Os nazis de Abril e o homofóbico que fala de Paris

Nem Otelo Saraiva de Carvalho, nem Ramalho Eanes podem ficar descansados, pois segundo os novos inquisidores, o seu passado na Guerra Colonial assim o determina.

De acordo com as últimas sentenças da esquerda radical, António Lobo Antunes está proibido de concorrer ao Nobel da Literatura, já que pode ser considerado um «perigoso criminoso de guerra, comparado aos nazis». Também Salgueiro Maia e Marques Júnior, capitães de Abril, verão os seus nomes retirados da toponímia, pois fazem parte do mesmo grupo de perigosos criminosos de guerra. Nem Otelo Saraiva de Carvalho, nem Ramalho Eanes podem ficar descansados, pois segundo os novos inquisidores, o seu passado na Guerra Colonial assim o determina. E o melhor mesmo é nem falar em Jaime Neves, o famoso homem dos Comandos, que à semelhança de Eanes, foi um dos obreiros do 25 de Novembro.

A morte de Marcelino da Mata, o mais condecorado militar do Exército português, levantou outra vez o fantasma da Guerra Colonial, já que o antigo militar nascido na Guiné, e um dos fundadores dos Comandos, não mereceu honras de Estado, dividindo a esquerda e a direita. Houve até quem tivesse atacado o falecido militar por ter lutado por Portugal, esquecendo que ele era português. À semelhança de muitos outros militares naturais de África que foram deixados para trás, e fuzilados depois do 25 de Abril. Também Marcelino da Mata acabaria por ser torturado, mas em Portugal, por militares afetos ao MRPP. Mas calculo que as torturas dos fanáticos do MRPP sejam algo que não interessa discutir à esquerda revolucionária, até porque se estava em pleno período revolucionário. Afinal, as táticas da PIDE eram válidas para todos os traidores à pátria que tinham combatido em nome de um ideal, que era o da coesão do território nacional.

E nem vale a pena dar guita ao papagaio, no que diz respeito a esse grande democrata que dá pelo nome de Mamadou Ba, um incendiário racista que quer que os brancos vão para as Filipinas na Páscoa autoflagelarem-se. Mas não é por isso que se justifica a anormalidade de uns tantos que querem a sua expulsão de Portugal. Digamos que estão bem uns para os outros.

Todos sabemos que foram cometidas atrocidades e injustiças, de ambas as partes, e que a colonização foi levada ao extremo e que devia ter acabado nos anos 60, para não dizer anos 40, à semelhança da Índia – Gandhi será sempre um herói. Isto de acordo com o pensamento da época. Se olharmos para a história com os olhos de hoje, é claro que os Descobrimentos nunca deviam ter acontecido. Isso faz algum sentido?

Mas os novos inquisidores não descansam enquanto não virem a fogueira bem alta. Veja-se o que se passa com o novo presidente do Tribunal Constitucional, que há 10 anos escreveu coisas como estas, a propósito da morte do colunista Carlos Castro: «Era um personagem medíocre, de cujo perfil apenas pude recolher dois traços, que alguma comunicação social considerou merecedores de referência: era homossexual e era ‘cronista social’ […]. O primeiro traço deveria ser completamente irrelevante, já que emerge da liberdade de orientação sexual, que apenas a cada um diz respeito. Todavia, considerada alguma prosa que a ocasião suscitou, terá tornado a vítima mais digna de dó – vá-se lá saber porquê!». Há aqui algum atentado a quem é gay? Mas o que acho mais delicioso diz respeito a outro texto de 2010. Escrevia o então professor universitário: «Digam mal, caramba! Não se queixam de nada? Gostam de aumentos de impostos? Adoram a troika? São cristãos resignados, que esperam que os sacrifícios vos sejam creditados na conta-corrente dos vossos pecados? Já consumiram a vossa capacidade de protestar? Acham que não vale a pena? Também querem ir para Paris estudar filosofia? Estão no país de Bordalo Pinheiro, recordam-se?».Terá sido a questão dos estudos em Paris que incomodou tanto algumas almas? Mistérios…

vitor.rainho@sol.pt