Governo espanhol esteve a segundos de mandar invadir parlamento catalão

Presidente do governo catalão e Esquerda Republicana da Catalunha não estavam preparados para uma reação violenta de Espanha

Em entrevista ao diário belga “Le Soir”, o presidente catalão destituído, Carles Puigdemont, afirmou que “sempre foi possível para a Catalunha outra solução que não a independência”. O líder catalão garantiu que trabalhou por um melhor relacionamento entre Catalunha e Espanha, adaptado aos novos tempos, mas que os seus esforços foram travados pela chegada ao poder do PP e de José María Aznar, “que acabou com todas estas negociações”.

Por sua vez, o porta-voz da ERC, Sergi Sabrià, disse na segunda-feira que a república declarada no parlamento catalão nunca chegou a existir de facto, porque o governo catalão não estava preparado para “a violência do Estado”. O porta-voz do maior partido independentista, e favorito nas sondagens para as eleições de 21 de dezembro, explicou a necessidade que os independentistas tiveram de traçar uma linha vermelha: “O país e o governo não estavam preparados para fazer frente a um Estado autoritário e sem limites na hora de aplicar a violência”, afirmou em conferência de imprensa.

Sergi Sabrià garante que a intenção dos independentistas era assumir a proclamação da república, mas que o governo espanhol fez saber que recorreria a todos os meios, mesmos os violentos, para a evitar: “Perante provas claras desta violência, decidimos não ultrapassar esta linha vermelha.” “Nunca tomaríamos uma atitude que pusesse em risco os cidadãos deste país.” “Não queríamos comprovar com mortos” até onde podia chegar a resposta do Estado. 

A informação coincide com a revelação de um plano militar pela revista “Interviú”. Caso a proclamação de independência fosse seguida de uma tentativa do governo catalão de concretizar a autodeterminação, o governo espanhol deu ordem para avançar a operação militar apelidada de “Plano C”. 

No dia 10 de outubro, quando Puigdemont foi ao palanque do parlamento catalão declarar a independência, para depois a suspender, estava previsto que o edifício da assembleia catalã fosse assaltado por 300 agentes de seis unidades de elite da Guarda Civil e Polícia Nacional.

Seriam enviados ainda 250 agentes para expulsar a multidão que poderia estar concentrada à porta do edifício, e os restantes entrariam pelos esgotos e por meio de helicópteros. Segundo a revista espanhola, os efetivos dos Mossos d’Esquadra presentes no edifício receberam avisos claros para deixarem passar as unidades da polícia espanhola. A “Interviú” afirma que este plano só seria posto em marcha se os manifestantes cercassem o parlamento para o proteger, se o governo se entrincheirasse lá e se a independência fosse proclamada. Nesse dia, Puigdemont suspendeu a independência e os manifestantes foram convocados para o Arco do Triunfo, a mais de 500 metros do parlamento. 

Apesar disso, o porta-voz da ERC garante que a independência continua a ser o seu objetivo primordial e será colocada no programa do partido para as eleições de 21 de dezembro, mas sem um prazo para a constituição de um Estado catalão. Os meios de comunicação espanhóis interpretam as declarações da ERC como um recuo nas reivindicações de autodeterminação – uma interpretação que não coincide com os meios mais independentistas, como o site El Nacional, que realça que, na entrevista ao presidente Puigdemont, quando lhe perguntaram “independência ou morte?”, ele respondeu que “nunca” tinha estado a favor de uma escolha nesses termos e recordou que todo o desacordo começou quando, “em 2010, foram cortados artigos do Estatuto catalão que tinham sido aprovados no parlamento catalão e espanhol”, e posteriormente referendados pela população da Catalunha. Relembrou que o facto de a maioria da população ser independentista se devia em grande parte ao Partido Popular: quando começou o “procés” catalão havia apenas 14 deputados independentistas em 135, e agora são 72.