Vladimir Putin diz a Guterres que “não há operações militares em Mariupol”

Reunião entre o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, e o Presidente russo, Vladimir Putin, ficou marcada pelo líder do Kremlin confessar que a situação de Mariupol é uma “tragédia” e pela vontade de chegar a uma resolução “diplomática”. No entanto, Putin continua a defender que massacre de Bucha foi uma “encenação”.  

Criticado pela passividade durante a guerra na Ucrânia, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, visitou esta terça-feira a Rússia, onde se encontrou com o Presidente russo, Vladimir Putin, e o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov.

Durante a discussão entre Putin e Guterres, que aconteceu na longa mesa branca de seis metros onde o líder russo já recebeu personalidades como o Presidente francês, Emmanuel Macron, o responsável pelo Kremlin confessou que a situação em Mariupol é “trágica”, mas afirmou que as “operações militares já não estão a acontecer neste local”.

“A situação é complicada nesse local – e trágica. Mas é simples. Hoje falei com o Presidente (turco) Erdogan, e ele disse que as operações militares estavam ocorrendo lá. Não, as operações militares terminaram. Não há operações militares em Mariupol”, afirmou, defendendo ainda que os massacres em Bucha foram uma “encenação”.
“Houve uma provocação em Bucha, na qual o exército russo não teve nada a ver. Sabemos quem organizou esta provocação, através de quais meios e quais foram as pessoas que a realizaram”, acrescentou.

Estas afirmações de Putin chegam depois da Rússia ser acusada de atacar um dos corredores humanos utilizados em Mariupol. “Estamos a falar sobre os corredores humanitários russos, que eles dizem não estar a funcionar. Não, eles estão a mentir. Os corredores estão a trabalhar com o nosso sistema”, garantindo que “mais de 100 mil pessoas saíram de Mariupol e estão livres de ir a qualquer lado”.

Apesar das declarações de Putin, o conselheiro do presidente de Mariupol, Petro Andryushchenko, citado pelo Guardian, disse que nas últimas 24 horas, houve 35 ataques aéreos contra a fábrica de Azovstal, com um ataque a provocar um incêndio numa das oficinas onde os civis estavam escondidos, deixando alguns retidos sob os escombros.
O Presidente russo, que voltou a culpar a Ucrânia de “genocídio”, e mesmo depois de ter sido acusado por Guterres de “invadir” este país, afirmou que “espera conseguir um acordo através de um canal diplomático” enquanto a “operação militar” da Rússia continua em andamento.

O cessar-fogo e a criação de corredores humanos Na reunião com o ministro dos Negócios Estrageiros, o secretário-geral das Nações Unidas apelou a um cessar-fogo “o mais rápido possível”. 

“Estamos extremamente interessados em encontrar maneiras de criar as condições para um diálogo efetivo, para um cessar-fogo o mais rápido possível e para uma solução pacífica”, disse António Guterres antes da reunião com Lavrov, citado pela Reuters.

Uma das sugestões de Guterres passou pela criação de corredores humanitários que permitam a evacuação em segurança dos cidadãos ucranianos, nomeadamente em Mariupol. “A minha proposta é garantir um esforço conjunto de Ucrânia, Rússia, Cruz Vermelha Internacional e ONU para a evacuação de civis de Mariupol em qualquer direção que eles escolham”, disse o secretário-geral, durante uma conferência de imprensa, onde Lavrov também marcou presença, acrescentando que está pronto para mobilizar recursos para esta região destroçada pelo conflito armado.

“As Nações Unidas estão prontas para mobilizar totalmente os seus recursos humanos e logísticos para ajudar a salvar vidas em Mariupol”, disse, propondo um trabalho coordenado com a Cruz Vermelha para permitir que os cidadãos que se encontram dentro da fábrica siderúrgica Azovstal, o último bastião de resistência ucraniana, consigam abandonar este local sem perigo. Segundo Guterres, Putin permitiu a evacuação dos cidadãos através desta “aliança”.

O ministro dos Negócios Estrangeiros russo disse que a Rússia poderia estar disposta a um cessar-fogo e à abertura de corredores humanitárias, mas deixou um aviso. “Se continuarem a enviar armamento para a Ucrânia, vai ser difícil fazer um acordo”, disse Lavrov.

Outra questão que o ministro quis deixar claro foi a rejeição de mediadores internacionais, nesta fase, nas negociações com a Ucrânia, citando dificuldades com a delegação do país que está a ser invadido. 

“Olhando para a forma como a delegação ucraniana se comportou nas negociações, como o Presidente Zelensky se comportou… Claro que é frustrante. Aparentemente, as negociações não lhes interessam particularmente”, acrescentou.

Falhanço na criação de corredores humanitários Apesar da insistência de Guterres para a criação de corredores humanitários, esta terça-feira, não foi criada nenhuma destas rotas, um falhanço que, levou a vice-primeira-ministra ucraniana, a afirmar que nem “sequer faz sentido existir as Nações Unidas”. 

A atuação das Nações Unidas e do seu secretário-geral em relação à invasão russa na Ucrânia tem sido bastante contestada, com o Presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky a considerar “ilógico”, o facto de o secretário-geral se reunir primeiro com Putin e só depois se dirigir para a Ucrânia.

Na semana passada, mais de 200 antigos dirigentes da ONU dirigiram uma carta a António Guterres, com um apelo para que seja mais proativo em relação a esse conflito.

Os signatários alertaram que, a menos que Guterres atue de forma mais pessoal para assumir a liderança na tentativa de mediar a paz na Ucrânia, as Nações Unidas arriscam não apenas a irrelevância, mas a sua própria existência.
Depois da visita à Rússia, Guterres segue agora para a Ucrânia onde, esta quarta-feira, se irá reunir com o Presidente Zelensky.

Transnístria anuncia novo atentado O Conselho de Segurança da república separatista pró-russa da Transnístria, entre a Moldávia e a Ucrânia, disse que se registou esta terça-feira um “terceiro atentado” no território separatista, em menos de 24 horas.

“Houve três ataques terroristas em Pridnestrovie (Transnístria). Dispararam lança granadas contra o edifício do Ministério da Segurança do Estado, houve duas explosões no centro de radiotelevisão em Maiak e também atacaram uma unidade militar em Parcani”, disse o serviço de imprensa do Presidente da região separatista, Vadim Krasnoelski, através da rede social Telegram.

As autoridades locais não forneceram mais detalhes sobre o ataque contra a unidade militar em Parcani, não confirmado até ao momento por fontes independentes. 

O líder do enclave separatista realizou uma reunião do Conselho de Segurança em que decidiu “reforçar as medidas de segurança”.

O Conselho da Europa considera a situação da Transnístria um “conflito congelado”, termo militar que descreve a situação em que após uma crise ou guerra, o conflito encontra-se latente.

Especialistas afirmam que a Rússia pretende envolver a Transnístria, que tem cerca de 1500 soldados, na invasão à Ucrânia. Caso Putin leva esta decisão para a frente a região terá pouca “margem de manobra para rejeitar”, tal como escreve o Al Jazeera, uma vez que é “economicamente dependente” da Rússia, que lhes oferece gás sem qualquer tipo de custo.