Andam a brincar com a tropa

O Ministério da Defesa, em vez de resolver os graves problemas com que a área se confronta, aparece com uma diretiva [entretanto anulada pelo ministro], com orientações para uma ‘linguagem não discriminatória’ e mais ‘inclusiva’ nas Forças Armadas

Assaltam-se paióis como se de um galinheiro se tratasse, com a agravante de um ex-ministro estar entre os arguidos do caso, foi detetada uma rede de corrupção de milhões na Força Aérea que durou vários anos sem que ninguém desse por isso e que envolve altas patentes militares, migrantes ilegais conseguem fugir de um quartel sem qualquer dificuldade, mas parece que no Ministério da Defesa é a ‘igualdade de género’ quem mais ordena.

As Forças Armadas portuguesas confrontam-se com problemas sérios na sua organização, com restrições à sua capacidade e até com questões que abalam o seu prestígio. No entanto, os responsáveis do Ministério da Defesa, em vez de resolverem os graves problemas com que a área da Defesa se confronta, ‘atiram ao lado’ e aparecem, desastradamente, com uma diretiva [entretanto anulada pelo ministro] com orientações para uma «linguagem não discriminatória» e mais «inclusiva» nas Forças Armadas.

Bem pode o Ministro da Defesa afirmar que se trata de meros «faits divers». Até podia ser só ridículo, não fora a situação crítica das Forças Armadas. As disparatadas ‘orientações’ são uma provocação, tratando os militares como se fossem uns marialvas sem educação.

Vejamos alguns exemplos das ‘orientações’ para se perceber o ridículo da questão: em vez de referir «o coordenador», deverá utilizar-se «a coordenação»; em vez de «os participantes», «quem participa»; «sejam bem-vindos» deve ser trocado por «boas vindas a todas as pessoas». Também expressões como «deixa-te de mariquices’» ou «pareces uma menina» são referidas como inconvenientes e a abolir…

Sem se entender o meio militar e, sobretudo, as respetivas situações de pressão, de esforço extremo ou até de risco da própria vida, não se conseguem adequar as orientações que se pretendem transmitir. No presente caso, também parece ser este o problema.

As questões relacionadas com o assédio ou violência no seio das Forças Armadas são uma realidade e devem ser sancionadas e as preocupações sobre o tratamento não discriminatório são relevantes numa sociedade que se pretende mais justa. Mas importa conhecer e ter sensibilidade para a realidade militar para não cair no ridículo.

O meio castrense tem características próprias que também são parte da identidade e da unidade das Forças Armadas enquanto instituição que concorre para assegurar a defesa e a soberania nacionais. Por isso, o conhecimento, o respeito e a consideração pelas Forças Armadas são condições para exigir o seu empenho em missões em que a vida pode ser colocada em risco. Não é coisa pouca.

As Forças Armadas têm problemas sérios, para os quais importa encontrar soluções. Têm uma estrutura desadequada ou, pelo menos, desequilibrada, graves carências de efetivos que encontram razões na remuneração, na oferta de condições adequadas e no reconhecimento da formação profissional, bem como um subfinanciamento crónico. Estas dificuldades colocam em risco a operacionalidade das Forças Armadas Portuguesas com consequências sérias na fragilização do sistema de Defesa Nacional e até na participação em missões no quadro das alianças militares que integra. Acresce, ultimamente, uma crise reputacional que importa estancar.

Estes são os problemas que importa resolver nas Forças Armadas. O resto são mesmo ‘faits divers’ e, por isso, eram escusados.