De Tancos aos hospitais: responsabilidade precisa-se

Há largos anos, era eu um jovem acabado de sair da universidade, orgulhoso da conclusão de um curso de Finanças tirado no atual ISEG em épocas conturbadas de uma revolução histórica, quando no meu primeiro emprego a sério conheci um gestor que marcou a minha vida profissional. Naqueles anos de início da democracia os empregos…

Há largos anos, era eu um jovem acabado de sair da universidade, orgulhoso da conclusão de um curso de Finanças tirado no atual ISEG em épocas conturbadas de uma revolução histórica, quando no meu primeiro emprego a sério conheci um gestor que marcou a minha vida profissional.

Naqueles anos de início da democracia os empregos eram escassos e, como tantos, fiz o tirocínio profissional a dar aulas no ensino secundário na Marinha Grande. Colocado a meio do ano letivo, agarrei com as duas mãos o único horário disponível, que tinha apenas 15 horas semanais (um horário completo era de 22 horas). 

Condoídos da minha situação, ofereceram-me mais 4 horas para gerir a biblioteca e ser o diretor de turma do 2P, que ninguém queria ser. Fiquei, assim, com 19 horas, bem contente com a situação e expectante do que me esperava. 

Foi um tempo fantástico – entre as aulas e sua preparação, os alunos deste 2P carentes de atenção, e as praias de S. Pedro de Moel. Tive histórias de vida, conheci professores fascinantes e baldas, mas é dos alunos do 2P que guardo as melhores recordações. Miúdos a precisarem de orientação, investi muito do meu tempo na biblioteca reunido com eles e tantas vezes com os seus pais, a conhecer os seus problemas, nomeadamente sociais. Um tempo escasso na minha vida, mas cheio de experiências humanas que me enriqueceram o espírito e muito úteis me foram.

Regresso ao gestor de que falei atrás. Muito aprendi com ele, sobretudo a pragmatizar questões e a resolver problemas de toda a ordem, a começar pelos financeiros. Com ele aprendi a dissecar as questões, a nunca me queixar sem ter uma solução alternativa, sobretudo a ultrapassar dificuldades. Como ele me dizia: «Meu caro, eu pago-lhe para me trazer soluções, nunca problemas!».

Por isso, fico hoje confundido com situações de impasse, como a de Tancos com o desaparecimento de armas ou as roturas nos hospitais. Os responsáveis descartam responsabilidades com a leveza da impunidade, sem ninguém superior os demitir por incompetência.

Em Tancos não havia segurança e alguém andou a passear com armamento que desapareceu – e apareceu sem rasto de quem o movimentou, não se sabendo se foi todo recuperado. Mas, para mim, o pior é mesmo a inexistência de responsabilidades. E como os exemplos vêm de cima, o encolher de ombros generalizado a todos os níveis a todos responsabiliza. Que tal umas demissões e umas reformas antecipadas? Ou a incompetência fica premiada?

Nos hospitais o problema é ainda mais grave, porque mexe com um direito fundamental dos cidadãos: a saúde. A escassez de quadros, conjugada com os novos horários de 35 horas e a míngua de recursos financeiros que não permite investir nas necessidades básicas dos cidadãos, torna todos os envolvidos culpados do desnorte. 

As soluções são conjunturais para resolver o imediato, ficando o estrutural à espera de dinheiro – entretanto canalizado para captar votos nas classes sociais que influenciam maiorias absolutas. O dinheiro certamente não resolveria tudo mas ajudaria muito. O ideal seria repensar o funcionamento das urgências hospitalares utilizando ferramentas modernas de gestão, mas até para isso é preciso dinheiro.

Este encolher de ombros perante reclamações legítimas recorda-me mais uma vez aquele gestor extraordinário que, pacientemente, me formatou na excelência e que dizia: «Se não sabes fazer, vou buscar quem saiba». Obrigado Armindo Santos Pinho! Mais pessoas assim fazem hoje muita falta, a responsabilizar quem trabalha, a premiar quem cumpre, a despedir quem falha.

P.S. – Sou um benfiquista empedernido, mas ver este Sporting à deriva, com tantos putativos candidatos à presidência, entristece. Não bastam as dificuldades financeiras, que deveriam inibir os iluminados a chegar-se à frente sem terem soluções concretas para as resolver. É preciso este triste foguetório comunicacional de candidatos que não sabem ao que vão e que apenas contribuem para aprofundar a crise? Isto em Alvalade é tarefa de excelência profissional, porque todos — a começar por Benfica e Porto — precisamos de um Sporting de eleição. Que tal haver humildade e todos conversarem e convergirem, porque ‘a união faz a força’?