A vida no interior de um submarino

A recente tragédia que vitimou os 44 tripulantes do submarino San Juan, da Armada Argentina, levou-me a recordar uma das melhores leituras que fiz durante este ano de 2017. 

Se bem que o seu lugar na História tenha sido um pouco ensombrado pelo Titanic, o naufrágio do Lusitânia, provocado por um torpedo lançado por um submarino alemão em maio de 1915, foi um dos acontecimentos mais traumáticos do século XX. E Erik Larson reconstituiu-o de forma apaixonante no seu livro A Última Viagem do Lusitânia.

Batizado, curiosamente, com o nome da província romana que hoje corresponde a Portugal, o Lusitânia era um verdadeiro prodígio da técnica, uma espécie de Concorde dos mares do início do séculoXX. Além da rapidez – bateu recordes da travessia do Atlântico, chegando a cruzá-lo em 4 dias e onze horas -, caracterizava-se por um altíssimo padrão de conforto. As salas de jantar da primeira classe eram forradas a painéis de madeira e os menus ofereciam pratos variados e abundantes de alta cozinha.

Diria que este conforto dos passageiros privilegiados do Lusitânia não podia contrastar mais com a vida a bordo dos submarinos alemães – como aquele que afundou o luxuoso transatlântico. Erik Larson descreve magistralmente o dia-a-dia dos infelizes passageiros dos Unterboot dos primórdios. Os alimentos frescos eram escassos, assim como o espaço disponível para os homens se mexerem. Mas o pior de tudo, segundo Larson, era «o ar dentro da embarcação». «Em primeiro lugar o odor primitivo de três dezenas de homens que nunca tomavam banho, que usavam roupa irrespirável de couro e que partilhavam um pequeno lavabo. De tempos a tempos, a sanita impregnava toda a embarcação de um cheiro a hospital de cólera e só podia ser escoada quando o U-boot estava à superfície ou a pouca profundidade, caso contrário a pressão poderia devolver o material à embarcação».

Continua o autor:«A tripulação que não estava a trabalhar era encorajada a dormir, pois os homens a dormir consomem menos oxigénio. Quando estava em águas profundas, o submarino desenvolvia uma atmosfera de pântano tropical. Oar tornava-se desagradavelmente húmido e denso […]. À medida que o submarino descia pelas águas ainda mais frias, o contraste entre o interior quente e o exterior frio provocava condensação, que ensopava a roupa e dava origem a colónias de bolor. As tripulações chamavam-lhe ‘suor submarino’».

Inúmeros vídeos disponíveis no YouTube mostram como os submergíveis são hoje bem mais espaçosos e confortáveis – alguns até têm ginásio e piscina! Mas, mesmo em tempo de paz, continuam a ser lugares com tanto de enigmático como de perigoso.