Portugal está em estado de emergência. E agora, empresas?

O estado de emergência não traz grandes alterações para as empresas a não ser que, mais tarde, venha a ser implementada a quarentena obrigatória. No entanto, novo regime de lay-off pode vir a abranger mais empresas. Trabalhadores independentes também têm direito a um apoio financeiro durante a crise.

O país enfrenta uma pandemia nunca antes vista que afeta, de forma inequívoca, a economia portuguesa. Nesta altura, empresas e funcionários estão a braços com várias questões sobre como agir da melhor forma. No entanto, o estado de emergência ontem declarado não irá trazer grandes mudanças para as empresas. Pelo menos, é o que considera Ricardo Lourenço da Silva, advogado associado do departamento laboral da Antas da Cunha ECIJA. “Uma vez que não foram implementadas medidas de quarentena obrigatória, não existem consequências de maior para os trabalhadores após a declaração do estado de emergência. Deste modo, não dita nenhuma alteração no que concerne às deslocações imperativas para o trabalho”, explica ao i.

No entanto, o advogado deixa o exemplo de Itália. “Questão diferente seria se fosse imposta, como sucede em Itália, uma restrição total de mobilidade (isto é, uma quarentena e/ou isolamento obrigatórios)”.

Ora, caso sejam implementadas em Portugal medidas de quarentena e/ou isolamento obrigatórios, “as empresas podem ter de recorrer obrigatoriamente ao teletrabalho para assegurar a continuação da sua atividade profissional, uma vez que uma das possíveis medidas pode passar pelos trabalhadores não poderem, a partir desse momento, deslocar-se para o seu local de trabalho. Ou, em alternativa, poderem deslocar-se com significativas restrições como acontece atualmente em Espanha”.

O advogado explica, por isso, que se caso se venham a decretar essas medidas, “justificam-se medidas de apoio a empresas e trabalhadores”.

Entre outras medidas que as empresas podem tomar estão a redução temporária do período normal de trabalho ou a suspensão dos contratos de trabalho, “caso se afigure estritamente necessário para assegurar a viabilidade da empresa e a manutenção de postos de trabalho, em situação de crise empresarial, ou ainda, e por fim, e como última medida, o encerramento ou diminuição temporária da sua atividade”.

Lay-off pouco muda Uma das questões onde costuma surgir mais dúvidas está relacionada com o regime lay-off que, segundo o departamento de direito laboral da Antas da Cunha ECIJA & Associados, se traduz “na redução temporária do período normal de trabalho ou na suspensão dos contratos de trabalho devido à impossibilidade temporária parcial ou total, respetivamente, de prestação da atividade por motivos que redundam numa situação de crise empresarial”.

Este departamento explica que existem três requisitos para entrar em regime lay-off: motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, catástrofes ou outras ocorrências que tenham afetado gravemente a atividade normal da empresa; medida indispensável para assegurar a viabilidade da empresa e manutenção dos postos de trabalho e ainda declaração de empresa em situação económica difícil.

O regime de lay-off simplificado entrou em vigor na passada segunda-feira e, “na prática traduz-se numa aceleração e desburocratização procedimental”, não implicando, por isso, “a suspensão dos contratos de trabalho, antes define uma operacionalização procedimental simplificada”.

Mas o acesso ao novo regime de lay-off aprovado no âmbito das medidas relacionadas com a pandemia covid-19 foi alterado com a declaração de estado de emergência e, por isso, pode vir a abranger um número maior de empresas. Se inicialmente o Governo previa apoio financeiro para empresas em situação de crise empresarial que apresentassem uma queda de pelo menos 40% de faturação face ao período homólogo de três meses ou para quem tivesse iniciado a atividade há menos de 12 meses, a portaria ontem publicada é mais abrangente: para ter acesso ao apoio do Governo, a empresa tem de ter uma “quebra abrupta e acentuada de, pelo menos, 40% da faturação, nos 60 dias anteriores ao pedido junto da Segurança Social com referência ao período homólogo ou, para quem tenha iniciado a atividade há menos de 12 meses, à média desse período”.

Ao i, Ricardo Lourenço da Silva explica que “o estado de emergência não altera a possibilidade das empresas recorrerem ao lay-off simplificado (ou mesmo ao lay-off previsto no artigo 298.º do Código de Trabalho). O que significa que esta medida continua a aplicar-se às empresas que preencham os requisitos e, convenhamos, mostra-se uma ajuda essencial para que as empresas consigam assegurar a viabilidade dos seus negócios”, refere.

O advogado explica ainda que a medida não implica necessariamente uma suspensão de contrato. “Trata-se de um “apoio extraordinário à manutenção de contrato de trabalho”, destinado “exclusivamente, ao pagamento de remunerações” do setor privado e social, através de mera comunicação aos trabalhadores, não implicando necessariamente a suspensão do contrato. Quem decide se a pessoa tem ou não de trabalhar é o empregador”, explica.

Assim, o trabalhador só vai receber dois terços da remuneração bruta, um montante que é financiado em 70% pela Segurança Social, sendo que os restantes 30% são pagos pela empresa, que fica dispensada, além disso, de pagar contribuições à Segurança Social.

Recibos verdes Também os trabalhadores independentes, denominados como recibos verdes, “mantém direito a um apoio financeiro durante esta crise de coronavírus”, garante Ricardo Lourenço da Silva, “Nomeadamente a receber no período em que fiquem em casa, por motivos de encerramento das escolas, a tomar conta dos filhos. No entanto, tal como no caso dos trabalhadores por conta de outrem, também os trabalhadores independentes não têm direito a este apoio se o outro progenitor estiver em regime de laboração em teletrabalho”, explica.

O advogado refere também que esses trabalhadores que estejam a enfrentar uma redução drástica da atividade de forma repentina, “seja por falta de encomendas, seja porque há projetos que estão a ser cancelados, vão ainda ter um apoio mensal extraordinário que correspondente ao valor da remuneração registada como base de incidência contributiva”.

Este é um apoio mensal, pago pela Segurança Social, que não poderá ser superior a 438,81 euros. “Portanto, este limite corresponde ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS), o que significa que a ajuda temporária criada pelo Governo para proteger os trabalhadores independentes da crise provocada pela situação epidemiológica do novo coronavírus fica aquém dos 635 euros do salário mínimo, pois toma como referencial o IAS”, avança Ricardo Lourenço da Silva.

Nesse sentido, explica o advogado, os trabalhadores independentes vão continuar a pagar as devidas contribuições para a Segurança Social enquanto recebem o apoio, “mas podem pedir o adiamento das mesmas. As contribuições podem ser pagas num prazo máximo de 12 meses em prestações”.