Um furacão chamado André Ventura

André Ventura conseguiu ser o maestro das atenções, chamando para o ringue todos aqueles que o fizeram crescer. Quanto mais o atacaram, mais ele subiu.

Há muitos anos que as redações fazem as listas das figuras e acontecimentos do ano, e quando falta coragem – ou os votantes não chegam a acordo – escolhe-se alguém que não incomode as mentes mais sensíveis. Ainda há dias estava a falar com um amigo que me recordava que o Expresso, em 1982, escolheu o Marquês de Pombal como a figura do ano porque a redação não chegava a acordo com os nomes em disputa. A razão apontada para a eleição do estadista foi a de que passavam 200 anos da sua morte e que se justificava realçar a sua importância na vida do país…

Este ano, muitos dos jornalistas optaram por escolher uma equipa – os profissionais de Saúde – em vez de uma só figura, mas não vou por aí. Das três personagens que podiam ser as eleitas – Marta Temido, Graça Freitas e André Ventura –, penso que o líder do Chega é a mais indiscutível. Porquê? Porque provocou um verdadeiro terramoto político apesar de só ter tido 67 826 votos nas eleições legislativas – apenas mais 145 que a Iniciativa Liberal. André Ventura conseguiu ser o maestro das atenções, chamando para o ringue todos aqueles que o fizeram crescer. Quanto mais o atacaram, mais ele subiu.

Veja-se que todas as sondagens lhe dão cerca de 10% das intenções de voto para as eleições presidenciais. Por todas estas razões, parece-me indiscutível que foi a figura do ano. Dir-se-á que Marta Temido e Graça Freitas tiveram um trabalho meritório, enquanto o líder do Chega apelou aos sentimentos mais básicos das pessoas. Até se pode dar isso de barato, mas Ventura foi o grande vendaval da política portuguesa no ano que agora termina. Ao fim de pouco tempo conseguiu o que muitos levaram anos a conquistar: a empatia de muitos portugueses que se reveem na sua agenda. Mas, seguindo o exemplo da France Football, que fez três seleções do século, coloco Marta Temido em segundo lugar e a diretora-geral da Saúde em terceiro.

Foi um ano em que deram o corpo às balas e, mesmo não estando preparadas para uma pandemia – nem ninguém estava –, saíram-se com distinção. Marta Temido, que chegou a ser corrigida em direto pelo primeiro-ministro e atacada nas entrelinhas pelo Presidente da República, nunca vacilou e deu sempre a sensação que, dentro do possível, as coisas estavam controladas.

Quanto ao acontecimento do ano, o lugar mais alto do pódio vai para o confinamento total, que começou em 19 de março e transformou as ruas do país num enorme deserto, alterando por completo a vida dos portugueses e de quem cá vive e trabalha ou estuda.

Fugindo ao tradicional, quero destacar outras figuras. O prémio de melhor jornalista de política, em particular de informação governamental, vai para Marques Mendes. O antigo líder do PSD consegue guardar notícias de semana para semana, muitas delas sopradas por fontes governamentais. E como notícias chamam notícias, muitos outros lhe passam informação. É obra para alguém que ainda sonha em ser Presidente da República – isto faz lembrar alguém…

O prémio da rebeldia vai para Sérgio Sousa Pinto, o deputado do PS que não gosta de entrar em carneiradas e agita as mentes socialistas, deixando algumas à beira de uma apoplexia. Mas, como é óbvio, Sérgio Sousa Pinto tem o seu destino traçado no Parlamento e não fará seguramente mais nenhum mandato. É aproveitar enquanto é tempo.

Por fim, o prémio de diversão do ano vai para a guerra de escoltas entre a PSP e a GNR, que levaram as vacinas de Évora para o Algarve lado a lado. A_PSP a vigiar a GNR_e vice-versa. Não fosse alguma das forças policiais fugir com as vacinas para ir vendê-las nalgum bairro chique. Surreal. Feliz Ano Novo.

vitor.rainho@nascerdosol.pt