André Ventura anunciou, nesta segunda-feira, que irá apresentar no Parlamento o “projeto Valentina, que restaurará a pena de prisão perpétua em Portugal”. A posição do presidente demissionário do Chega quanto a este tema é conhecida desde, pelo menos, 2017, quando o então candidato à Câmara de Loures pelo PSD confessou, em declarações ao i, que era “um defensor acérrimo da prisão perpétua periodicamente revista”.
Numa publicação partilhada no domingo à noite, o deputado único utilizou as redes sociais para relembrar que o tema é uma das bandeiras do partido. “O meu coração e as minhas orações estão com a Valentina, cobardemente assassinada. É pela Valentina, por todas as Valentinas de Portugal, que não desistirei enquanto a prisão perpétua para monstros criminosos não for reposta em Portugal”, escreveu Ventura no Twitter e no Facebook.
Da esquerda à direita, não tardaram a surgir fortes críticas em resposta à intervenção do deputado único do Chega.
oportunismo político Ao i, Isabel Moreira afirma que André Ventura viu uma “excelente oportunidade para atiçar os sentimentos das pessoas e fazer apelos ao que de mais instintivo as pessoas podem sentir neste momento e com isso aproveitar-se”. “O que não deixa de ser terrífico”, considera a deputada socialista, acrescentando que com esta intervenção o deputado Chega ignora “o valor associado à imagem e história da criança e à tragédia envolvendo a sua morte”.
André Ventura partilhou as suas declarações no domingo à noite, horas depois de o cadáver da criança de nove anos ter sido encontrado. A deputada socialista defende que, apesar de esta ser uma “excelente oportunidade” para o presidente demissionário do Chega se aproveitar “deste momento” para recordar as suas propostas, estas são “evidentemente inconstitucionais, culturalmente ultrapassadas e consensualmente postas de parte há muito tempo”.
Também contactado pelo i, José Manuel Pureza considerou que a “situação de querer explorar politicamente” uma situação como esta é “deplorável e abjeta”. Sublinhando que “é muito ilustrativo da forma do deputado André Ventura fazer política”, o vice-presidente da Assembleia da República acrescentou que a “exploração de uma situação como esta para efeitos de tentativa de ganho político” chega quase a ser inqualificável.
O deputado do BE confessa repudiar a forma como André Ventura faz política, considerando-a, além de “completamente desqualificada”, também uma “tentativa de explorar emocionalmente aquilo que são situações que merecem, naturalmente, a sua qualificação como casos de polícia”. A exploração política à volta desses casos é, a seu ver, aquilo que de pior a política tem: “Se esta é a nova política que André Ventura tem para mostrar, ela é velha, revelha e a coisa mais abjeta que se pode fazer”.
os ‘abutres’ e as redes sociais A publicação na qual André Ventura garantiu que não ia desistir da prisão perpétua originou imediatas e diferentes reações. Entre comentários de apoio – alguns utilizadores escrevem que, para estes casos, “tinha que ser pena de morte” ou sugerem que, à possibilidade da prisão perpétua, sejam adicionados “trabalhos forçados” – há também imagens de abutres, que vão sendo partilhados por diferentes utilizadores. No Twitter, há mesmo quem, à imagem partilhada, acrescente uma descrição. “Os abutres são aves de rapina que se alimentam quase exclusivamente da carne putrefacta dos animais mortos. A sua constante presença nos locais de morte, tornou-os símbolos desta aos olhos dos Homens”, anota uma utilizadora.
Também comentador político, Daniel Oliveira respondeu ao tweet do deputado, utilizando a referência ao animal. “O ‘senhor’ é um abutre. Tudo lhe serve para sacar votos, para fazer campanha. Nunca existiu na política portuguesa ser tão amoral”, escreve o comentarista.
O dirigente nacional do CDS-PP Francisco Mendes da Silva foi também uma das personalidades que decidiu responder a Ventura: “Para um oportunista não há maior alegria do que uma oportunidade”.
O “projeto Valentina”, segundo a publicação do deputado, tem por objetivo uma “homenagem a todos as vítimas portugueses dos crimes bárbaros e hediondos”. “Nunca te esqueceremos, Valentina, como a muitos outros e outras a quem falhámos”, escreveu o deputado na publicação.