Quanto CO2 pode ser absorvido pelas florestas de algas portuguesas?

Portugal pode vir a ser um dos primeiros países a ter um mercado de “carbono azul”. É a expectativa da Fundação Calouste Gulbenkian.

Nove áreas da costa de Portugal continental com elevado potencial de sequestro de carbono da atmosfera, pelos ecossistemas marinhos ali encontrados, vão ser mapeadas pela primeira vez num projeto que será lançado esta quarta-feira – Dia Mundial dos Oceanos – pela Fundação Calouste Gulbenkian, em parceria com o Centro de Ciências do Mar (CCMAR) da Universidade do Algarve e a ANP | WWF – Associação Natureza Portugal. O objetivo é perceber o estado de sapais, florestas de algas e pradarias marinhas e, em condições ótimas, quanto CO2 conseguem absorver da atmosfera, bem como que intervenções são necessárias para poderem ter esse papel de mitigação das emissões humanas.

Filipa Saldanha, diretora-adjunta do Programa Gulbenkian Desenvolvimento Sustentável, explica ao i que a identificação das nove áreas está feita, mas o trabalho que será desenvolvido ao longo dos próximos meses vai permitir quantificar exatamente que CO2 pode ser capturado e armazenado num ano por estes ecossistemas marinhos e costeiros, o chamado “carbono azul”. “Neste momento, não sabemos, o que sabemos é que os ecossistemas marinhos têm um potencial de sequestro de carbono oito vezes superior ao das florestas em terra, mas em alguns casos pode ser 18 vezes superior”, diz a responsável.

O Parque Natural da Ria Formosa, a Reserva Natural de Castro Marim, o estuário do Rio Arade, a Ria de Alvor, o Estuário do Mira, as reservas do estuário do Sado e do Tejo, a Ria de Aveiro e a Lagoa de Óbidos são as áreas que vão ser passadas a pente fino, com os primeiros resultados esperados em outubro/novembro. “Por exemplo na Lagoa de Óbidos, vamos dizer exatamente em que área é que está determinado ecossistema, caracterizar o seu estado e com isso serão desenhadas medidas de intervenção, de proteção ou de restauro. Ações que vão ter um custo associado e que, mais à frente, nos vão permitir quantificar o crédito de carbono de quem quiser investir na sua conservação, para compensar a sua pegada ambiental”.

Esta será já a segunda fase do projeto. A expectativa, diz Filipa Saldanha, é que Portugal possa vir a ser um dos primeiros países a ter um mercado de carbono azul e que as instituições e empresas, quando apresentam em março/abril de cada ano os seus relatórios de sustentabilidade ambiental, passem a ter um leque de intervenções em ecossistemas marinhos em Portugal em que possam investir o valor equivalente à sua pegada ambiental.

A Gulbenkian fará o primeiro investimento na futura carteira de carbono azul, para compensar pegada carbónica não mitigável da fundação em 2021 (2.238 toneladas de dióxido de carbono equivalente). “Só depois do levantamento poderemos saber o investimento que vai estar em causa, mas temos a garantia do conselho de administração que poderemos gastar o suficiente para compensar a nossa pegada”, assegura Filipa Saldanha, explicando que este será também um investimento ”piloto”, para se perceber como se passa do investimento à intervenção no terreno e como avaliar resultados.

“Numa terceira fase, queremos escalar o projeto e advogar pela constituição de um mercado de carbono azul em Portugal. Atualmente não existe nenhum mercado de voluntário de carbono em Portugal, nem azul nem verde (mitigação em terra), mas é muito difícil investir no azul, porque está sob o domínio público. Hoje já é fácil uma empresa chegar ao final do ano, ver que tem uma pegada x e contratar uma associação privada que tenha um projeto de agricultura sustentável ou de reflorestação e compensar diretamente as suas emissões. Neste caso, temos entidades públicas que são responsáveis por estas áreas marinhas e costeiras e por isso queremos envolver todas as entidades na dependência do Ministério da Agricultura e do Mar e do Ambiente para que possamos avançar com regras do jogo bem definidas”, diz Filipa Saldanha.

A responsável acredita que olhar para as áreas costeiras poderá permitir antecipar as metas de neutralidade carbónica do país, já que não foram incluídas no roteiro nacional, tendo sido incluídos já no ano passado na Lei de Bases do Clima. “Um dos artigos diz explicitamente isso, por isso com este projeto conseguimos pôr o oceano com mais destaque na agenda climática”. Depois do pontapé de saída hoje, o projeto Gulbenkian Carbono Azul vai ser apresentado ao público durante a Conferência do Oceano das Nações Unidas, que vai decorrer em Lisboa entre 27 de junho e 1 de julho.