Há sempre uma nuvem branca

A extensão do oleoduto Sines-Aveiras até ao aeroporto da Portela – e ao futuro aeroporto de apoio do Montijo – é uma obrigatoriedade. E, como noticiou o SOL na última edição, uma assumida prioridade.

Aliás, não se compreende a razão dessa extensão não ter sido contrapartida negociada (com os franceses da Vinci) tanto na privatização da Ana, pelo Governo anterior, como na contratualização da cedência da Base Aérea do Montijo, pelo atual Executivo da ‘geringonça’. Num caso como noutro (Lisboa e Montijo), não seria normal que fosse o concessionário da exploração dos aeroportos a garantir a finalização dos troços em falta do oleoduto para abastecimento das aeronaves?
Por que raio não acautelou o Estado o financiamento de uma obra que inevitavelmente tem como primeiro beneficiário o concessionário, ou seja, a multinacional francesa?

Enfim, financiamento da obra à margem, há que reconhecer que este oleoduto é consensualmente reconhecido como uma prioridade… inadiável.
E com um consenso muito alargado – que só não é unanimidade porque (além do PCP) as empresas de transporte de materiais perigosos e os motoristas assalariados das mesmas estão, naturalmente, contra uma obra que lhes retira parte significativa dos lucros ou lhes rouba mais de centena e meia de postos de trabalho.
De facto, são mais de 150 os camiões cisterna carregados de combustível que todos os dias cruzam a 2.ª Circular, para assegurar o abastecimento de aeronaves no aeroporto internacional Humberto Delgado.
Autênticas «bombas relógio», segundo a Quercus. Ainda esta semana, João Branco, presidente daquela organização ambientalista, disse ao i (edição de terça-feira), que «se houver um acidente, será como uma bomba», lembrando que «o jetfuel é um material muito mais perigoso do que o combustível normal». 

Curiosamente, numa altura em que o poder político e os ambientalistas parecem tão preocupados em reduzir a circulação de automóveis movidos a gasolina e a gasóleo, propagandeando a indústria dos automóveis elétricos e os interesses associados aos ‘tezlas’ deste mundo, não se vê nem um protesto contra o cada vez mais concorrido tráfego aéreo. Está tudo de olhos postos no chão e já ninguém levanta a cabeça?
Uma das imagens mais marcantes dos últimos dias foi a da jovem sueca de 16 anos, Greta Thunberg, discursando no Parlamento Europeu em nome da causa da sua ainda tão curta vida – a salvação do planeta Terra das alterações climáticas e dos atentados ambientalistas.
Greta não conteve as lágrimas enquanto falava com voz embargada perante uma plateia de eurodeputados igualmente comovidos e embevecidos com a argumentação da jovem ambientalista palestrante.
No Parlamento Europeu há umas largas centenas de eurodeputados e mais uns largos milhares de assessores e funcionários cujas ‘pegadas ecológicas’ deixam muito a desejar. Desde logo porque são assíduos viajantes de avião, entre os seus países natais e Estrasburgo e Bruxelas: andam permanentemente no ar.

Choram com Greta Thunberg, é verdade, porque não há ‘planeta B’, e elogiam a juventude contestatária e ativista pró-ambiente, mas nada fazem para eles próprios reduzirem os riscos a que expõem o planeta. Uns e outros.
Basta olhar o céu. E as nebulosas, já não feitas de água condensada que faz o seu ciclo normal pela vida, mas de poluição.
Já lá vai o tempo em que, como dizem os mais antigos e sábios, mesmo nos dias de céus mais negros e bem cerrados, havia sempre uma nuvem branca. Ou, no fundo, um sinal de esperança.

A verdade é que, nos dias que correm, mesmo nos dias de céu mais limpo e mais azul, também passou a haver sempre uma nuvem branca… mas de poluição.
Porque não há hora do dia, seja com chuva ou com sol, em que não se descubra, pelo menos, um avião no horizonte.
E as nuvens brancas que cortam os céus traçam, no fundo, as rotas que se multiplicam nos vários corredores transnacionais, com alturas várias, orientações díspares, destinos cruzados.
São milhares e milhares por todo o mundo, a toda a hora. Há vários sites que nos dão em tempo real e com rigorosa georreferenciação todos os aviões que estão no ar (https://www.flightradar24.com). É impressionante. Mesmo!
Ninguém se incomoda? Ou o contrário implica sacrifício ou incómodo muito maior?
O cenário está claro para toda a gente… e é negro. E se ainda há uma nuvem branca é cada vez mais pequenina. 
Ou, então, é poluição.