Adão e Silva esqueceu-se de Eanes

O ex-PR não esteve na sessão inaugural das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril. Só foi convidado na véspera e já tinha exames médicos programados. Marcelo telefonou-lhe.

O general e ex-Presidente da República António Ramalho Eanes, figura cimeira do 25 de Novembro de 1975, que marca o início do regime democrático em que Portugal vive hoje, foi o grande ausente da cerimónia inaugural das comemorações dos 50 anos do 25 de Abril de 1974, na quarta-feira, em Lisboa. O Nascer do SOL apurou que Ramalho Eanes ficou sentido por só ter sido convidado para a cerimónia já na parte da tarde da antevéspera da sua realização, ou seja, às 16h00 da passada terça-feira (apenas 25 horas antes do início daquele acontecimento).

Acontece que o ex-Presidente já tinha agendado há meses para esta quarta-feira um exame médico do foro gastroenterológico (uma colonoscopia), que implica uma preparação nos dias anteriores.

Desta forma, e uma vez que o telefonema dos serviços do Protocolo de Estado ocorreu apenas na véspera da cerimónia, Ramalho Eanes não pôde estar presente. O Nascer do SOL está em condições de avançar que o exame correu bem e não registou qualquer anomalia.

O desconforto evidente dos serviços do Protocolo de Estado pelo facto de o convite ao general ter sido feito tão em cima da hora, e a resposta do ex-chefe de Estado, levou a que o Presidente Marcelo, ao tomar conhecimento deste episódio, tenha imediatamente ligado a Ramalho Eanes, a lamentar o sucedido.

A falha de comunicação ter-se-á devido a um ‘lapso’ ou ‘esquecimento’ da Comissão dos 50 anos do 25 de Abril, a que Ramalho Eanes presidiu, a convite de Marcelo Rebelo de Sousa, e que ainda tem como comissário o próximo ministro da Cultura (do novo Governo de António Costa), Pedro Adão e Silva.

Recorde-se que Ramalho Eanes, em 23 de junho de 2021, solicitou a  Marcelo Rebelo de Sousa que o «desvinculasse» desse «compromisso» – como adiantou em comunicado em que também informava que «o Sr. Presidente da República gentilmente acedeu». No mesmo comunicado esclarecia que não publicitava as «razões» de tal pedido, em nome do «sigilo» que entende «ser devido às conversas com o Sr. Presidente da República».

Quem também não esteve presente no Pátio da Galé foi Cavaco Silva, também ele antigo Presidente da República e antigo primeiro-ministro de Portugal, que, sabe o Nascer do SOL, se encontrava em Évora, no Doutoramento Honoris Causa do Prof. Braga de Macedo, onde fez uma intervenção.

 

Um dia a mais

24 de março de 2022 foi a data em que Portugal atingiu um novo marco na sua história: 17.500 dias em Liberdade, mais um do que o tempo em que viveu baixo o regime do Estado Novo. Como tal, esta foi a data escolhida para dar o tiro de partida às comemorações dos 50 anos do 25 de Abril. Se bem que a data oficial em que a Democracia ultrapassou a Ditadura em longevidade foi na quinta-feira, a sessão solene que serviu para arrancar as celebrações do 25 de Abril decorreu na quarta-feira, no Pátio da Galé, em Lisboa. O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, condecorou 30 militares de Abril, num evento em que também António Costa, primeiro-ministro, e Eduardo Ferro Rodrigues, presidente da Assembleia da República, marcaram presença, com contundentes discursos. O palco pintou-se de vermelho e verde, ouviu-se o hino criado especificamente para este momento pelo compositor Bruno Pernadas, interpretado pela Orquestra Geração, Alice Neto de Sousa declamou Março, um poema dedicado a estas celebrações e, la pièce de résistance, fechou-se uma cápsula do tempo feita em cortiça, com diferentes elementos dentro, que só deverá ser aberta em 2074. Entre o ‘recheio’ desta cápsula encontram-se três cartas de três jovens portugueses, vencedores dos jovens que venceram o Prémio Nacional de Leitura do ano passado. Um dia solene para marcar uma data solene, e que deu arranque às celebrações que se vão estender até dezembro de 2026.

 

Mudanças

Mas afinal, o que mudou em 17.500 dias? Portugal já não é o país que era em 1974, nem socialmente, nem economicamente, e muito menos do ponto de vista legislativo e político. Em especial para quem não era, na altura, ‘chefe de família’. As mulheres foram o alvo de algumas das mais importantes mudanças que o fim do regime do Estado Novo trouxe, principalmente a nível das leis do país. Recorde-se, por exemplo, que, em 1973, o marido – ou ‘chefe de família’, termo entretanto extinto – tinha o direito a proibir a sua mulher de exercer uma profissão, caso assim o desejasse. O adultério da mulher, por sua vez, era punível com pena de prisão de 2 a 8 anos, quando hoje em dia esse ato não prevê qualquer punição legal. Mais, o ‘chefe de família’ eram quem controlava, na totalidade, os bens da mesma, incluindo aqueles que fossem da sua mulher.

Mas não só sobre as mulheres se fizeram as mudanças nos últimos 17.500 dias. Recorde-se, por exemplo, que em 1973 o número de eleitores inscritos era de apenas 1.8 milhões, ao passo que, em 2019, incluindo os eleitores dos círculos da Europa e Fora da Europa, contavam-se cerca de 10.8 milhões de eleitores portugueses inscritos.

 

Polémicas

No Pátio da Galé, Eduardo Ferro Rodrigues, António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa deixaram as suas palavras de alento e de análise destas comemorações, numa tarde que se revelou ‘tensa’ entre o Presidente da República e o primeiro-ministro, que tinham uma reunião marcada para analisar a lista de ministros que vão formar o próximo Governo e que acabou por ser cancelada.

Para as comemorações, que vão durar até 2026, Marcelo Rebelo de Sousa pede que sejam utilizadas para procurar respostas às «frustrações, desilusões, fragilidades e insuficiências» que o regime democrático não resolveu. «Sementes do futuro e não apenas revivalismo do passado», define o Presidente da República, que passou a listar tudo aquilo que esta celebração não deve ser.

«Afunilar, empobrecer ou excluir» são termos proibidos, pedindo Marcelo que se pense mais em  alargar e enriquecer. Perder de vista o futuro está também fora de questão, bem como ter «discussões de vaidades, protagonismos, que não dizem nada aos portugueses». Em tom conclusivo da sua lista de ‘exigências’, «o sucesso ou o fracasso da comemoração, ser uma