Legalização da canábis com fins recreativos. Projetos baixam à especialidade sem votação

Ricardo Batista Leite confirma ao i que fará parte do grupo de trabalho que analisará os projectos em sede de especialidade, na comissão da Saúde.

por Henrique Pinto de Mesquita e Maria Moreira Rato

O Parlamento deverá adiar uma tomada de posição sobre os projetos de legalização da canábis para uso recreativo, apresentados pelo BE e pela IL, fazendo-os baixar à especialidade sem votação. A informação foi confirmada ao i pelo deputado social-democrata Ricardo Batista Leite, que adiantou que deverá fazer parte do grupo de trabalho que ficará responsável pela análise e discussão dos diplomas sobre a matéria, na comissão parlamentar da Saúde.

Recorde-se que tanto os bloquistas como os liberais apresentaram projetos de lei apelando à regulamentação da produção, do cultivo, da comercialização, da aquisição, detenção e consumo da planta ou derivados.

Em janeiro de 2019, o Bloco de Esquerda levou o mesmo diploma à Assembleia da República. Na altura, votaram a favor os bloquistas, o PAN e 25 deputados socialistas; já contra, votaram oito deputados do PS, o PSD, o PCP e o CDS. Os restantes deputados socialistas abstiveram-se, assim como o PEV, que, dessa forma, votou distintamente do PCP. Uma posição que, hoje, manterá. Ao i, o PEV explica que o fará “em coerência com os argumentos que haviam sido apresentados na última legislatura”. E quais são? O PEV considera “muito importante” a “separação entre o uso da canábis  para  fins  medicinais  e  o  seu  consumo recreativo ou pessoal”, vendo o “uso recreativo e a possibilidade de cultivo” como uma questão diferente da medicinal. Explica que a sua legalização não é uma “estratégia para a redução de consumo”, mas que uma proibição “sem estratégia de redução e tratamento” também não o é. Quanto à saúde, são incisivos: “Se formos sérios na discussão, sabemos que há estudos para todos os gostos”. Munem-se ainda de outros argumentos, tais como saber “se o facilitismo na disponibilização de cánabis” e consequentes “experiências” podem ou não “transportar e incitar a outro tipo de dependências e toxicodependências”.

Já Bebiana Cunha – líder parlamentar do PAN – explicou ao i que o seu partido também votará a favor dos dois diplomas na generalidade, apesar de na especialidade quererem “ver acauteladas algumas questões que serão amanhã endereçadas”.  Algo que não surpreende, considerando que o PAN havia identicamente apresentado um diploma no sentido da legalização recreativa da Canábis em 2019.

Também a IL e o BE votarão a favor, pelo menos, dos seus próprios diplomas. Questionados pelo i sobre se hoje aprovarão o diploma bloquista, os liberais não responderam. Também sem resposta ficámos por parte do CDS.

Por fim, à esquerda, tanto socialistas como comunistas rejeitaram antecipar o seu sentido de voto.

Já o Chega garantiu ao i que irá votar contra os dois diplomas.

 

Já é legal para fins terapêuticos  

O uso da Canábis foi legalizado para fins terapêuticos em Portugal há três anos.

A legalização do consumo de canábis para fins medicinais está contemplado na Lei n.º 33/2018,  que estabeleceu o quadro legal para a utilização de medicamentos, preparações e substâncias à base da planta, nomeadamente a sua prescrição e a sua dispensa em farmácia, tendo o Decreto-Lei n.º 8/2019 procedido à sua regulamentação.

Segundo informação disponível no site oficial do Infarmed, e corroborada por meio da consulta do enquadramento legal  referido, constata-se que o mesmo enquadramento garante que as preparações disponibilizadas cumprem todos os requisitos necessários naquilo que diz respeito à “demonstração da respetiva qualidade e segurança”, contribuindo, assim, para a salvaguarda e proteção da saúde pública.

O reconhecimento das potencialidades desta planta para fins recreativos tem vindo a ser debatida ao longo dos anos.

Mesmo que o seu consumo ainda não esteja legalizado, existem dados que provam não ser uma novidade para os portugueses em termos recreativos.

Em 2018, o Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências (SICAD) divulgou os dados referentes ao último inquérito nacional sobre o consumo da canábis e entendeu-se que a mesma já foi consumida, pelo menos uma vez na vida, por um em cada dez portugueses. Por sua vez, quase meio milhão consome esta droga ao longo da vida.