Sobre a falência das bicicletas partilhadas em Lisboa

A criação do sistema de bicicletas partilhadas de Lisboa – GIRA – incentivou a utilização de bicicletas enquanto modo suave de mobilidade na cidade. Mas a insuficiência de bicicletas e a recorrente indisponibilidade tornaram o sistema pouco fiável. Apenas alguns meses após a entrada em funcionamento da GIRA começaram a ser notórias as falhas que…

A criação do sistema de bicicletas partilhadas de Lisboa – GIRA – incentivou a utilização de bicicletas enquanto modo suave de mobilidade na cidade. Mas a insuficiência de bicicletas e a recorrente indisponibilidade tornaram o sistema pouco fiável. Apenas alguns meses após a entrada em funcionamento da GIRA começaram a ser notórias as falhas que se foram acumulando. Menos de dois anos depois do seu início o contrato com a empresa que geria o sistema foi rescindido por manifesto incumprimento.

As necessidades de mobilidade e a urgência de apostar em políticas que aumentem a sustentabilidade energética, ambiental e económica da mobilidade urbana criaram as condições para soluções de transporte partilhado de bicicletas, motas e veículos ligeiros como complemento ou alternativa ao transporte individual ou ao transporte público.
A mudança de mentalidades, as preocupações com o ambiente, o investimento em ciclovias e o surgimento de bicicletas elétricas foram fatores que, conjugadamente, criaram as condições para que os lisboetas procurassem a bicicleta como meio complementar (ou alternativo) para as deslocações na cidade.

A GIRA surgiu em setembro de 2017 e foi apresentada como um meio de mobilidade suave e amigo do ambiente, pretendendo ser um instrumento complementar aos transportes públicos, tornando a cidade mais acessível e com melhor ambiente. Tratou-se de um elevadíssimo e polémico investimento do município, através da EMEL, que adjudicou, por um valor superior a vinte milhões de euros, um sistema de bicicletas partilhadas em algumas zonas da cidade com cento e quarenta estações e perto de mil e quinhentas bicicletas que deveriam de estar totalmente disponíveis desde meados de 2018.

No entanto, a realidade é que o número de docas operacionais é cerca de metade do previsto e o número de bicicletas disponíveis é bastante inferior a metade do que era suposto.

Perante esta situação a EMEL decidiu rescindir o contrato por incumprimento e lançar novo concurso para gerir o sistema, completar o que falta e ampliar a rede.

O presente cenário envolve consequências e incertezas. Importa garantir o ressarcimento do prejuízo causado ao município, através das indemnizações previstas, assegurar a gestão e manutenção do sistema, completar a rede ainda em falta e corrigir os erros verificados na gestão do sistema, aumentar a fiscalização e alargar a oferta a toda a cidade em número adequado à procura.

Em qualquer circunstância existe um prejuízo causado aos lisboetas aos quais foram criadas expectativas de utilizar a rede GIRA como meio de transporte na cidade mas na qual não puderam confiar. Este prejuízo não será compensado.
Importa garantir que o anúncio de um novo concurso para a gestão do sistema de bicicletas partilhadas com o alargamento da rede é mais do que uma fuga em frente e que não serão cometidos os mesmos erros.

Será a oportunidade para melhorar a utilização do sistema com a alteração da idade mínima de utilização (não faz sentido colocar bicicletas à porta das escolas mas depois não permitir a sua utilização por parte dos alunos), criar uma modalidade de utilização familiar (à semelhança do que foi implementado no passe dos transportes públicos) e integrar a rede no passe dos transportes públicos de Lisboa.

A nova fase da GIRA terá de assegurar fiabilidade e disponibilidade adequada à procura. O que está em causa é também a recuperação da credibilidade do sistema.