Geoff Dyer. ‘Se a viagem é horrível, podes transformá-la em comédia ou torná-la ainda mais trágica’

Já gostou mais de drogas, e se em tempos foi um especialista a franquear as portas da percepção, no seu novo livro de viagens, Areias Brancas, Dyer não perdeu a malícia nem o talento cómico, mas está mais sóbrio, mais contemplativo, e a sua antena começa a apanhar as ancestrais frequências e as grandes questões…

Dyer é um vira-latas que sabe o que faz. Dono de um talento absurdo para chegar de manso e alinhar um astucioso rastilho a partir de cintilâncias despegadas do cotão nos quatro cantos do mundo. São inúmeros os temas e disciplinas que o fascinam, da fotografia ao cinema, passando pela literatura, a História, o jazz, e a sua fome de mundo tem-no levado a viajar por toda a parte. Quando o temos como guia, interessam menos as atrações que iscam o bando turístico do que o arranjo subtil de impressões que nos permite fugir de nós próprios. Desatando o nó de um fim de mundo, ele tem em comum com os românticos a capacidade de ler o destino nas entranhas de umas ruínas, e arruma com as pretensões de exotismo, passando depressa a coisas mais estimulantes. Com ele, o que importa não é o que se vê, mas como trememos de regozijo perante as ilações que tira, o requinte e o enlevo com que produz uma narrativa recambolesca e divertida a partir de saborosas trivialidades.

É o mais brilhante dos discípulos de John Berger – prolífico autor e artista que escreveu Modos de Ver, obra que se tornou uma referência para sucessivas gerações de críticos e historiadores de arte, tendo partido da popular série que fizera para a BBC, em 1972 -, e soube fazer da reinvenção das formas de olhar um meio de virar do avesso as expectativas, desesperando os editores que, quando lhe pagavam um adiantamento para um estudo sobre um assunto, esgotado o prazo, recebiam uma obra sobre algo inteiramente diverso. Mas o prodigioso talento para a demolição de géneros por que Dyer é conhecido não demorou a fazer das suas geniais intrujices literárias propostas irrecusáveis. De resto, falando sobre este gato, disse que o que há de maravilhoso no ofício da escrita são as mil maneiras diferentes que se nos oferecem de o esfolar.

Nascido em Cheltenham em 1958, no seio de uma família remediada, Dyer reconhece que beneficiou grandemente das oportunidades criadas pelos governos trabalhistas no pós-II Guerra Mundial. E isso, aliado à sua desenvoltura intelectual, permitiu-lhe formar-se em Oxford.

Para um tipo que, ao começar, se apresentava como um mandrião no vale das letras, tem provado uma extraordinária fertilidade ao longo dos anos, e é hoje um dos autores mais instigantes no desdobramento entre a crítica e o ensaísmo, rivalizando com os melhores romancistas, com uma prosa tão elegante que se torna um vício. Depois do sucesso de Yoga para Pessoas que não estão para fazer Yoga – o seu primeiro e único best-seller -, acaba de ser publicado entre nós Areias Brancas, outra colecção de textos sobre viagens feitas como se tropeçasse nos seus destinos: seja a Polinésia Francesa, o Novo México, a Cidade Proibida, em Pequim, ou a busca da aurora boreal no norte da Noruega… No fim, como disse Jennifer Senior, no The New York Times, o que mais apreciamos é estar lá para testemunhar as gaifonas deste «Sidarta neurótico», metendo-se em peregrinações que acabam por deixá-lo desapontado e vazio, no que acaba por servir de atalho para uma piada cósmica muito mais satisfatória.

Como está a sua saúde quatro anos depois daquele pequeno AVC que relata no final de Areias Brancas?

Bem, isso foi um incidente isolado. Ficou ultrapassado em não mais de três ou quatro dias, e é já uma coisa que se varreu dos meus pensamentos. É como se, por acidente, eu tivesse levado com a trombose de outra pessoa. Não me era dirigido, não fez sentido nenhum. Deixou os médicos estupefactos. Neste momento estou de perfeita saúde. 

E o que tem andado a fazer? 

As coisas do costume. Quando o Teju Cole está fora, faço a coluna dele sobre fotografia na The New York Times Magazine. Diria que o faço umas três ou quatro vezes por ano, o que para mim está óptimo, pois não gostaria de o fazer todos os meses. Além disso, este ano, na Inglaterra, vou publicar dois livros. Um deles é um grande volume ilustrado, sobre a fotografia de Garry Winogrand, The Street Philosophy of Garry Winogrand. Esse é um calhamaço, e um belíssimo objecto editorial. Depois, mais para o final do ano, irei publicar um livro bastante breve sobre um filme que significa muito para mim: Where Eagles Dare. É o género de filme de aventura e de guerra da década de 1960, com o Clint Eastwood e o Richard Burton.

Sempre que se fala na sua escrita e nos seus livros, há a necessidade de explicar o modo como mistura ficção e não-ficção. Muitas vezes também já manifestou a sua irritação com estes rótulos…

Sim. Enquanto leitor sinto-me confortável com este ângulo, e o mesmo se passa enquanto escritor. Nunca foi meu propósito vir arranjar confusão nas grelhas de avaliação literárias, nem quis causar alguma espécie de motim ou perturbação dos trabalhos. Foi sempre mais uma preocupação em escrever sem que pudesse ser facilmente categorizado. Isso é que era crucial. Também me parece que herdamos esta noção de que um poderoso estilo pessoal é mais evidente, ou só é notório, na escrita de ficção. Ora, aquilo que me empenhei em fazer foi introduzir esse modo estilisticamente mais intenso de escrever, criar uma identidade autoral mais forte no terreno da não-ficção. É sabido que, tipicamente, no campo da não-ficção, o que importa primeiramente é o conteúdo, por isso, prescinde-se da qualidade estética que encontramos na ficção.

Deixou também já claro a sua dívida a John Berger…

Berger teve uma enorme influência na minha escrita. Foi certamente uma influência libertadora, que me deu a confiança para escapar aos moldes. Mas mais do que a influência na minha escrita, foi até mais importante para mim como leitor, pois encorajou-me a não me mover por espaços que fossem facilmente catalogáveis. 

Quais são os autores que o puxam de volta para eles, obrigando-o a reler as suas obras?

Curiosamente, e pode parecer estranho, mas aqueles escritores que se tornaram uma presença constante para mim são, na verdade, aqueles que não preciso de reler, isto porque permanecem vivos na minha consciência e, até, no meu sangue. Não é por não os reler constantemente que os esqueci. O que acontece é que não sinto a necessidade de me relembrar de como eles eram, porque são ainda. Um exemplo que posso dar é Thomas Bernhard. Este escritor austríaco teve um tal impacto em mim… Por acaso, vi-me obrigado a relê-lo esta semana, porque estou a escrever o prefácio para uma edição inglesa do livro Extinção, e Bernhard continua a ser uma presença muito inquietante para mim, isto embora hoje a sua influência tenha já sido diluída por outras obras que vieram depois. 

E quanto a autores contemporâneos?

Considerando aqueles cuja influência tenho perfeita consciência de estar a usar na minha escrita, diria Rebecca West e Annie Dillard. Penso que, em ambas, aquilo que encontramos é algo que também apreciava na escrita de D.H. Lawrence, e que passa pela forma como tão facilmente alternam entre sumptuosas descrições do mundo físico e as mais sensíveis especulações metafísicas.

Durante anos uma das suas ambições era mudar-se para a Califórnia (Los Angeles). Hoje está em Londres, mas vive na Califórnia, certo?

Sim, estou em Londres e depois irei para Berlim, para participar num festival.

Já se passaram alguns anos desde que concretizou esse desejo. Provou ser tudo aquilo por que ansiava?

É verdade que sempre sonhei em viver na Califórnia, mas o que queria era viver em São Francisco e não em Los Angeles, onde nunca desejei estar nem nunca tinha vivido nada de especial. É uma cidade onde é bastante difícil viver-se. Estende-se por distâncias tão vastas, e eu sinto-me muito melhor numa cidade mais compacta. Por isso, regressar a Londres faz-me sentir como se estivesse em Manhattan, se comparar com Los Angeles. Desde logo há o fabuloso sistema de transportes públicos desta cidade… Depois havia outra coisa com a qual não contava. Quando sonhava mudar-me para a Califórnia, não me ocorreu quão longe estaria do resto do mundo. Ali, estás a um voo de cinco horas de Nova Iorque, e mesmo muito longe da Grã-Bretanha. E isso é uma das coisas de que realmente sinto falta, que é a grande proximidade a que estava do resto da Europa quando aqui vivia.

Pensa voltar?

Sim. Eu e a minha mulher [a galerista Rebecca Wilson] temos planos de, dentro de alguns anos, voltarmos para cá, e a razão que sobrepõe a todas as outras é o querermos estar ligados à Europa. Não deixa de ser irónico que este desejo pareça estar em oposição à vontade da maioria dos britânicos que escolheram voltar as costas à Europa.

Entre as suas cogitações sobre o efeito que teria a sua mudança para LA, estava a ideia de que as suas vastas paisagens ofereceriam novas perspetivas à sua escrita. Isso concretizou-se?

Não me parece. E julgo que isso se deve a ter acontecido numa altura diferente da minha vida. De então para cá, como daqui em diante, a minha escrita irá debruçar-se cada vez mais sobre os meus objetos de estudo. Estou a falar a partir do meu escritório, e tenho à minha volta uma série de livros, sejam de poesia, literatura ou História, livros sobre fotografia, e creio que, daqui por diante, me irei ocupar mais e mais da escrita de ensaios em detrimento de outro tipo de explorações que fiz da escrita como forma de arte. Por essa razão, parece que falhei a janela de oportunidade no momento em que estava interessado em escrever sobre lugares.

Regressando ao tema do Brexit. Foi para si uma surpresa ver a forma como nos últimos anos a cultura está a transformar-se não só no Reino Unido como também nos EUA?

Sim, e parece-me que estão relacionadas. Creio que não seria difícil argumentar que Trump não teria sido eleito se tivéssemos votado pela manutenção do Reino Unido na União Europeia. Portanto, um desastre conduziu ao outro. Uma das coisas que se nota no Brexit – sendo claro, hoje, o quão estúpido essa decisão foi – é o tempo que já se desperdiçou com este processo… Neste momento, o nosso governo parece não conseguir ocupar-se de mais nada, e há aqui uma quantidade de energia perdida a contornar as consequências do Brexit. O que me parece é que se criou uma distração de proporções épicas. A coisa com a qual estou em desacordo quanto ao retrato catastrófico que se tem pintado deste processo, é o muito que tenho ouvido dizer que o país se tornou muito mais racista ou xenófobo. Não dei por nada disso. É um facto que não passo muito tempo aqui, e o tempo que passo é numa zona abastada de Londres, mas parece-me que as coisas estão praticamente na mesma a esse respeito. Londres continua a ser a cidade que era. Continua a ser uma das cidades com maior diversidade do mundo. 

Nos seus relatos de viagens há sempre um momento de desilusão, em que aquilo que esperava encontrar esbarra numa realidade decepcionante, mas a sensação que nos dá é de que o Geoff é um excelente viajante porque consegue dar a volta, compensar isso, contentando-se com alguma outra coisa. Gostava de saber como é que as suas viagens o transformaram?

Não sei se a ideia de experiências transformadoras é aquilo que mais se adequa ao papel que as viagens tiveram na minha vida, mas foram certamente experiências que a definiram. Creio que a maior transformação se opera já no processo de escrita. Se estás a meio de uma viagem e há algo que te desaponta, ou se a verdade é horrível, na escrita podes transformar isso numa coisa cómica ou ainda mais trágica. Podes pegar no que quer que seja e fazer disso uma história, e a forma como fazes essa transformação é decisiva. O modo como representas uma experiência ou um lugar que foi decepcionante, se não te limitares aos lugares-comuns, leva-te a extrair uma outra verdade como escritor, e há uma relação que se estabelece entre a reputação de um lugar, a nossa expectativa e aquilo que descobrimos. Se nos dermos ao trabalho de apurar a realidade a partir de uma perspetiva muito particular, isso permite chegar a outro lado. Há uma grande diferença entre aquilo que fazemos e o que encontramos nos guias turísticos, que estão limitados a informações muito objetivas. Esses livros procuram alcançar verdades universais, coisas que são evidentes para qualquer pessoa. Já os meus livros de viagens são visões muito particulares, de um lugar em particular e num momento muito particular.

Numa das recensões a Areias Brancas era sugerido que, de algum modo, a forma como encara a viagem cria um balanço para que nos habituemos à própria transitoriedade da nossa condição, e à ideia de que, mais importante do que o destino, é a capacidade de mudar de lugar, sabendo que a última paragem é a morte. Parece-lhe que esta busca de outra coisa, de outro lugar, é uma forma de lidar com a morte?

De certo modo. Mas apenas no sentido em que me parece um erro vivermos como se fôssemos imortais. Sobretudo sendo este um planeta tão fantasticamente variado, parece-me aconselhável experienciar tanto dele quanto possas. É uma das melhores formas de se ocupar o tempo que nos é dado. A outra coisa é que, se sabes que não vais andar por aqui eternamente, e se nem todos os sítios estão sempre em condições de te receber… Penso sempre neste exemplo: há uma ruínas romanas na Líbia, país que, há uns anos, se transformou num pesadelo – falo dessas ruínas no meu livro [Yoga para Pessoas que não estão para fazer Yoga] -, e sinto-me muito contente de poder ter visitado e escrito sobre elas. O feitiço que cai sobre nós ao visitarmos ruínas como aquelas é muito forte, e não penso que em alguma outra viagem tenha sentido algo comparável ao que senti ali. Ora, hoje já não se poder ir lá e nem sei se alguma vez terás hipótese de ver o que vi. Se vivesses até aos 300 anos é quase certo que acabarias por conseguir uma janela de oportunidade. Mais incerto é a questão de saber se as ruínas ainda lá estarão. É a este respeito que a perspetiva da morte se torna para nós uma lição metafísica. A morte é como o horário de encerramento de um bar ou de uma loja. Isso leva-te a tomares as precauções necessárias para chegares lá bem antes da hora do fecho. 

Houve um crítico que comparou o entusiasmo de ler um livro seu com o de fazer um novo amigo, pela forma como sentimos que há algo que se acrescenta à nossa vida. Como é que se caracteriza enquanto viajante?

Não sou o tipo de viajante mais temeroso, e isto porque nada de muito mau me aconteceu nas minhas viagens. Sou até dado a confiar, mas não por ser ingénuo, simplesmente porque nunca fui levado a acreditar que há motivos para se recear aquilo que nos pode acontecer ao andar pelo mundo. Diria que sou tão propenso à irritabilidade como a generalidade das pessoas. A coisa que realmente faz a diferença e altera a minha capacidade de estar receptivo aos lugares é se consegui dormir horas suficientes ou não. Isso é capaz de ser de longe a coisa mais importante quando viajo. Ou seja, o esforço para não andar para ali a arrastar-me. Depois é claro que, à medida que envelheces, tens cada vez menos energia. Acho que a grande diferença que senti é que, hoje, preciso de um nível de conforto que podia dispensar quando andava pelos trinta. 

Quanto à sensação de espontaneidade na sua escrita, parece-lhe que isso resulta mais de uma ilusão que tenta criar…? No fundo, gostava de saber se os seus textos passam por vários esboços e são submetidos a um grande processo de reescrita.

Essa sensação relaxada da minha escrita pode nem ser assim tão original como isso, mas é uma das minhas grandes preocupações. A verdade é que me dá bastante gozo andar de volta de um texto, reescrevendo-o. O resultado não é, portanto, assim tão espontâneo como parece.

Parece-lhe que o jornalismo teria algo a ganhar se fosse buscar ao campo literário alguma da ousadia nos processos para conseguir expandir a noção do real, abdicando, por vezes, da ideia de objetividade em favor de algo que construa uma perspetiva mais complexa do mundo?

Depende da secção do jornal em que se está. Na parte das notícias parece-me mais importante do que nunca que haja uma grande fidelidade ao que se está passar. Mas à medida que avançamos para as secções culturais acho que se vai dilatando a tolerância para retratar as coisas de uma forma menos rigorosa. Mas no que diz respeito ao jornalismo acho que é hoje crucial ser-se muito rigoroso especialmente no que toca à verificação dos factos. Uma vez que tenho colaborado cada vez mais com revistas americanas, tenho-me dado conta de que, na verdade, gosto bastante de passar pelo processo de verificação dos factos. Poderia pensar-se que um escritor como eu teria muita dificuldade em submeter-se a esses cuidados, mas não foi o que se passou. Acho que nem dei muito trabalho aos profissionais que tiveram de passar os meus textos a pente fino. 

Em relação aos projetos que o esperam, estes aparecem-lhe de forma algo casual, ou há uma espécie de mapa e de objetivos ao nível daquilo que ainda gostaria de concretizar?

Não há uma vontade de capturar a bandeira, nem de converter ninguém a qualquer espécie de noção ideológica. Mas há ainda uma série de coisas que me interessam e que desejo aprofundar. São coisas muito pessoais. Não sou alguém que tenha um desejo tal de participar na esfera pública que se preocupe com influenciar decisivamente algum debate ou tendência.

Além do interesse por fotografia, cinema, jazz, há outros temas ou disciplinas que o têm cativado nos últimos anos?

Há, sim. O desporto, certamente. Tirei grande prazer de escrever sobre desporto e espero um dia ainda vir a escrever um livro sobre ténis.

Uma boa parte deste livro (Areias Brancas), passa-se na América. Face às constantes convulsões que hoje afetam a vida política do país, parece-lhe que pode sentir-se provocado a escrever sobre o modo como a cultura tem refletido estes choques sociais?

Talvez. Mas não é muito esse o género de coisas em que me meto. Quando abordo esses temas tendo a fazê-lo de forma indireta. Além disso, vivendo na Califórnia, onde há uma união tão forte na antipatia face a Trump, não há tanto a sensação de que as coisas mudaram. O discurso mudou certamente, mas a vida do dia-a-dia mantém-se parecida ao que era antes.

Conhece aqueles versos de Leonard Cohen: “You loose your grip and then you slip/ into the masterpiece”?

Não. Que beleza.

Parece-me que o Geoff se tornou um mestre na arte de deixar-se abandonar, permitir que as coisas lhe fujam do controlo, para depois encontrar algo de verdadeiramente inesperado. Julgo que se a sua escrita tem tanta ressonância isso é porque aparenta ser algo obtido sem demasiado esforço mas que consegue, ao mesmo tempo, ser tão exata que extravasa a ideia do literário.

Gosto dessa comparação com a poesia porque um dos aspetos centrais no que respeita à poesia é que nunca ninguém pergunta se se trata de ficção ou não-ficção. É simplesmente poesia, e, por isso, fico bastante satisfeito com essa comparação.

Cresceu no seio de uma família a um tropeção da pobreza, e hoje não há um livro seu que não seja alvo de recensões elogiosas no Times e noutras publicações desse nível. Gostava de saber se imaginava este nível de sucesso quando era jovem?

O que é mais incrível é que fiz 60 anos este mês. Sempre pensei nos 60 como sendo uma idade tão incrivelmente avançada e a resposta mais honesta que lhe posso dar é reiterar o quão espantado estou por ter chegado aos 60. Como é que isto me aconteceu?

E nisto tudo o que foi que mais lhe custou? O que é que teve de fazer para ser o autor que é hoje?

Em termos da minha escrita, o estilo foi algo a que cheguei com toda a naturalidade. Sempre me agradou a forma como a escrita, no fundo, é uma questão de resolução problemas. Quer estejas a escrever um pequeno ensaio ou um livro – e é claro que as coisas se complicam quanto maior é o texto -, a tua principal tarefa passa por encontrar a solução em termos de estrutura, identificar em que ordem as coisas devem entrar, e saber qual é a consequência de não vir antes mas depois. Tento não ter uma abordagem predefinida. Sempre foi mais uma questão de ir por tentativa e erro. Simplesmente, ponho-me a olhar para as peças e tento resolver o puzzle. É isso que é, ao mesmo tempo, intelectualmente estimulante e prazeroso.