Pai migrante está a ser acusado pela morte do filho durante travessia

O homem procurava segurança e melhores condições na Europa, agora enfrenta uma pena de até 10 anos de prisão. O governo grego diz que “as pessoas que escolhem entrar em embarcações com más condições de navegabilidade, e são conduzidas por pessoas que não têm experiência de mar, obviamente colocam em risco vidas humanas”.

Um homem afegão de 25 anos tentou chegar até à ilha grega de Samos através da rota migratória do Mediterrâneo oriental, que faz a ligação entre a Turquia e a Grécia. O objetivo era pedir asilo naquele país para ele e para o seu filho, de apenas cinco anos, mas o barco naufragou e a criança morreu. Agora está a ser acusado pelas autoridades gregas.

A história é contada em primeira mão pelo migrante à agência de notícias Associated Press (AP), segundo a qual esta poderá ser a primeira vez na União Europeia que um progenitor migrante sobrevivente enfrenta um processo criminal pela morte de um filho nestas circunstâncias. A pena pode ir até aos dez anos de prisão.

O naufrágio aconteceu em novembro de 2020, após o barco onde seguiam ter chocado contra as rochas da zona costeira de Samos. Junto à campa da criança, lê-se numa inscrição: "Afogou-se num naufrágio. Não foi o mar, não foi o vento, foram as políticas e o medo".

"O meu filho estava nos meus braços quando o barco partiu na costa", contou N.A., como preferiu ser identificado, à AP. "Na altura, não entendi o que tinha acontecido. Dei por mim na água. Perdi o meu filho nos meus braços. Olhei à volta à procura dele, não o consegui encontrar. A água destruiu-o [barco], estava bastante vento".

"Sem ele, não sei como viver", afirmou, acrescentando: "Era o único que tinha na minha vida. Todas as minhas esperanças estavam nele".

O migrante, que fugiu do seu país de origem – o Afeganistão – para a Turquia com apenas nove anos, explica à agência noticiosa que "não tinha outra opção a não ser fazer a viagem". Já pedira asilo às autoridades turcas por duas vezes e das duas vezes o pedido tinha sido negado. Agora tinha medo de ser deportado para o Afeganistão, um país que "mal conhece".

Na Grécia tinha "sonhos" e "esperanças". Queria que o filho fosse para a escola, que, ao contrário dele, pudesse aprender a ler e escrever. E, eventualmente, "cumprir o seu sonho de se tornar polícia".

"Não vim para aqui para me divertir. Fui compelido. Não tinha outro caminho na minha vida. Decidi vir pelo futuro do meu filho, pelo meu futuro, para que pudéssemos vir para um lugar para morar e para o meu filho estudar", disse.

A AP revela que os motivos que levaram as autoridades gregas a acusar o migrante ainda estão por esclarecer, tendo em conta que casos semelhantes não são incomuns. Ativistas defendem que esta medida possa ser um indício de endurecimento das políticas de migração na Grécia ou então uma tentativa de desviar a atenção de uma possível negligência da guarda costeira do país.

No entanto, o ministro para as Migrações e Asilo grego, Notis Mitarachi, nega tais acusações. "Se houver perda de vidas humanas, deve ser investigado se algumas pessoas, por negligência ou deliberadamente, agiram fora dos limites da lei", disse Notis Mitarachi, citado pela AP, acrescentando que cada incidente é tratado de acordo com as circunstâncias.

"As pessoas que escolhem entrar em embarcações com más condições de navegabilidade, e são conduzidas por pessoas que não têm experiência de mar, obviamente colocam em risco vidas humanas", afirma.