Continuar a perder ou voltar a ganhar

E pronto, mais uma semana e não saímos disto. Um a um, os partidos esquerda mais, ou mais ou menos, anunciam a sua entrega à abstenção. Sai fumo branco da chaminé de S. Bento.

É certo que estamos ainda na votação inicial. Falta depois, o dramatismo acrescido da discussão, da especialidade, da votação final global.
Em suma, temos pano para mangas.
O Governo agradece. Isto entretém muito. 
Se os partidos que apoiam o Governo quisessem mesmo ser definidores do conteúdo do documento e seus garantes, faziam mais.
Colocavam-se na postura do fiscalizador. Denunciavam quando a verba do orçamento ficava despida da verdade, era cativada, deixava de existir.
Assim e só assim obrigavam o Governo a cumprir com eles.
Mas, não. Fingem estar distraídos.
Têm um mês de diálogo de surdos, a acreditar em alguns deles, e um ano de ensaio sobre a cegueira do que não querem ver.
Não se ficou por aqui Saramago e escreveu também um ensaio sobre a lucidez. Era mais exigente. E o lúcido é, neste caso, aquele ou aqueles que percebem a habilidade e conseguem denunciá-la com eficácia.
O PSD levou muito tempo a decidir o seu sentido de voto. Perdeu tempo, pareceu dar o benefício da dúvida, transigiu. 
Não, a questão não é, entre estar contra por estar ou estar contra depois de analisar.

Na vida de hoje, o tempo conta e conta muito. 
Um orçamento assim é o melhor documento da incapacidade, do negocismo, da falta de projeto.
Assim que foi conhecido devia ser recusado e fazer-se dele o cavalo de batalha da declaração da diferença.  
Recorrendo à apreciação técnica? Não utilizando a apreciação política.
Exatamente aquela que, tendo por base o interesse do país e o bem das pessoas, leva a recusar imediatamente o ‘trompe l’oeil’.
Por isso foi muito interessante acompanhar, também e ao mesmo tempo, a campanha dos candidatos à liderança do PSD.

De um lado os que defendem a estabilidade da liderança. Ou seja, os que entendem que é preciso deixar passar o tempo, consolidar o poder, olhar duas vezes antes de passar uma passadeira, ser temente e paciente. Ou seja, os que entendem que perder uma vez, duas vezes, três vezes, é uma anotação curricular, não é uma vergonha.  
Do outro os que sabem que perder quatro vezes é muito pior.
Ora, porque perdeu o PSD?
Porque se sacrificou e perdeu o sentido da realidade, primeiro.
Porque não demonstrou a coragem necessária, depois.
E não há volta a dar. Ou se interiorizam ambas estas condições, ou se caminha para o abismo. 
O próximo líder do PSD será o que for capaz de fazer esta síntese.

Pelo que tenho visto, Luís Montenegro está mais próximo deste objetivo.
Fala ele das pessoas, não da política sem alma. Fala ele do país, não do regime de pagamento de quotas. Fala ele da clareza das opções, não das nebulosas dos falsos entendimentos. Fala ele da alternativa ao socialismo, não do amiguismo. Fala ele do Estado ao serviço do cidadão, não do cidadão escravo do Estado. Fala ele de outras coisas que não as que nos embalam. Fala ele de nós e do nosso lugar no mundo.
Entretenha-se o partido socialista nos conciliábulos.
Um mundo diferente nos espera.