Alta tensão no PSD e ameaças de desmobilização

Entre vetos políticos, ameaças de demissão, imposições da direção e episódios de gritaria, são vários os ‘tumultos’ que decorrem em metade das 18 distritais do PSD. E já há apoiantes de Rui Rio que o vêem como ‘um embaraço’. 

A organização das listas de candidatos a deputados pelo PSD está a provocar «tumultos» e momentos de alta tensão no partido. Entre ameaças de demissão, vetos políticos, críticas de imposições e centralismo da direção, este é o cenário que se vive em quase metade das 18 distritais do PSD. 

O processo da escolha dos candidatos arrasta-se há dois meses e está longe de ser pacífico. Esta semana, por exemplo, em Santarém, foi registado o momento insólito, que envolveu gritaria entre o vice-presidente Nuno Morais Sarmento e o presidente da Câmara, Ricardo Gonçalves.

São já vários os militantes que ao SOL falam em desmobilização para a campanha e as contas que têm sido feitas em várias distritais apontam para o pior resultado de sempre do PSD. 

Vários ex-dirigentes ou deputados têm assistido, por fora, ao processo e tecem duras críticas à direção de Rui Rio. É o caso do ex-vice-presidente Carlos Carreiras, que ao SOL diz que «já não existe uma comissão política» no partido, existindo sim, «uma comissão liquidatária». O autarca de Cascais – congratulando-se com a escolha de quatro sociais-democratas cascalenses para a lista de Lisboa, mas dizendo não perceber por que «ficou de fora o melhor deles» (Miguel Pinto Luz) – salientou que «há uma total falta de respeito e de consideração pelo partido, pelas bases, pelos militantes e pelos simpatizantes».  

Também José Eduardo Martins, ex-deputado e ex-secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, publicou ontem um post arrasador a Rui Rio, frisando que «pela primeira vez» em 25 anos de militância se sente «arrependido» por ter apoiado o atual presidente do PSD – que vê hoje como um «embaraço» – na disputa do partido contra Santana Lopes. «Nunca pensei em dizer isto, mas pior não se imagina», remata José Eduardo Martins para quem «a combatividade que não lhes assiste onde faz falta sobra em rancor para dentro» do partido. 

Opinião parilhada pelo deputado Carlos Abreu Amorim que também usou o Facebook para escrever que «bastava uma dose mínima de inteligência política por parte de quem lidera, polvilhada com um pouco de boa vontade e algum bom senso e, estou convencido, este e outros casos lamentáveis teriam sido evitados».

Antecipa-se, portanto, um conselho nacional bastante tenso no próximo dia 30. O SOL resume algumas das polémicas que estão a acontecer em alguns distritos.

sms em Aveiro 

Em Aveiro, um dos bastiões sociais-democratas, espera-se o pior resultado de sempre para o PSD, dizem ao SOL várias fontes do partido que acusam o presidente da distrital, que é também vice-presidente do partido, de centralizar a decisão da escolha dos candidatos. 

Para organizar a lista de candidatos, Salvador Malheiro não reuniu com a distrital e foi informando os candidatos que decidiu convidar através de SMS, contam ao SOL várias fontes da distrital. E, de acordo com as mesmas fontes, Malheiro definiu, sem qualquer reunião ou votação, os candidatos até ao 5.º lugar da lista. Às concelhias pediu, via SMS ou WhatsApp, sugestões de candidatos para ocuparem do 6.º ao 10.º  lugares da lista. Ora, as contas que se fazem no distrito apontam para que o PSD não consiga mais do que cinco ou seis deputados. Nas legislativas anteriores, o PSD elegeu oito deputados.

«Em Aveiro o processo de escolha dos deputados está a ser comunicado por SMS. Isto é inenarrável», queixou-se uma fonte do PSD do distrito ao SOL. Outras fontes garantem que Aveiro foi a única distrital que até à data não reuniu com a direção do partido para discutir o assunto. 

A única reunião que houve sobre este processo foi com a distrital, decorrendo no passado dia 1 de julho, e serviu para aprovar as listas por ordenação alfabética, tal como pediu a direção nacional.   

Por seu turno, Salvador Malheiro desmentiu «categoricamente» ao SOL esta versão dos factos.

gritaria em Santarém

Em Santarém, durante uma reunião entre a distrital e a direção nacional, assistiu-se a um momento insólito. O secretário-geral do partido, José Silvano, informou a distrital que a direção tinha aprovado a inclusão do deputado Duarte Marques na lista daquele círculo eleitoral. 

A decisão não surpreendeu, mas para que Duarte Marques fosse incluído na lista foi preciso excluir Ramiro Matos, que ocupava o terceiro lugar. E foi esta troca que gerou um conflito aceso entre Nuno Morais Sarmento, vice-presidente do PSD, com o presidente da Câmara de Santarém, Ricardo Gonçalves, que é presidente da concelhia e estava no encontro em substituição da mulher, que é vice-presidente da distrital. Desagradado com a exclusão de Ramiro Matos, o autarca terá aproveitado o momento  para lembrar a Sarmento que teria uma notificação para lhe entregar por falta de limpeza dos terrenos de família. Ora, o antigo ministro já tinha recebido uma notificação e não gostou que o autarca usasse o espaço de negociação das listas no PSD para abordá-lo na qualidade de munícipe. A partir daí, o tom da conversa mudou e Ricardo Gonçalves terá dito que Duarte Marques iria para as listas de candidatos porque teria um «padrinho». A referência era para Morais Sarmento, com quem Duarte Marques trabalhou há mais de quinze anos, como assessor, antes de ser eleito líder da JSD ou deputado no Parlamento. Nessa altura, Sarmento terá aconselhado o autarca a olhar mais para o seu trabalho no concelho. A conversa azedou e houve muita gritaria, entre apelos à calma de terceiros. A tensão continuou fora da sala de reunião e sempre em clima muito conflituoso. O processo acabará por ser decidido no conselho nacional do próximo dia 30.

Inicialmente, o deputado Duarte Marques ficou excluído da lista de candidatos, apesar de o seu trabalho ser reconhecido, sobretudo na área da proteção civil. Na passada quinta-feira, o presidente da distrital, João Moura, reconheceu que o encontro «foi crispado»  e que Duarte Marques faria bem em dar o lugar, não se «sujeitando a entrar na lista com uma cunha». 

Setúbal sem Maria Luís

Em Setúbal, a seleção dos candidatos para a lista tornou-se um barril de pólvora, tendo levado a direção do PSD a lançar um ultimato ao presidente da distrital, Bruno Vitorino, para esclarecer se concluía, ou não, a escolha dos nomes que vão fazer parte do elenco de candidatos. A ordem foi feita por e-mail e sem margem para mais conversa. «Isto atingiu os limites do aceitável. Tornou-se um processo completamente atípico e de um partido pouco democrático», afirmou Bruno Vitorino, líder da distrital.  

O ultimato da direção do partido foi feito após Bruno Vitorino ter ameaçado com a demissão da presidência da distrital, depois de o nome de Maria Luís Albuquerque, ex-ministra das Finanças de Passos Coelho, ter  sido vetado por Rui Rio. Caso  o presidente da distrital recusasse fazer a lista, o partido iria pedir ao cabeça-de-lista daquele círculo eleitoral, Nuno Carvalho, e ao líder parlamentar, Fernando Negrão, que terminassem o processo. 

Setúbal é a distrital que está mais atrasada. Os únicos nomes definidos na lista de candidatos são os que ocupam os dois primeiros lugares e, fontes daquela distrital, garantem ao SOL que não há ainda diretor de campanha nem tesoureiro. «O processo está paralisado», frisam. Entretanto, o SOL apurou que já foram retomados os contactos para selecionar os nomes que vão ocupar os restantes lugares da lista. Mas algumas concelhias estão a avaliar se indicam os mesmos nomes que já tinha proposto há três semanas. 

Neste momento, existe um misto de revolta contra os procedimentos da sede nacional e contra o líder da distrital, Bruno Vitorino, que se queixou de intrigas da direção. 

O presidente da distrital criticou a exclusão de Maria Luís da lista, mas Bruno Vitorino – que tem sido crítico da direção de Rui Rio – não  apresentou qualquer lista ordenada junto das concelhias para que fosse votada. Ou seja, formalmente a distrital nunca aprovou o nome da ex-ministra, não sendo líquido que Maria Luís quisesse ficar nas listas não sendo a cabeça-de-lista.

Veto em Braga

Esta semana ficou também confirmado oficialmente que Hugo Soares não fica nas listas por «imposição» de Rui Rio. Decisão que teve o aval da comissão permanente. A imposição já estava pré-anunciada. Soares, recorde-se, foi braço-direito de Luís Montenegro, assumido challenger de Rio na disputa interna pela liderança. Mas o veto de Rio estendeu-se a João Granja, vice da distrital de Braga e diretor de campanha no distrito. O dirigente vai agora avaliar até ao conselho nacional se mantém o cargo como diretor de campanha no distrito. Outra polémica passa pela escolha de Carlos Eduardo Reis para ocupar o quarto lugar nas listas por Braga. Carlos Eduardo Reis é um dos principais suspeitos do inquérito Tutti-Frutti, que investiga alegados esquemas de contratações e adjudicações diretas entre empresas e autarquias. 

Lisboa em rebuliço

Também a maior distrital do país, Lisboa, está em rebuliço depois de Miguel Pinto Luz – um dos críticos de Rui Rio e ex-líder da distrital – ter sido vetado pela direção do partido para fazer parte do elenco de candidatos. O caso não é para menos. No círculo com maior número de deputados, Rui Rio quererá ter espaço para colocar vários nomes e a estrutura, liderada por Pedro Pinto, sabe que tem pouca margem para impor as suas escolhas. 

Ainda assim, o líder da distrital, deputado e vice-presidente do PSD garantiu que Miguel Pinto Luz «era o primeiro nome» a ser indicado pela distrital. Desta forma, este foi outro dos casos em que a direção do partido não acolheu as sugestões do aparelho.     

Líder local vetado em Viana 

Em Viana do Castelo, o presidente da distrital, Carlos Morais Vieira, também  viu o seu nome, indicado para o terceiro lugar da lista, ser vetado pela sede nacional.

Por isso, a estrutura do partido enviou ontem um comunicado, em forma de protesto contra a decisão da direção, frisando que recusa aceitar o veto ao líder da distrital classificando a decisão de Rui Rio como «infundada e inaceitável», ligando-a a «motivos pessoais». No documento, lê-se ainda que a distrital garante que não vai «permitir jogadas de bastidores de elementos que nada têm feito pelo PSD no distrito».       

Viseu cerra fileiras 

Em Viseu, um dos bastiões mais fortes do PSD, conhecido como  ‘Cavaquistão’, também há tensão. No início desta semana, além do cabeça-de-lista, Fernando Ruas, ex-presidente da Associação Nacional de Municípios,  era vontade da direção em impôr mais um nome na lista, através  da quota nacional. Decisão que o líder da distrital, Pedro Alves, tem tentado travar. 

Este situação gerou um cerrar de fileiras entre Fernando Ruas e Pedro Alves. Fora do elenco de candidatos por este círculo eleitoral está João Montenegro, antigo assessor de Passos Coelho, apurou o SOL.

Évora perde candidato

No sul do país, em Évora, antes de formalizar a lista, Rui Rio perdeu um candidato. António Costa da Silva recusou ocupar o segundo lugar, depois de a presidente da distrital de Évora, Sónia Ramos, ter sido a escolhida pelo presidente do partido para encabeçar a lista de candidatos. Decisão tomada por Rui Rio, mesmo depois de, nas últimas semanas, Costa da Silva ter estado em cima da mesa para encabeçar a lista. 

Depois de ser preterido, o parlamentar preferiu não se alongar nas razões da sua saída, dizendo apenas que lhe «parece evidente para todos que não faz sentido nenhum pertencer às listas».