Manuela Moura Guedes. “Proença de Carvalho é o novo Dono Disto Tudo”

Foi afastada da TVI por ser uma voz inconveniente para o governo de José Sócrates e agora faz a sua leitura da Operação Marquês.

Manuela Moura Guedes. “Proença de Carvalho é o novo Dono Disto Tudo”

Chegou, como sempre, atrasada mas bem disposta. Fala sem rodeios, percebe-se a desilusão por não fazer aquilo que mais gosta, jornalismo, e não poupa várias figuras da sociedade portuguesa. Acha que o governo está cheio de “socráticos que sofrem de amnésia”, considera Proença de Carvalho “o novo Dono Disto Tudo”, e não se esquece de como o “silêncio de Cavaco foi prejudicial ao país”.

Como viu as primeiras revelações da Operação Marquês, nomeadamente as primeiras conversas de Sócrates?

Achei fascinante. E vou confessar uma coisa, que não sei se as pessoas acreditam ou não, mas é a verdade. Estava uma noite destas sozinha, com um jornal na mão, e vi aquelas escutas com as mulheres, aquele chorrilho de mulheres que ele tinha a pedirem-lhe dinheiro. Estive a ler e dei comigo com pena dele. Aquilo era uma coisa inacreditável. Tinha uma rede de mulheres… não sei por que é que elas tinham direito ao dinheiro, se calhar porque lhe fizeram imensos favores, sei lá. Não me interessa. Mas segundo aquelas escutas, ele dava dinheiro em barda àquele mulherio todo. E pensei: “Isto não é normal, eu estou com pena dele”. Aquilo era demais, até a mãe. “Ó filho…” “Mmmm” – ele fazia este som cada vez que cada mulher lhe ligava [risos] – “então” “ó filho, não vou dizer… é que vi um casaquinho tão lindo…”. [risos] Pimba! Lá ia! Chulice!

Foi assistente no processo Face Oculta. O que a surpreendeu neste processo Operação Marquês?

É diferente. O meu envolvimento foi relativo à compra da TVI – e foi para isso que fui ver as escutas que havia, embora já houvesse muito pouca coisa, dado que foram retiradas estrategicamente. Agora, por aquilo que o “SOL” revelou, e foi principalmente o “SOL” que o revelou, está patente ali um objetivo claro de controlo por parte de Sócrates da comunicação social. Ali, percebe-se que ele queria, já que tinha na mão quase todos os meios de comunicação social, aqueles que estavam fora do seu controlo. E como não os podia dominar da forma habitual, tinha de os comprar. E isso está patente na Face Oculta, nas escutas que foram reveladas pelo “SOL” e que nem era preciso ser assistente no processo. Aliás, eu depois fiz uma queixa, com base no crime de atentado ao Estado de Direito, mas que não foi para a frente precisamente porque o procurador-geral da República na altura achou que aquelas escutas não tinham validade e portanto eram uma pescadinha de rabo na boca. Como eu não podia reclamar nem recorrer acima daquele procurador-geral, não pude fazer nada – como só se pode ir para o Tribunal Europeu com trânsito em julgado, fiquei de mãos atadas. Foi uma queixa que ficou nas mãos de Pinto Monteiro e ele fez o que quis.

Perante estas novas escutas reveladas, o que pensa de Pinto Monteiro?

Foi das coisas piores que aquele período teve. Há uma coisa que acho que não foi devidamente analisada e que devia ser para que Portugal crescesse e se desenvolvesse e que os mesmos erros não voltassem a ser cometidos, que é analisar aquele período e ver como a democracia esteve em risco, como um primeiro-ministro eleito enganou tanta gente e as pessoas deixaram-se enganar, ou não quiseram saber e ele esteve a tentar – e tentou e conseguiu, nalguns casos – controlar meios essenciais que são a base de uma democracia. A Justiça, controlou-a completamente. O Ministério Público estava completamente controlado. Controlou o sistema financeiro – para isso foi essencial o Armando Vara, não é? –, a CGD, o BCP, maior banco privado, em que todos nós sabemos o que aconteceu, controlou o meio empresarial – o que aconteceu na PT tinha, como depois se veio a saber na Operação Marquês, o Dono Disto Tudo a colaborar [Ricardo Salgado] nesta teia, que é uma teia muito mais complicada do que aquela que está patente na Operação Marquês. Tentou controlar e conseguiu, em grande parte, a comunicação social, que estava completamente dominada e era subserviente, submissa ao poder político e neste caso a José Sócrates. Portanto, Justiça, meio empresarial, sistema financeiro, os media, tudo isto tentou e em grande parte conseguiu.

Leia a entrevista na íntegra na edição de fim de semana do i, já nas bancas