Miguel Pinto Luz. ‘Todos os líderes que esquecem o legado do PSD cometem um erro grave’

Miguel Pinto Luz acredita que o partido perdeu espaço ao centro nas legislativas. Admite que o PSD está ‘cada vez mais pequeno’ e aponta o dedo a Rui Rio… mas não só. Se não for à segunda volta, votará, mas não diz em quem.

Miguel Pinto Luz. ‘Todos os líderes que esquecem o legado do PSD cometem um erro grave’

No barómetro da Eurosondagem que o SOL publicou na edição passada obteve 15% das intenções de voto, tendo em conta inquiridos que dizem votar PSD. Sente-se confortável com estes números?

Claro que me sinto confortável.  Sou daqueles políticos que não desvalorizam as sondagens. Não nos podemos esquecer que foi a  última candidatura a arrancar para o terreno, o candidato mais novo, a candidatura mais irreverente, se assim quiser. É com enorme satisfação que vemos os resultados.

Sente-se como o candidato mais irreverente dos três?

Sem dúvida alguma. Aquele que está a tocar em temas que mais ninguém quer tocar, aquele que quer fazer do PSD um partido reformista, que não fazer do PSD um partido conservador, um partido cristalizado, incapaz de se adaptar aos novos tempos. 

Quais são as grandes diferenças entre a sua candidatura e as de Rui Rio e Luís Montenegro?

As três candidaturas têm posturas completamente diferentes. Rui Rio tem uma postura de utilizar a mesma receita que nos trouxe até aqui: o recentramento do PSD, que, aliás, foi a receita que garantiu à esquerda o melhor resultado desde o 25 de Abril. Por outro lado, Luís Montenegro tem uma agenda que ainda é desconhecida, veremos aquilo que irá apresentar, mas, para já, em termos de posicionamento ideológico e político, coloca-se bem mais à direita do que eu e, numa lógica de que é preciso juntar todas as siglas do centro-direita para conseguir uma nova maioria governativa em Portugal. Claramente, eu não me coloco nessa posição. Entendo que o PSD tem de ser genuíno, tem de ser o PSD que eu conheci desde sempre (há mais de 25 anos que milito neste partido) e é esse PSD  que eu quero que apareça de novo.

Disse que Rui Rio apresentou uma receita que permitiu o melhor resultado da esquerda. Rui Rio afunilou o PSD?

Sim, claramente. Aliás, os dois posicionamentos afunilam o PSD.

De Luís Montenegro e de Rui Rio?

Claramente. Ambas as posições estão erradas, tanto o posicionamento de criticar Rui Rio pura e simplesmente por recentrar o PSD como Rui Rio criticar Luís Montenegro por ele colocar o PSD mais à direita.  O centro de gravidade do PSD não é um, nem é outro. O centro de gravidade do PSD é aquele que é capaz de equilibrar uma posição com profunda preocupação social, onde o Estado deve estar presente, deve acudir aos que mais necessitam, deve regular os mercados e, por outro lado,  defender a liberdade de expressão, de opinião, individual, a liberdade de escolha. Que não tem qualquer preconceito em relação à iniciativa privada. O eleitorado do centro é muito importante para fazer crescer o PSD, mas não é verbalizando-o que vamos recentrar o partido. É fazendo políticas para o centro, tal como temos de fazer políticas à direita. A prova de que não estamos a fazer políticas ao centro nem à direita é, por um lado, o resultado eleitoral da esquerda nas últimas eleições e, por outro lado, o surgimento à nossa direita de forças políticas como o Chega, a Iniciativa Liberal e o Aliança. Essas forças políticas aparecem porque não fomos capazes de dar  respostas ao centro-direita.

A crítica que faz a Luís Montenegro de afunilar o PSD por querer agregar várias siglas…

Não é só isso. É posicionar-se no centro-direita e esquecer-se que o PSD  ganha eleições ao centro.  É preciso um PSD ao centro, como Rui Rio afirma, mas não pode é ser só ao centro ou só à direita. O PSD tem que ser um partido suficientemente abrangente para ir buscar todo este eleitorado. As grandes maiorias de Cavaco Silva não foram a recentrar o PSD ou a virar o PSD à direita. Antes pelo contrário.

Advoga a receita de Cavaco Silva?

Advogo a receita de todos os líderes do PSD que foram capazes de serem abrangentes: Cavaco Silva, Passos Coelho, Sá Carneiro. São exemplos cabais de líderes que foram capazes de fazer políticas ao centro e à direita. É injusto, por exemplo, classificar Passos Coelho como um liberal. O seu Governo teve uma enorme preocupação social. 

Rui Rio errou ao tentar distanciar-se da receita de Passos Coelho?

Não foi só Rui Rio. Todos os líderes que esquecem o legado do partido cometem um erro grave. Este partido é demasiado grande e tem um legado demasiado rico para poder permitir a um líder, qualquer que ele seja, fazer tábua rasa ou esquecer o legado do PSD. 

As eleições diretas podem ter um universo eleitoral  reduzido. Não é inevitável uma segunda volta?

Acho que o universo eleitoral não tem nada a ver com a segunda volta. É preocupante o universo eleitoral ser pequeno. Quer dizer que os militantes estão a afastar-se das grandes decisões do PSD. Ou seja, continuamos a fazer um partido cada vez mais pequeno, mas isso também é fruto do trabalho destes anos, de afastar alguns, de uma política de segregar, de dividir e isso afasta muitos militantes.

Luís Montenegro tem dito que espera ganhar à primeira volta, Rui Rio não tem dito muito sobre o assunto. E Miguel Pinto Luz? Quer ganhar à primeira volta no dia 11 de janeiro? 

Não estou preocupado com a tática. Quero ser líder do PSD. E este projeto é para ganhar estas eleições. Agora, se é à primeira volta, se não é à primeira volta, não estou muito preocupado com isso, nem faço essas afirmações categóricas de alguma sobranceria e de desrespeito pelos eleitores. Os eleitores votarão naquilo que  entenderem. Este é um projeto ganhador. 

Se não for eleito e ficar fora da corrida eleitoral, já disse que não vai dar ou endossar apoios.  Se ficar fora da corrida, vai votar?

Vou exercer o meu direito e o voto ficará para mim. E não divulgarei em quem vou votar.

No PSD, normalmente, quem é líder já concorreu e perdeu alguma vez na disputa interna, ou seja, concorre, perde e volta mais à frente. É nesta perspetiva que encara esta candidatura?

Não. Bem, para se ser líder seja do que for, temos de estar disponíveis para perder, caso contrário não estamos predispostos a fazer esta caminhada. Que é uma caminhada difícil. Não acredito em homens providenciais que apareçam só para vencer.  Ao longo da minha carreira política, já perdi muitas vezes, já ganhei muitas vezes e é nesse pressuposto que me candidato nestas eleições. Agora com a ambição de ganhar, naturalmente.

A candidatura de Luís Montenegro denunciou o pagamento anormal de quotas na concelhia de Boticas,   Este caso preocupa-o? 

Não me verá, nem a ninguém da minha candidatura, tomar qualquer posição sobre estas temáticas que não interessam aos portugueses. Esses temas tratam-se dentro da família do PSD e não fora. Só estamos a prejudicar o PSD sempre que trazemos estes temas para a praça pública.

É algum sinal de nervosismo da candidatura de Luís Montenegro?

Não faço ideia. Isso tem de perguntar à candidatura de Luís Montenegro. Há uma comissão eleitoral paritária onde estão elementos das três candidaturas.

Portanto, confia no processo.

Até agora, esse processo tem sido  transparente. 

O próximo  líder do PSD terá  o primeiro teste eleitoral nas autárquicas. Concorda com Rui Rio quando diz que essas eleições podem ser decisivas para o futuro do PSD?

As autárquicas são fundamentais como quaisquer outras eleições. Não podem ser tratadas de forma diferente das legislativas. Têm de ser tratadas com o mesmo profissionalismo, com a mesma vontade e a ambição de ganhar.  São fundamentais no sentido em que a partir das eleições autárquicas o PSD tem de voltar a reconquistar a confiança perdida.

Mas não é tarefa difícil?

É uma tarefa muito difícil, os obstáculos estão lá, estão identificados, mas nós somos um partido que não desiste. Temos muita gente boa capaz de dar a cara nos seus municípios. Temos de repescá-los.

Lisboa é uma das Câmaras que o PSD gostaria de recuperar  pela sua dimensão. Seria candidato à Câmara de Lisboa se fosse eleito líder do PSD? Tem essa ambição?

Esse é um tema que não deve ser tratado agora. Não tenho essa ambição. Aliás, a única coisa que me move é servir o meu país e os meus concidadãos. Temos de organizar a casa primeiro, fazer estas eleições diretas, perceber qual é o caminho no PSD, apresentar um projeto aos militantes, e depois apresentar um projeto aos portugueses. 

Portanto, nem me vai dizer quem seria um bom nome.

Não. Claro que não. Nem vou dizer que já tenho um nome ou que não tenho um nome. Acho que isso não traz nada de bom ao PSD.

As legislativas de outubro passado abriram caminho a novas forças políticas, duas delas à direita. Com esta profusão de forças políticas, é realista o PSD sonhar em governar sozinho daqui a quatro ou oito anos?

Pode ser defeito meu, mas não percebo esse raciocínio. À direita do PSD há sete deputados. Não estou a fazer mal as contas: cinco do CDS, um da Iniciativa Liberal e um do Chega. Na última legislatura, à direita do PSD existiam 18 deputados. Não me interessa a profusão de siglas, porque as siglas que apareceram tiveram um deputado cada uma. A nossa direita está absolutamente rarefeita e a desaparecer. O que quer dizer que onde o PSD tem de conquistar eleitorado é à sua esquerda e reconquistar um centro que não teve respostas no PSD nos últimos anos. Não basta verbalizar que se recentra sem dizer como. E essa é a grande diferença do PSD para o PS.  O PS disse ao centro como é que queria oferecer um projeto de país. E nós não soubemos dizer.

Rui Rio ficou em casa à espera?

A única que nós dissemos foi:  vamos voltar à social-democracia, recentrando o PSD. Qual é o português ou a portuguesa que consegue alimentar os seus filhos à custa de recentramento? Quem é que consegue arranjar um emprego à custa de recentramento? Quem é que consegue progredir e ter mobilidade social à custa de recentramento? Recentramento é uma mão cheia de nada, mas com medidas concretas é diferente. Agora, falar-se de profusão à direita? Mas profusão de quê? De siglas? Existissem dez partidos à direita todos com  um deputado cada um e teríamos menos deputados à nossa direita do que com o CDS nos últimos quatro anos. Hoje temos menos direita do que tínhamos. O que quer dizer duas coisas: ou quem votava à direita deixou de votar, ou quem votava à direita votou PSD. Acredito que o PSD ocupou esse espaço mas perdeu o espaço todo do centro. 

A responsabilidade do aparecimento dessas siglas é de Rui Rio?

É do PSD. Sou muito claro sobre isso.  Eu não consigo ser absolutamente dogmático e binário e dizer que as responsabilidades do PSD que temos hoje são de Rui Rio. Não são. São de Rui Rio, são do Miguel Pinto Luz que foi dirigente distrital e nacional durante muitos anos, serão de muitos líderes do PSD. A responsabilidade é de vários. Naturalmente que o líder que esteve à frente do PSD nos últimos dois anos tem uma responsabilidade acrescida. Mas não podemos sacudir a água do capote. Isso é o princípio do divisionismo.

Esta semana fica marcada pela entrega da proposta do Orçamento do Estado.  O PSD não terá outra alternativa senão votar contra?

O PSD não tem outra alternativa senão votar contra o Orçamento. 

É uma fraude democrática como diz Rui Rio?

É uma fraude democrática. Aí concordo absolutamente com Rui Rio. E vemos isso de uma forma muito clara na Saúde. Na Saúde o documento que apresenta um investimento de mais 900 milhões de euros é o mesmo  que tem, na previsão da execução para 2019, um incremento de 400 milhões de euros em relação ao orçamento do início do ano. O que quer dizer que aqueles mais 900 milhões de euros já não são reais. Porque há 400 milhões de euros que já estão na execução de 2019. Porque o sistema já consome mais do que consumia no início de 2019.

O que está a dizer é que só serão gastos mais 500 milhões na Saúde em 2020?

Eu ainda vou mais longe. Também é claro que a maior parte desses 500 milhões serão para pagar dívidas passadas. Porquê? Porque quando analisamos o mesmo documento que António Costa e Mário Centeno apresentaram, verificamos mais de 400 milhões de euros em consumos intermédios. E, como sabemos que 30% dos consumos intermédios são da área da Saúde, chegamos à conclusão objetiva e clara que consumo intermédio na área da Saúde corresponde a cerca de 120 a 150 milhões de euros e não 500 milhões de euros. O que quer dizer que o sobrante vai ser para pagar dívida passada para não impactar no défice. Na realidade, na melhor das hipóteses e não existindo cativações, estamos a falar de pouco mais de 100 milhões de euros de investimento real na Saúde.  Ora, no final do dia os portugueses sentem-se enganados. É um orçamento que continua a penalizar as famílias, que continua a penalizar as empresas , que aumenta a carga fiscal, que tem a maior carga fiscal de sempre e, depois, baseia-se em pressupostos que, para mim, são absolutamente centrais.

Quais?

Aumento das importações. Continuamos numa lógica de aumentar as importações quando nós sabemos que temos de virar o nosso país para estar menos dependente das importações e virá-lo mais para as exportações. 

Defende o voto contra no Orçamento do Estado, mas o PSD deve apresentar propostas de alteração?

Isso sempre.

É que já houve um ano, para o Orçamento de 2016, que tal não sucedeu.

Eu sei, eu sei, mas o PSD é obrigado a apresentar o seu projeto. O PSD não é um partido de oposição, um partido de bota-abaixo, o PSD é um partido de governo, liderante. A iniciativa política cabe sempre ao PSD, esteja na oposição, esteja no Governo. Desse ponto de vista, tem a obrigação de apresentar alterações sobre o que é que faria de diferente. Porque aí vamos começar a trilhar um caminho de aproximação aos portugueses e dizer connosco os portugueses não vão votar na cópia ou no original. Hoje, os portugueses têm a opção de votar no original que é o PS ou na cópia que é o PSD. É mais do mesmo, não se consegue diferenciar. O nosso projeto tem de ser absolutamente diferenciador da proposta socialista. E, por isso, os portugueses vão ter oportunidade de votar, outra vez, no original, no projeto original, naquele que faz o país crescer e que coloque a esperança no futuro dos portugueses.

Foi um erro não se ter apresentado propostas de alteração ao Orçamento de 2016? Na altura o líder era Passos Coelho e o líder parlamentar era Luís Montenegro.

Acho que estivemos demasiado tempo expectantes. No início, estivemos demasiado tempo a apontar o dedo a um Governo que, do nosso ponto de vista, era ilegítimo; depois, estivemos demasiado tempo expectantes para perceber o que ia acontecer e acordámos tarde para a oposição, para uma oposição clara a uma mentira descarada que estava a ser vendida aos portugueses. Essa mentira, hoje, é óbvia. Os portugueses já perceberam que o Partido Socialista vende aquilo que não tem, oferece orçamentos à esquerda, para depois oferecer execuções a Bruxelas. 

E em que áreas é que o PSD pode mostrar a diferença? 

Temos de reduzir a carga fiscal nas famílias, nas empresas, com incentivos claros para as empresas exportadoras. Este orçamento tem coisas positivas: tem incentivos para a redistribuição de dividendos e transformá-los em capital, as medidas para a natalidade…

Está a falar do aumento das deduções para quem tem mais filhos até aos três anos.

Sou um dos beneficiários, porque tenho três filhos abaixo dos três anos. Sou suspeito para falar. É uma boa medida, mas é muito redutora. É até aos três anos. Isto é que vai incentivar a natalidade? Não, é mais uma vez areia para olhos dos portugueses. 

Em relação à carga fiscal, o PSD deveria apresentar, em sede de discussão orçamental, a proposta de descida do IVA para a eletricidade?

Tive já uma posição pública sobre isso. Fui contra a redução do IVA da eletricidade pura e dura, cega. O IVA é um imposto injusto do ponto de vista social. Estou mais de acordo com a proposta que o Governo agora vem colocar que é a redução do IVA tendo em conta o consumo. Aí já há um incentivo à redução do consumo para ter uma redução do IVA. Aí, sim, deixa de ser um imposto tão cego e é um imposto que vai de encontro a esse objetivo, que deve ser um desígnio nacional, que é o acelerar o roteiro para a neutralidade carbónica e o acelerar a alteração de consumos, nomeadamente, em termos energéticos em Portugal. A nossa balança depende muito da importação energética e nós temos de tornar o país exportador, temos de reduzir as importações e a agricultura pode ajudar à redução dessas importações, mas uma área onde pode ajudar muito à redução das importações é a alteração dos nossos padrões de consumo energético.

Defende um PSD reformista. O ambiente é a principal área onde o PSD deve liderar essa agenda reformista?

Se me perguntar qual é o topo das prioridades da candidatura que eu protagonizo, o topo das prioridades é a assinatura de um novo contrato social com os portugueses. Porque o PSD quis regressar à social-democracia nos últimos dois anos sem nunca nos sentarmos à volta da mesa e perceber o que é que hoje os portugueses querem. Os portugueses hoje querem algo diferente daquilo que quiseram há 40 anos. Hoje, os portugueses têm níveis de literacia muito mais elevados, hoje, 85% dos portugueses têm o 9.º ano de escolaridade, três em cada quatro portugueses têm o secundário, 40%  têm seguros de saúde ou sistemas alternativos de saúde. Isto é paradigmático de que os portugueses querem ter a oportunidade de escolher, querem ter liberdade de escolha e não a têm. Têm serviços de muito pouca qualidade, esperam eternidades por consultas, por cirurgias. A escola pública não nos serve no sentido de garantir a mobilidade social aos nossos filhos.  Quem tem dinheiro prefere colocar os  filhos num bom colégio privado que esteja no topo dos rankings, porque a garantia de mobilidade social é muito mais certa. Desse ponto de vista, os portugueses querem assinar um novo contrato de confiança com o Estado e estão disponíveis para que esse contrato de confiança sejam assinado não só com o Estado, mas também com o setor privado e com o terceiro setor.

Mas o que defende é a contratualização de alguns serviços públicos.

Na área da Saúde, na área da Educação. No caso da Segurança Social, percebermos que a sustentabilidade do sistema vai levar inevitavelmente a um aumento da carreira contributiva em termos de período de tempo, mas também a uma diminuição da taxa de substituição. E os portugueses têm de perceber isso. Que vão ter pensões mais baixas no futuro. Por isso, temos de encontrar novas soluções, novos incentivos para a poupança, para prepararem a sua velhice. A média da OCDE  em termos de taxa de substituição é de 60%. Em Portugal está acima dos 80%. É muito claro que isto vai acontecer. Se nós já sabemos que isto vai acontecer temos de apresentar aos portugueses uma nova solução. 

Quer uma reforma da Segurança Social ou este modelo, combinado com incentivos à poupança serve?

No modelo atual, todos os indicadores apontam para aumentar inevitavelmente a nossa carreira contributiva e baixar a taxa de substituição. Aliás, há relatórios até assustadores que baixam a taxa de substituição de uma forma muito gritante. Imagine que o seu último salário eram mil euros e a sua primeira pensão era de 900 euros. Há relatórios que apontam que o seu salário era hoje de mil euros, mas a sua pensão pode ser de 400 ou 500 euros. Isso é um choque muito grande na vida de um português que descontou uma vida inteira. Temos de criar mecanismos de compensar isso e permitir aos portugueses terem outros níveis de poupança, outras oportunidades de prepararem as suas velhices, as suas reformas, com incentivos. Voltando à área do ambiente, à pergunta que me colocou…

Sim, voltando à área do ambiente.

O topo da agenda foi aquilo que lhe disse de um novo contrato social. Mas, depois, há outras prioridades. O ambiente é a única área em que temos disponibilidade para assinar um acordo de regime, se quiser, porque o ar que nós estamos a respirar hoje…

Um acordo de regime com o PS?

Um acordo de regime com o PS e com todas as forças partidárias que o quiserem. Não há ideologia no ar que respiramos. Acho que nos devemos preocupar com o planeta que queremos deixar aos nossos filhos. E pode ser um desígnio nacional. Queremos ser um país liderante no roteiro para a neutralidade carbónica. Mas depois há áreas como a reforma do nosso sistema político, preparar a nossa economia para a digitalização, para a indústria 4.0, para a robotização, são tudo áreas de que ninguém tem vindo a falar e que nós colocamos no topo da nossa agenda.

Mas essas reformas não se fazem normalmente com os dois maiores partidos, com o PS e com o PSD? Não tem que ser feito com o PS?

Claro que sim, mas com iniciativa política do PSD. Nós vamos ter de voltar a ser uma força maioritária em Portugal para o PS perceber que este é o caminho, que este é o rumo e o Partido Socialista tem de vir a atrás de nós. Foi o que aconteceu em 1982 e em 1989.

Não tem problemas em fazer acordos com o PS, mas não quer é seja interpretado como uma solução de muleta do PS. 

Nós somos os líderes. As revisões constitucionais de 1982 e de 1989 não seriam possíveis sem o Partido Socialista. Não sou um irrealista que pensa que o PSD pode ter uma maioria de dois terços na Assembleia da República para poder proceder a todas as alterações  que sejam necessárias na sociedade.

Nem seria saudável.

Nem é saudável. O Partido Socialista é fundamental neste processo. Só que o PS radicalizou-se, associou-se à esquerda, não olha como uma oportunidade para aquilo que está a acontecer.  Tornou-se um partido conservador, está satisfeito com o país que temos, está satisfeito com o crescimento que temos, está satisfeito com a escola pública que hoje oferecemos. Está satisfeito com os hospitais que temos. Ora, eu não estou satisfeito. 

No único debate televisivo entre os três candidatos, um dos temas levantados foi a ligação ou não à maçonaria. O PAN entregou um projeto de lei para que os deputados revelem as ligações à maçonaria ou ao Opus Dei no seu registo de interesses. Concorda?

Não concordo. Qualquer dia também temos de declarar que somos sócios de um clube de futebol. Acho que cada político deve deitar-se no final do dia com a consciência tranquila.  E, por isso, é que fiz questão de tornar pública essa parte da minha vida. Já passou, mas poderia não ter passado e não teria qualquer complexo em dizê-lo. Os tempos da maçonaria ser algo ilegal já passaram. No Estado Novo estava ilegalizada. Estou afastado. Não me parece que essas atitudes persecutórias de registo desses interesses tragam nada de bom à sociedade. É fecharmos a sociedade e não o defendo.