Os custos da ideologia na política

Costa tem de sair da armadilha ideológica que o tolhe nas opções das decisões racionais e mais lógicas para Portugal em cada momento.

Há tempos encontrei casualmente um médico conhecido na praça em que, no meio de conversa perfeitamente circunstancial, me referiu que a classe médica está extremamente cansada pelo esforço contínuo desenvolvido desde há quase dois anos pelo combate na frente covid. Lembrei-me disto ao ler um belíssimo artigo do Prof. Varandas Fernandes no DN titulado O que falhou na resposta dos hospitais durante a pandemia.

Enquanto nos entretemos a ouvir os políticos falar exaustivamente no SNS, sempre cantando loas a todas as classes profissionais nele envolvidas, mas todos ‘puxando a brasa à sua sardinha’ quanto a soluções para uma crise bem visível ‘a olho nu’, vamo-nos esquecendo de ouvir os diretamente envolvidos, aqueles que estão realmente na frente diária de combate. 

No seu artigo, o Prof. Varandas Fernandes é cristalino nas palavras que utiliza, num raciocínio simples, mas duro e contundente. Não tem pruridos de afirmar que «assistimos ao colapso do SNS, com o acompanhamento dos utentes ser prejudicado pela diminuição das consultas presenciais, na capacidade de efetuar diagnósticos precoces, na resposta de doenças agudas e de acompanhamento de quem vive com doenças crónicas». Ainda acrescenta que «a descoberto ficam as doenças que são a principal causa de morte em Portugal».

A partir daqui, legitimamente invoca a urgência das soluções passarem pela audição dos diretamente envolvidos, o que me parece do mais elementar bom senso. Fez-me lembrar diversos trabalhos de consultoria em que participei em que múltiplas soluções provinham de quem estava diretamente envolvido nos problemas e que jamais eram ouvidos na sua resolução. 

Na semana em que vemos que o Hospital Beatriz Ângelo (Loures) saiu da esfera das PPP’s exclusivamente por preconceitos ideológicos da esquerda radical que nestas matérias se sobrepôs ao PS, estamos de facto conversados. Segundo uma auditoria do Tribunal de Contas, os custos dos tratamentos nas PPP’s são mais baixos que na esmagadora maioria dos hospitais públicos, pelo que estas decisões políticas de base ideológica custam milhões ao erário público, já sem considerar os graves impactos na própria vida dos cidadãos. 

A realidade é que o problema não está em ser público ou privado – está em servir os utentes com qualidade, ao menor/melhor custo. Garantem-me que o Hospital S. João no Porto é um modelo de gestão. Se assim é, replique-se nos outros a gestão deste HSJ. Se não conseguem, por falta de gestores habilitados, não se acabem com as PPP’s a não ser quando o Estado sair objetivamente lesado, o que está longe de ser a situação atual (segundo o Tribunal de Contas).

O PS de Mário Soares, Guterres ou Seguro, jamais cairia nesta cegueira ideológica. Costa, provável vencedor das eleições, com ou sem maioria absoluta, tem de sair da armadilha ideológica que o tolhe nas opções das decisões racionais e mais lógicas para Portugal em cada momento. Um sinal de esperança na atitude e mudança de Costa foi ter sido pragmático ao viajar para os Açores na Ryanair em vez de o fazer na TAP. Não se preocupou com a ideologia – resolveu conforme foi mais lógico e racional. Será que podemos ter esperança que também na Saúde assim o faça no futuro?

Já que falei na TAP, é curioso verificar que a sua privatização já nem sequer é questionada por Pedro Nuno Santos (PNS). Haja esperança! Após a aprovação pela DG Comp do seu plano de viabilização, com a convicção de que será rentável a longo prazo (quantos anos?), o cenário que de imediato se começou a colocar é o da inevitabilidade da integração num grupo de aviação (PNS dixit), descodificando, a privatização.

Gosto destes pragmatismos. Depois do afã de a nacionalizar quando tomou posse e após injetar (ou assumir compromissos) num total de Eur 3.7 MM, finalmente a dupla Costa/PNS caiu na realidade, extremamente dolorosa para os contribuintes portugueses, novamente reflexo de uma ideologia esquerdista. 

Sobra a discussão suscitada por Rio no seu debate com Costa – o do preço das viagens com escala versus viagens diretas. Como pressurosamente reivindicou a TAP, a realidade é que viagens diretas pagam um preço de comodidade e ganhos de tempo. Outro tema e altamente discutível, é saber se o prémio de ter uma viagem direta terá de ser três vezes o preço da viagem com escala, como sucede no exemplo concreto que Rio referiu.

Uma realidade é irrefutável: este prémio que o português paga por ir direto a Nova Iorque engloba o prejuízo que a TAP suporta para tentar encher o avião, praticando autênticos preços ‘de combate’ que os estrangeiros aproveitam, ao pagar significativamente menos numa viagem com escala, via o hub de Lisboa. 

Em suma, a TAP é a companhia de bandeira nacional, paga pelo contribuinte português. Faz sentido que, num caso destes, o mesmo contribuinte que por sinal precisa ou quer viajar, suporte o dumping de preços de viagens com escala que os estrangeiros obviamente aproveitam?