Greve com dias contados

A greve dos motoristas tem início marcado para esta segunda-feira e não deverá durar mais do que três ou quatro dias. Depois, no dia 19, Pedro Pardal Henriques anuncia a candidatura como cabeça de lista por Lisboa pelo PDR, partido liderado por Marinho e Pinto.

Todas as hipóteses estão em cima da mesa: manter, adiar ou cancelar a greve. Estes são os cenários que estarão hoje em cima da mesa no plenário dos dois sindicatos – Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP) e Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias (SIMM) – que apresentaram o pré-aviso de greve, a começar na segunda-feira. Ao SOL, os sindicatos garantiram que, depois de todas as confusões ao longo da semana, os motoristas têm agora ainda mais vontade de parar de trabalhar e de mostrar «que ninguém os cala».  

O Governo declarou estado de crise energética a partir das 00h de hoje e António Costa convocou o gabinete de crise igualmente para a manhã deste sábado. Nesta reunião estarão presentes os ministros do Ambiente, do Trabalho, dos Negócios Estrangeiros, da Defesa, da Administração Interna e o secretário de Estado das Infraestruturas. Do parecer da PGR, à decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, passando pelas longas filas de carros para abastecer em todo o país, esta é uma greve que ainda nem começou, mas que já está a dar dores de cabeça aos portugueses, ao Governo e até aos sindicatos.

Se a greve avançar… Uma das hipóteses – a que os sindicatos têm defendido – é que a greve comece já esta segunda-feira. A avançar, o SOL sabe que a greve não deverá durar mais do que três ou quatro dias, já que está previsto para o próximo dia 17 o anúncio de Pedro Pardal Henriques, advogado do SNMMP, a cabeça de lista por Lisboa pelo Partido Democrático Republicano (PDR), liderado por Marinho e Pinto. E este voo para a política não deverá acontecer em período de greve.

Durante a greve, os motoristas estão obrigados pelo Governo a cumprir os serviços mínimos que variam entre os 50% e os 100%, conforme o despacho anunciado esta semana por Vieira da Silva, ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, e por João Pedro Matos Fernandes, ministro do Ambiente e da Transição Energética. Para os postos de abastecimento foram decretados serviços mínimos de 50%, para os supermercados 75% e para os aeroportos, hospitais, centros de saúde, bombeiros e forças armadas os motoristas têm de assegurar 100% do transporte de combustíveis.

O parecer encomendado pelo Governo ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre a legalidade da greve foi entregue esta quinta-feira ao ministério tutelado por Vieira da Silva. Ainda que pouco se tenha clarificado sobre a legalidade ou ilegalidade desta greve, o documento deu ao Governo ainda mais armas nesta guerra com os sindicatos: «O Conselho Consultivo não dispõe de elementos para afirmar que esta greve é ilícita». Acrescenta a PGR que a licitude da paralisação só poderá ser verificada no decorrer da mesma. Mas, quanto aos serviços mínimos, como descreveu a PGR, caso a greve afete «a vida, a saúde e a integridade física das pessoas ou o regular funcionamento de setores essenciais de interesse público e da economia nacional, provocando prejuízos desmesurados, os serviços mínimos podem e devem ser mais extensos». 

O documento vai ainda mais longe e diz que o Executivo de António Costa pode mesmo avançar para uma requisição civil preventiva, caso se justifique.

Em reação ao parecer, Vieira da Silva não poupou elogios e agradeceu várias vezes à PGR «pela análise da situação complexa».

Se a greve avançar… e motoristas não cumprirem serviços Caso seja necessário, o Governo já afirmou que avançará com agentes da Polícia de Segurança Pública (PSP) e da Guarda Nacional Republicana (GNR) para o transporte dos combustíveis e de mercadorias. A tutela avançou que estão a ser formados 521 homens – o ministro do Ambiente frisou que não há qualquer mulher – para o efeito, adiantando que, na hipótese de ser necessário acionar este plano, apenas 180 elementos serão precisos. Esta medida está a gerar polémica dentro das forças de segurança por várias razões: a formação, dizem os sindicatos, é dada em pouco mais de uma hora, além de que os agentes terão de fazer o trabalho de carga e descarga de combustíveis. 

Ao SOL, Pedro Carmo, presidente da Organização Sindical de Polícia (OSP/PSP) explicou que os agentes da PSP não estão preparados para fazer o trabalho de carga e descarga das mercadorias, «porque não tiveram formação para tal e, além disso, é um risco para os profissionais». Paulo Rodrigues, presidente da Associação Sindical dos Profissionais de Polícia (ASPP), também já tinha explicado ao jornal i, que a formação da qual o Governo falou «é mais uma palestra, que dura pouco mais de uma hora» e em que a parte prática não ultrapassa os cinco minutos. «Estamos a falar de uma formação que não é suficiente e não consegue preparar ninguém para coisa nenhuma», alertou Paulo Rodrigues. Além disso, «utilizar os polícias para fazer este trabalho – além de ser constrangedor, porque vão ficar com uma má imagem aos olhos dos outros trabalhadores – transmite a ideia de que são um braço armado do Governo para tudo e qualquer coisa», referiu o presidente da ASPP.

Os sindicatos apelidaram a fixação dos serviços mínimos decretados pelo Governo de «serviços máximos» e não aceitaram aquela decisão, ainda que tenham de a cumprir a partir de segunda-feira. O SNMMP entregou logo na quinta-feira uma providência cautelar ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa para impugnar os serviços mínimos, mas o pedido foi rejeitado menos de 24 horas depois. Decisão da qual o sindicato garantiu que voltaria a recorrer. 

Do lado dos motoristas de mercadorias, a providência cautelar foi entregue na quinta-feira à noite no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, onde o SIMM tem morada fiscal, explicou Anacleto Rodrigues, presidente do sindicato ao SOL. E até à hora de fecho desta edição este tribunal ainda não havia tomado qualquer posição.

Se a greve for adiada… A hipótese de adiar a greve não pode ser colocada de parte. Ainda que do lado dos motoristas de matérias perigosas, Pedro Pardal Henriques tenha garantido ao SOL que o SNMMP não está a planear o adiamento da greve e que quem levantou essa possibilidade está a «mentir». 

Ao jornal i, Anacleto Rodrigues (do SIMM) tinha explicado no início da semana que a hipótese de retirar o pré-aviso da greve de dia 12 nem sequer estava em cima da mesa. Questionado sobre a possibilidade de a paralisação acontecer em setembro, um mês antes das eleições legislativas, o presidente do Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias foi bem claro: «Isto das eleições foi mais uma das declarações do doutor Pedro Pardal. Quando se entra numa guerra, tem de se ter uma estratégia e, quer queiramos, quer não, quando as próximas eleições forem disputadas, serão por um partido que agora é Governo e que pretende ser Governo numa nova legislatura, será uma forma de pressionar o poder político». 

E, já depois disso, contactado pelo SOL, Anacleto Rodrigues não afasta essa hipótese, já que, como explicou, «a decisão está nas mãos dos associados». O sindicalista adiantou ainda que o único beneficio de adiar a greve é a possível abertura das negociações com os patrões – a ANTRAM só aceita voltar a negociar se «não tiver a espada em cima da cabeça». Adiar a greve pode ser estratégia política de Pardal Henriques ou uma última oportunidade para chegar a acordo com patrões.

Se a greve for cancelada… Cancelar a greve é o cenário mais favorável ao Governo. A menos de dois meses das legislativas, a tutela tem de mediar uma negociação que pode retirar votos. Se este sábado, em Aveiras, os associados dos dois sindicatos decidirem que afinal não vão fazer greve, a ANTRAM senta-se à mesa com os trabalhadores para discutir um contrato coletivo de trabalho – na expectativa de que os sindicatos recuem na proposta que fizeram sobre os aumentos para os próximos anos: salário base de 800 euros com aumentos de 50 euros, todos os anos, até 2025.