Doentes a serem enviados pelo SNS24 para os hospitais para fazerem testes à covid-19 e pessoas a recorrer pelo próprio pé às urgências para tentar confirmar resultados de auto testes ou com sintomas ligeiros de covid-19 e sem orientações para o que fazer – o cenário está a deixar os hospitais preocupados. Na grande Lisboa, ontem a situação ao final do dia já era de forte pressão, descreveu ao i fonte hospitalar, com hospitais como o Amadora-Sintra e Loures sem capacidade de resposta e a desviar doentes para os hospitais centrais, mais pressionados. O aumento dos profissionais de saúde de baixa ou em isolamento agrava o problema. “Nos hospitais não há voos para ser cancelados”, comentou ao i fonte hospitalar, referindo-se ao impacto que começa a ser notório no setor da aviação fruto do aumento das pessoas em isolamento ou baixa profilática e que nos hospitais significa rever escalas ao dia. O i tentou perceber junto da Direção Geral da Saúde quantos profissionais de saúde estão em isolamento profilático mas não teve um balanço. A semana começa com 233 mil pessoas em isolamento, entre casos ativos e contactos de alto risco em vigilância, 2,3% da população. Números que deverão disparar ao longo das próximas semanas mantendo-se os atuais protocolos, que em alguns países, como o Reino Unido, já começaram a ser revistos reduzindo o tempo de isolamento de infetados para sete dias, mediante teste negativo ao sexto dia.
Sem informação à população sobre o que fazer neste novo contexto da pandemia, o apelo para que não recorra diretamente aos serviços de urgência em casos não urgentes voltou ontem a soar. “Não vá a um serviço de urgência se tem apenas sintomas ligeiros”, escreveu nas redes sociais Nelson Pereira, diretor da unidade autónoma de gestão da Urgência e Medicina Intensiva do Hospital de São João, no Porto. “É preciso recuar a 21 de novembro de 2020 para encontrar um dia com tantos doentes suspeitos como o de ontem”, indicou, referindo-se a domingo e antecipando uma “black monday” nos serviços de saúde. “Temos um crescimento exponencial de casos, provocado pela variante ómicron… Mas acima de tudo temos uma percentagem imensa de casos que não deviam estar no hospital. Que não conseguem ligar ao SNS24 ou para quem os testes são marcados para vários dias depois, não obstante a presença de sintomas.”
Internamentos começam a subir em Lisboa Entretanto, em Lisboa, onde as infeções mais aumentaram na última semana e a progressão da variante Omicron foi mais rápida, começa a ver-se um aumento dos doentes internados com covid-19. De acordo com informação a que o i teve acesso, os doentes internados com covid-19 aumentaram 14% nos últimos sete dias nos hospitais da região, sendo ontem cerca de 350, mais 45 que há uma semana e a primeira onde parece inverter-se uma tendência de estabilização. Na região de Lisboa e Vale do Tejo, os diagnósticos mais do que duplicaram na última semana (+140%) mesmo com a diminuição da testagem no dia 25 de dezembro, feriado em que muitos laboratórios estiveram fechados. A nível nacional, a incidência de novos casos passa agora o patamar dos 800 casos por 100 mil habitantes a 14 dias, mas em Lisboa já está acima dos mil casos por 100 mil habitantes, com o RT no nível mais elevado desde o início da pandemia. Segue-se o Norte em termos de ritmo de aumento de novos casos, com uma incidência a 14 dias de 733 novos casos por 100 mil habitantes e uma subida de 80% nos diagnósticos na última semana. Os atrasos nos inquéritos epidemiológicos deverão já estar a causar uma distorção na capacidade de deteção e isolamento dos casos, sendo pouco provável que o número de diagnósticos continue a acompanhar como até aqui o aumento das infeções. Na semana passada, de acordo com o último relatório de linhas vermelhas publicado pela DGS e INSA, já só foram rastreados e isolados 58% dos casos, o que se traduz em milhares de inquéritos epidemiológicos pendentes ou em atraso. Em causa nesta análise estavam os casos diagnosticados entre 15 e 21 de dezembro. Fazendo as contas aos boletins da DGS, foram diagnosticados neste período 31 415 novos casos de covid-19. Segundo o relatório, 13 mil não tiveram todos os seus contactos rastreados e isolados em 24 horas.
Infeções aumentam também nos idosos O maior aumento de diagnósticos continuou a verificar-se na população mais jovem: duplicaram nos grupos etários dos 10 aos 39 anos. Ainda assim, o aumento é transversal a todas as faixas etárias, atingindo também os idosos, com uma subida de 47% nos diagnósticos nos últimos sete dias. Uma mensagem que circulava ontem questionava como é que estando 100% dos idosos com mais 80 vacinados, a informação publicada pela DGS, podia haver maior risco de morte nos idosos com mais de 80 anos não vacinados. Há um elemento que ajuda a perceber que não existe uma cobertura a 100% na população de mais de 80 anos: ao longo deste ano, usavam-se estimativas populacionais do INE para indicar quantas pessoas existem em cada faixa etária mas os dados dos Censos, feitos em abril e agora públicos, mostram que a essa altura Portugal tinha 713 mil residentes com 80 anos ou mais, pelo que mesmo nos mais vulneráveis, com cerca de 695 mil idosos com as duas doses, a cobertura vacinal inicial será de 97% e não 100%, o que pode induzir em erro e explica como que se têm registado mortes em pessoas com mais de 80 anos não vacinados. Questionada pelo i sobre por que motivo não foram atualizados os dados, a DGS indicou que “os denominadores relativos à população residente em Portugal encontram-se em processo de atualização em todos os produtos da DGS, prevendo-se a implementação em janeiro 2022.” Em novembro, segundo a informação atualizada pela DGS, ocorreram 300 mortes por covid-19 em Portugal, 195 pessoas com esquema vacinal completo, 10 em pessoas com dose de reforço e 95 pessoas não vacinadas ou com vacinação incompleta. Ter vacina completa continua a representar um risco de morte três a cinco vezes menor, em especial nos mais velhos. Na população com mais de 80 anos sem vacina, os peritos da DGS calcularam uma taxa de letalidade de 26,7%, enquanto no grupo dos infetados vacinados a taxa de letalidade foi de 8,5% e em quem tinha o reforço de 4,7%,ou seja, por cada 100 pessoas com mais de 80 anos sem esquema vacinal completo infetadas, há 27 mortes, baixando para cinco entre quem tem reforço.