Oposição em parte incerta…

O novo líder do PSD recolheu ao Porto de abrigo, enquanto recupera Ângelo Correia (de quem Passos se afastou).

Reconheça-se a singularidade muito portuguesa: graças aos bons ofícios do PCP e do Bloco de Esquerda, a contestação nas ruas perdeu fôlego e decibéis, embora prometa emergir timidamente para cumprir a agenda do 1.º de Maio.  
Na oposição, Rui Rio continua adormecido, empenhado no tirocínio para ‘ajudante’ num futuro Governo de António Costa, e Assunção Cristas faz por convencer o país de que o CDS tem condições para ser alternativa ao PSD, dominado pelas incertezas.
Este risonho ‘estado de graça’ do Governo, quase sem oposição, tem permitido muita coisa.  Mário Centeno, por exemplo, compôs uma rábula, fingindo não ter percebido as razões que levaram o Eurostat a contabilizar, no défice público de 2017, o financiamento do Estado à descapitalizada Caixa Geral de Depósitos. 
O banco público, tão incensado pelas esquerdas unidas e ungido por Centeno, delapidou muitos milhões em empréstimos e outras operações ruinosas, passando dos lucros chorudos aos prejuízos de vários dígitos.  E o contribuinte voltou a pagar a incompetência e a subserviência de gestores que estiveram na Caixa às ordens do poder do dia, disponíveis para servir os ‘fretes’ políticos, com relevo para os governos socialistas de Sócrates. 
Decisores e beneficiários permanecem, contudo, na sombra, protegidos por um misterioso biombo, apesar da decisão do Tribunal da Relação que obrigava a Caixa a facultar aos deputados a lista dos grandes devedores em incumprimento. Até hoje. 

Num trabalho jornalístico publicado em junho de 2016, o Expresso escrevia sobre «os anos ruinosos da CGD» e fazia alguma luz sobre os empréstimos concedidos pelo banco público, designadamente, ao madeirense Joe Berardo, para a compra de ações do BCP – tendo como garantia as próprias ações!  Um caso emblemático.
Para além do envolvimento na ‘guerra’ interna do BCP – cujo controlo era ambicionado por Sócrates –, a Caixa embarcou em créditos problemáticos e em investimentos especulativos de retorno duvidoso, que cedo se revelariam desastrosos.  
Quando Marques Mendes lembrou, no seu espaço semanal na SIC, que «a CGD teve centenas de milhões de prejuízos, sobretudo no tempo de Carlos Santos Ferreira e Armando Vara» – os quais ‘migraram’ posteriormente para a administração do BCP –, sabia do que falava. 
Mendes enfatizou mesmo que «sobre tudo isto há um enorme complô em Portugal. Um complô de silêncio e de encobrimento. Um complô que envolve políticos e não políticos». 

Se o país vivesse em normalidade democrática, com uma oposição capaz, a irresponsabilidade e o ‘passa-culpas’ não ficariam impunes. Mas assim se continua, com um encolher de ombros, após uma Comissão Parlamentar de Inquérito inconclusiva –  bloqueada vergonhosamente pelas esquerdas –, e uma auditoria da qual nada se sabe,
Se o Governo estivesse sujeito a um genuíno escrutínio, o primeiro-ministro em exercício já teria sido convidado a explicar os ‘mistérios’ da Caixa, antes de o assunto ser varrido zelosamente para debaixo do tapete. 
Mas não. Para ocupar ‘tempo de antena’, o espaço público é regularmente invadido por temas tão prioritários como a eutanásia, a mudança de género nos adolescentes a partir dos 16 anos ou o acesso de animais de companhia a restaurantes (lei já promulgada, apesar de Belém achar «respeitáveis» as preocupações do setor da restauração e hotelaria). Cumpre-se com afinco a agenda da ‘geringonça’.    

Em contrapartida, as questões importantes e que mexem com a vida das pessoas são sistematicamente marginalizadas – ou escamoteadas –, desde a degradação do Serviço Nacional de Saúde à lentidão exasperante da Justiça ou aos atropelos na escola pública, vítima do ‘comodato’ existente entre o atual ministro e a Fenprof.
Houvesse em Rui Rio alguma alma ou impulso de oposição e já teria rompido o silêncio, onde se afunda a ele e ao partido, ‘chamando à pedra’ quem se julga protegido por uma cortina de espessas cumplicidades.
O novo líder do PSD, sem nervo para pôr os ‘pontos nos is’ – desde os malabarismos orçamentais às cativações cegas das Finanças –, recolheu ao Porto de abrigo, enquanto desenha ‘conselhos estratégicos’ (onde recuperou Ângelo Correia, de quem Passos Coelho se afastou), entre outras redundâncias, para ganhar tempo, sem embaraçar António Costa.
O aliciamento do funcionalismo e dos pensionistas, através de artimanhas básicas, já deveria ter aconselhado as oposições a não ficarem paradas. 
Infelizmente, ninguém quer fazer muitas ondas.  O PSD arrisca-se à irrelevância. E o CDS a ficar refém de complexos. 
Ora, ou a oposição faz ‘prova de vida’ ou continua ausente em parte incerta. Os populismos radicais, à esquerda e à direita, seguem dentro de momentos…