A cultura da dependência…

Com a destreza que o caracteriza quando algo lhe cheira a esturro, António Costa deu o dito por não dito nos subsídios ao teatro e artes adjacentes, fez num ápice um comunicado, em jeito de ‘carta aberta’ – como se tivesse sido apanhado de surpresa pelos acontecimentos -, e despejou mais uns milhões para alimentar…

Com a destreza que o caracteriza quando algo lhe cheira a esturro, António Costa deu o dito por não dito nos subsídios ao teatro e artes adjacentes, fez num ápice um comunicado, em jeito de ‘carta aberta’ – como se tivesse sido apanhado de surpresa pelos acontecimentos -, e despejou mais uns milhões para alimentar companhias dependentes e calar arruaças.

Na passada semana, desautorizou o ministro e o secretário de Estado da Cultura – e foi desautorizado por este. Costa ouviu, embatucou e não reagiu nem despediu o ‘ajudante’ que o desmentiu em público.

O certo é que, para já, a ‘guerra dos artistas’ surtiu efeito, provando-se, mais uma vez, que quem mais grita mais alcança. 

O primeiro-ministro em exercício assustou-se com a algazarra e o desconforto à sua esquerda, do PCP ao Bloco.

A história é antiga e já ninguém se admira. Sobejam as companhias – e os cineastas – que trabalham a soldo estatal, sem a menor preocupação de bilheteira. São incontáveis os filmes e as peças que se estrearam e saíram de cena, com plateias quase vazias. O subsídio tem alimentado, generosamente, projetos sem público.

Mas não deverá o Estado patrocinar o teatro, o cinema, o bailado, a grande música? Com certeza que sim. A Cultura, na sua diversidade, exige prática e habituação. E que seja transversal. 

Mas promover a Cultura – uma responsabilidade do Estado – nunca poderá equivaler a financiar, em registo vitalício, agrupamentos ‘porque sim’ ou filmes risíveis.

A ‘desonestidade intelectual’ de António Costa, como a definiu Assunção Cristas no debate quinzenal – a propósito da inusitada carga fiscal suportada pelos portugueses -, também passa pelas Artes.

É dos livros. Quando as coisas dão para o torto, seja nos graves incêndios de Verão, na degradação dos hospitais públicos, nos alçapões do sistema financeiro (Caixa incluída), ou, agora, protesto dos artistas, a culpa é, inevitavelmente, de terceiros, nunca cabendo ao Governo ou aos seus ziguezagues.

A política eleitoralista de António Costa segue em frente, com um módico de contrariedades e o Parlamento quase na mão. 

Sem a ‘rebeldia’ do CDS, onde Cristas faz uso de uma saudável combatividade – conseguindo já empurrar Costa para uma zona crispada -, os debates quinzenais corriam o risco de se tornarem enfadonhos.

O episódio do concurso das Artes valeu como um exemplo para outros setores, que, como este, têm capacidade reivindicativa. Quanto mais barulho fizerem – com o megafone mediático por perto -, mais probabilidades terão de fazer vingar as suas teses.

Costa quer provar – com a cumplicidade de Centeno -, que além de obediente a Bruxelas, sabe explorar as fraquezas dos parceiros de coligação, encostados à parede.

O expediente não lhe tem saído mal, amparado agora por Rui Rio, que não perde o ensejo de dedilhar a sua música preferida, como voltou a acontecer numa conferência na FLAD, onde insistiu nos acordos interpartidários de regime e ensaiou uma ‘flor’ ao estilo de Trump, ao defender que «não faz sentido ser líder de um partido da oposição que não seja para pôr Portugal em primeiro lugar».

Se, à direita, a oposição do PSD ficou em ‘banho Maria’ em nome dos ‘acordos de regime’, à esquerda, os comunistas do PCP e do Bloco meteram na gaveta, por uns tempos, os seus ‘ódios de estimação’, desde a União Europeia ao Euro e à NATO.

Para azar do PCP, Jerónimo de Sousa não tem a ‘pegada mediática’ de Francisco Louçã, que se desdobra em comentários doutrinários e de pura guerrilha ideológica, desde a SIC ao Expresso, gozando dos favores de direções editoriais rendidas aos seus encantos trotskistas.

Na mesma lógica, e para não perder velhos hábitos de linguagem trauliteira, Catarina Martins saiu da órbita doméstica e atirou-se ao sistema judicial brasileiro, por achar que este, ao prender Lula, desferiu «um golpe da direita reacionária, racista, fascista».

Pouco lhe importam as suspeitas ou os pecados de Lula, e que a Justiça brasileira, além do ex-Presidente, já tenha julgado e condenado outros políticos e empresários, da esquerda à direita, desde o ‘Mensalão’ à ‘Operação Lava Jato’.

A ‘coordenadora’ do Bloco desenterrou a cartilha revolucionária, provando aos incautos que a sua natureza não mudou uma vírgula.

O certo é que no Brasil há gente presa – por corrupção e outras malfeitorias -, que se supunha intocável, enquanto por cá, se joga à ‘cabra cega’, com corruptores ou corrompidos travestidos de vítimas.

Com uma regra comum aos dois lados do Atlântico: se os corruptos forem de direita, devem ser exemplarmente castigados. Se forem de esquerda, ascendem à categoria imaculada de líderes românticos, cujas tropelias devem merecer todo o carinho popular e absolvição. Uns santos…