Campeonato. A águia trabalha, o dragão passeia, o leão descansa

O FC Porto continua a resolver com facilidade os problemas que lhe surgem pela frente. Implacável em Portimão (5-1). O Benfica precisou de ir ao fundo de si próprio para vencer em Paços de Ferreira (3-1). Sporting recebe hoje o Moreirense em Alvalade

Havia, no tempo da outra senhora, uma espécie de lengalenga que ia assim: Braga reza; o Porto trabalha; Coimbra estuda; Lisboa diverte-se.

Sempre existiu a ideia, várias vezes desmentida, que o Porto era o centro dos trabalhadores nacionais, e que a malta da capital se entretinha em festas e festarolas. Deixemos, por uma questão de bom senso, essa dicotomia de fora.

Trouxe-a de entrada apenas por brincadeira e para arejar mais um texto sobre este campeonato nacional que vive de tranquibérnias como a Madame Curie viveu de pechblenda até descobrir o rádio.

Mas a ideia do trabalho vem a propósito, apesar de tudo. Olhe-se para o Benfica, equipa de Lisboa (e também do mundo, disso não restam dúvidas) que teve de trabalhar e muito na capital do móvel para aplainar, como o velho marceneiro da Rua de Baixo, em Águeda, nesses anos em que ainda andava de calções, uma vitória saborosíssima e que continua a manter os encarnados na rota do título, o tal penta que nunca apareceu para os lados da Luz, e também não para os lados de Alvalade, já agora, sendo o FC Porto o único que se pode orgulhar de tal proeza.

Sábado à noite não foi hora de cinema da avenida, nem de se apagarem as luzes e acender o coração. Foi noite de ventrículos e aurículos encarnados bombarem sangue até à exaustão. Vitória dura. Duríssima! Vitória conquistada já à beira do fim, e por isso a merecer festejos meio enlouquecidos de todos, mas mesmo todos, os que fazem parte do grupo que se recusa a vergar mesmo depois de já ter sido dado como morto para o campeonato aí uma boa meia-dúzia de vezes.

O Benfica ganhou, ganhou bem, com uma segunda parte de valentia e ambição e, desculpem-me a individualização, com um Jonas à sua maneira, letal como uma cobra cuspideira, daquelas que criavam embaraços ao grande Sandokan, o Tigre da Malásia, lá em Mompracem, a ilha-que-desaparecia.

Com essa vitória, atirou para as costas do FC Porto, que ontem foi a Portimão, e do Sporting, que só joga hoje por via das suas responsabilidades europeias.

Costas largas. Sabe-se que este FC Porto tem costas largas. Esqueçam a Liga dos Campeões e o Liverpool, são contas de outro rosário, um rosário pesado que não vale a pena contabilizá-lo nas contas dos rosários das nossas provazinhas nacionais, tão pobrezinhas, coitadinhas, que mereceriam um verso piedoso do Guerra Junqueiro.

No campeonato que estamos a viver, semana a semana – ou nem isso se houver outras das tais provazinhas metidas no entretanto – o dragão tem sido consistente como nenhum outro e é por isso que vai à frente. E continuaria à frente fosse qual fosse o resultado de ontem, no Algarve.

E, por isso isso mesmo, atiraram-se aos pobres portimonenses como gato a bofe e em pouco mais de dez minutos já tinham inclinado os acontecimentos a seu favor.

Vamos, por instantes, adiantar-nos no tempo.

Na próxima sexta feira, vai o Sporting às Antas num dos encontros mais fundamentais desta liga. Razão mais do que suficiente para que os portistas tenham feito da viagem até ao extremos do sul deste país atlântico, uma questão de honra e defini;ão.

Receber o leão com cinco pontos de vantagem tem tudo para assentar no seu adversário de Alvalade uma sentença de morte em caso de vitória.

À espreita, fica o Benfica, que pode ganhar, no caso de bater o Marítimo em casa, pontos a um ou dois dos seus competidores.

Assim interpretando a realidade das coisas, vamos ter um fim de semana rijo não tarda muito.

Hoje, recebendo o Moreirense, o Sporting tem tudo a perder e muito pouco a ganhar. Ganhar não passa da sua mais simples responsabilidade. Perder pontos condenará os rapazes de Jorge Jesus a deixar as esperanças caírem no campo do sonho.

Resumo de tanto palavreado: enquanto o Benfica sofreu, e bem, para continuar na luta pelo primeiro lugar, o FC Porto limitou-se a ser a equipa do costume (para cá da fronteira do Caia).

Rápida e conscienciosamente, reduziu o Portimonense à sua medida de equipa que não pode ambicionar mais do que ir fazendo boa figura, uma vez aqui, outra vez ali. Não foi necessário esperar muito para que o jogo ficasse resolvido e os jogadores do emblema do dragão pudessem descansar como num treino.

Afinal, tudo na mesma.