É a vida

Não basta dizer que os países pobres não as têm e que a África apresenta uma percentagem muito baixa de resposta à vacinação. Há paradoxos difíceis de explicar. Por exemplo a Nigéria não é um país pobre e tem uma taxa de 4%.

Estamos numa encruzilhada. De um lado a OMS e a ONU alertando para a necessidade de vacinar o mundo inteiro e denunciando a carência de vacinas nos países mais pobres. E esclarecendo que, sem esse objetivo conseguido, variantes novas surgirão e o combate ao vírus será cada vez mais difícil e incerto.

Tal posição significa que não haverá outra forma eficaz de controlar a disseminação posto que a imparável movimentação de pessoas no mundo não deixa outra hipótese. Solução aparentemente simples porque, havendo países produtores de vacinas com regimes capitalistas e estatistas, não se furtariam estes a fornecer as vacinas gratuitamente e sempre seria possível, quanto aos outros, a suspensão temporária das patentes.

A prática não se compraz com estas teorias. O que se acrescenta, como dificuldade superveniente, é a dificuldade objetiva de produzir, ou distribuir, ou ministrar uma tal quantidade de vacinas em tantos diversos países e tal lonjura de distâncias.

Não basta dizer que os países pobres não as têm e que a África apresenta uma percentagem muito baixa de resposta à vacinação. Há paradoxos difíceis de explicar. Por exemplo a Nigéria não é um país pobre e tem uma taxa de 4%.

Por exemplo a África do Sul também o não é, tem investigação de ponta e instituições médicas exemplares e também responde mal. Tão mal que variantes surgem e se disseminam. E os outros países, mesmo que as vacinas se tornassem disponíveis, tenho as maiores dúvidas que conseguissem, porque não têm condições, uma campanha nacional adequada.

Logo, numa considerável parte do mundo, permanecerão por muito tempo focos de instabilidade e de multiplicação de riscos. Se a isto acrescermos o que se passa nos países ocidentais, ou naqueles que privilegiam o princípio da liberdade em todo o seu esplendor, encontraremos outros sinais de preocupação.

Diferentes, certamente. Aqui, os movimentos negacionistas, a particular exigência na determinação do universo a inocular e do seu tempo de execução e a relutância em decretar a vacinação obrigatória.

Portanto, ao longo do tempo, os hiatos na decisão oferecem um universo não vacinado que proporciona, também, riscos acrescidos. Ou seja, em parte significativa do mundo as pessoas não podem estar protegidas, noutras zonas não querem e não são obrigadas a fazê-lo.

O ACNUR explica um caminho possível. A multa. Muitos países optam por tornar a vida social impossível a quem se pretenda alhear do problema. Seja como for, o panorama não é brilhante. E esta contínua barragem de informação verdadeira e falsa sobre a pandemia introduz intranquilidade.

Não só porque aumenta o medo e a incerteza ou o cansaço, mas porque se revela de uma importância capital para os mercados e a economia. Basta ver como os movimentos das Bolsas responderam à incerteza do anúncio da ómitron e à notícia sobre a sua menor agressividade.

Podemos, pois, ter muitas outras preocupações e outros assuntos de que nos ocupar. A Assembleia está dissolvida, a data das eleições está marcada e a nossa atenção e a de todos não consegue fugir deste tema. É a vida, a nossa, que está em jogo.