência do partido.
A criança grande sobrepôs-se ao senhor bem comportado.
O desejo sobrepôs-se à racionalidade.
Também era agora ou nunca. Não haveria outra oportunidade assim.
O timing (péssimo) afastou todos os candidatos com pretensões: Paulo Rangel, Luís Montenegro, Maria Luís Albuquerque.
E a verdade também é que, mesmo que não estivesse muito tentado a avançar, Pedro Santana Lopes prolongou tanto o tabu que acabou por se meter num beco.
Se não se candidatasse, tornar-se-ia o ‘emplastro’ do PSD – como disse com graça João Lemos Esteves.
Ou seja, o seu rosto aparecia sempre em tempo de eleições, mas depois nunca avançava.
Ao candidatar-se a líder do PSD (e primeiro-ministro), Santana Lopes não pode deixar de ter como objetivo corrigir a má imagem que deixou quando exerceu aqueles cargos.
Curiosamente, ele tem plena consciência disso.
Num texto recente, auto elogiou-se dizendo que, nos lugares que ocupou, as pessoas gostariam que voltasse ou que continuasse – dando como exemplos a presidência das câmaras da Figueira da Foz e de Lisboa, e a Santa Casa da Misericórdia.
Ora, não falou no cargo mais importante que exerceu: o de primeiro-ministro.
A omissão é reveladora.
Mas, sendo certo que Santana gostaria de corrigir essa má imagem (‘vingando-se’ de Sampaio, que o demitiu), o problema é que será praticamente impossível chegar a chefe do Governo.
O lugar estará entregue a Costa por mais uns anos.
O avanço de Santana Lopes nesta altura tem outro problema: dá ideia que se candidata sobretudo para travar Rui Rio.
Parece uma candidatura não por uma ideia mas contra uma pessoa.
Ora isso não é bom.
Santana Lopes até poderia candidatar-se contra vontade, caso não houvesse mais ninguém e ele se dispusesse a fazer o ‘sacrifício’ para salvar o partido.
Mas não é esse o caso: há outra pessoa que quer muito ser líder.
O lugar não está em risco de ficar vazio.
Uma palavra para o encontro com Marcelo Rebelo Sousa na segunda-feira.
Não percebo que o Presidente tenha concedido uma audiência a Santana numa altura em que a guerra no PSD estava ao rubro e ele era apresentado como possível candidato.
Marcelo argumenta que a audiência estava marcada há um mês e foi para falar da Santa Casa.
Talvez.
Mas um Presidente tem de preservar as aparências.
E o que ‘pareceu’ foi que Santana Lopes lhe foi dizer que se candidatava e falar da situação no PSD.
No limite, até se pode dizer que Santana foi pedir a ‘bênção’ de Marcelo.
O que é péssimo para ambos.
Santana Lopes não precisava do aval de ninguém e Marcelo não devia dar azo a que se pensasse que intervém na vida interna do seu partido, recebendo uns candidatos e discriminando outros.
Foi mais uma traquinice da sua parte.
Julgo que Santana Lopes derrotará Rui Rio, que nunca conseguiu apresentar-se como uma figura de dimensão nacional.
O mesmo aconteceu com outros, como Fernando Gomes ou mesmo Pinto da Costa; são personalidades estimáveis, mas indissociáveis do ambiente nortenho.
Mas Santana será uma solução transitória.
A seguir a um líder que esteve vários anos no cargo, vem sempre um líder efémero.
De passagem.
A vitória de Santana Lopes significará sobretudo a derrota de Rui Rio.
E na história do PSD ficará como um passo atrás, como um regresso ao passado, e não como um passo em frente.
Uma nota final sobre a semana escolhida para apresentação das candidaturas, que coincidiu com a saída da acusação da Operação Marquês.
Rui Rio, então, teve enorme pontaria: acertou mesmo no dia!
Seria exigível aos candidatos um pouco mais de cuidado e profissionalismo.
P.S. – A Catalunha está a ferro e fogo. Muita gente está contra a independência, porque acha que a História já acabou, que as fronteiras que hoje existem vão ficar assim para sempre. Ora, as fronteiras são dinâmicas, evoluem. Veja-se a ainda recente implosão da União Soviética. Ou a fusão das duas Alemanhas. E, se pode dizer-se que um povo não tem o direito de declarar unilateralmente a independência (mas não é isso que sempre acontece?), não é menos verdade que um povo não pode ser governado contra a sua vontade. É óbvio que o Governo de Madrid está a violentar a vontade de grande parte do povo da Catalunha – cujo desejo de independência tem séculos e não esmorecerá de um dia para o outro. É preciso uma saída que contribua para resolver o problema. As ameaças, a coação pelo medo ou a ocupação por forças vindas do exterior não são solução.