Mike Tyson: dos dias de lutas e glórias à paz da prisão

Aos 56 anos mantém-se como uma das figuras incontornáveis do universo desportivo e as suas declarações continuam a ter repercussões a nível mundial. Da paixão pelos pombos ao veneno de sapo, ‘Iron’ Mike revela agora que viveu os melhores anos da sua vida na prisão, onde encontrou a tão desejada paz que procurava.

Eu tive os três melhores anos da minha vida na prisão». A frase é da autoria de Mike Tyson e deixou os entrevistadores admirados. – «É interessante dizer isso, porque tinha milhões…», comentou um deles em jeito de resposta. A conversa continuou.

– «Mas eu tinha paz lá», reforçou Tyson.

– «Mesmo ganhando 30 milhões de dólares por luta?». 

Tyson esclarece: «Escuta, posso dizer-te uma coisa? Isso não significa nada se não tiveres a tua paz, a tua estabilidade, o teu equilíbrio. Precisas da tua sanidade para controlares qualquer parte da vida. Digo sempre às pessoas: ‘Deus castiga-te dando tudo o que tu queres para ver se consegues lidar com isso». 

São apenas 30 segundos de uma entrevista com mais de uma hora àquele que continua a ser considerado por muitos o maior pugilista de todos os tempos. 

A lenda do boxe, de 56 anos, foi o convidado especial do último episódio do The Pivot Podcast, partilhado nos últimos dias, e falou da sua vida e carreira, numa altura em que se assinalam 25 anos do célebre duelo de Las Vegas, onde Tyson arrancou parte da orelha do adversário Evander Holyfield.

Um pombo na origem de um lutador
Michael Gerald Tyson nasceu em 1966, em Brooklyn, Nova Iorque, e a sua infância desde cedo ficou marcada pelo abandono do pai, que saiu de casa quando o pequeno Mike tinha apenas dois anos de idade. Antes de se tornar num dos nomes mais importantes da modalidade, iniciou carreira nas ruas, com lutas e rixas frequentes a servirem de estágios ao futuro que cedo se previu para ele. Na altura de recordar o primeiro conflito, Tyson viaja até ao momento em que reagiu após terem matado o seu pombo. «O tipo matou o meu pombo e acabou. Essa foi a primeira luta da minha vida. Por causa de um pombo», referiu durante a conversa, admitindo que tinha ganas de «esmagar o mundo aos seus pés». «Eu tenho um buraco profundo em mim. Eu tinha que ter tudo», acrescentou, antes de relembrar a juventude difícil pela qual também atravessou: «Quando era jovem, eu era desequilibrado. Era sempre tudo ou nada». 

A verdade é que a paixão do pugilista norte-americanos por pombos é bem conhecida. Em 2011, no reality show Cara a Cara com Mike Tyson, o próprio lutador confessava que a «primeira coisa que amei na vida foi um pombo». «E sinto-me até ridículo ao tentar explicar a razão disso», comentava já na altura, o que também pode ajudar a explicar a reação mais agressiva que espoletou o seu primeiro duelo. 

Rapaz conflituoso e problemático, tinha 11 anos quando acabou encaminhado para um estabelecimento de educação para menores delinquentes e foi durante esta fase que lhe foi feita a introdução ao boxe, motivado pelo diretor da instituição e antigo pugilista. É importante ter a perceção  de que falávamos de um pré-adolescente com 80kg e um físico absolutamente fora do normal se comparado com os restantes colegas da sua faixa etária.    

O resto da história de glória dentro dos ringues é bem conhecida e os números são inequívocos: ‘Iron’ Mike tem 50 vitórias em toda a sua carreira, entre elas, 44 por knockout e só 6 derrotas. Aos 20 anos era o mais jovem campeão do Mundo de boxe e chegou a ter os três principais títulos de n.º 1 em simultâneo: título mundial de pesos pesados da Confederação Mundial de Boxe (WBC) e os títulos mundiais da Federação Internacional de Boxe e da Associação Mundial de Boxe.

Mas se o reformatório onde passou parte da pré-adolescência teve grande influência nos êxitos alcançados, Tyson, também conhecido por Kid Dynamite, desde cedo admitiu que a a morte da sua mãe foi como combustível para o seu sucesso profissional.

«A morte da minha mãe foi uma das melhores coisas que me aconteceu porque ela tratava-me como um bebé. Com ela, eu nunca teria entrado em brigas na rua nem nunca me teria defendido», desabafou em tempos o atleta que aos 16 anos ficou entregue aos cuidados do treinador Cus D’Amato, logo após a morte da sua mãe (1982).

Mike Tyson foi eleito para o International Boxing Hall of Fame – fundado em 1989, com o objetivo de salvaguardar na história do boxe os nomes dos maiores pugilistas de todos os tempos – em 2011.
 Das lutas com gorilas à prisão

Mas os dias de glória foram sempre acompanhados por dias de luta e o nome de Mike Tyson fez também correr muita tinta devido â personalidade excêntrica e controversa.

Os problemas, como já deu para entender, começaram desde cedo e logo na década de 1980 aconteceria uma das histórias mais caricatas relacionada com o ex-pugilista. O próprio admitiu que tentou subornar um segurança do jardim zoológico em Nova Iorque com 10 mil dólares para este lhe conceder acesso à jaula e poder lutar com um… gorila. O momento aconteceu durante um passeio com a então mulher do lutador, a modelo e atriz Robien Gives, que pediu o divórcio pouco tempo depois de terem subido ao altar por considerar Tyson ‘maníaco-depressivo’.

Em 1991 fez parte do júri do concurso Miss América. Foi acusado de violação por parte da modelo Desiree Washington e foi condenado imediatamente a seguir a seis anos de prisão.

Cumpriu metade da pena por bom comportamento e durante este período converteu-se ao islamismo, adotando o nome de fé Malek Abdul Aziz. 

Regressou à competição e, em junho de 1997, defrontou o campeão mundial Evander Holyfield para aquele que chegou a ser denominado combate do século. Tyson acabaria por arrancar um pedaço da orelha do adversário à dentada, num dos mais recordados combates de sempre da sua carreira. Em 2020, Tyson falou mais uma vez sobre o episódio e admitiu que «queria matar» o adversário. «Voltaria a fazê-lo, sim. Mordi-o porque queria matá-lo. Estava muito chateado porque ele me deu vários golpes na cabeça e tirou-me da luta. A bem ou a mal, não vou deixar que alguém me tire a glória», assegurou. Depois do sucedido há 25 anos, Tyson foi banido da competição e, apesar de ainda ter reaparecido nos ringues após cumprido o castigo, já se mostrava longe da forma física que acostumou os fãs da modalidade. Ainda assim, a cada anúncio de um eventual regresso, Tyson recebia um aplauso e uma vénia dos seguidores. Não foi por acaso que também ficou apelidado de The Baddest Man on the Planet, ou seja o Homem mais Temido do Mundo. 

Mike Tyson viria a declarar falência aos 37 anos, depois de ganhar mais de 300 milhões de dólares em lutas. 
Nos últimos anos continua a dar que falar pelas declarações mais ou menos polémicas e, ainda antes de ter revelado que viveu os melhores três anos da sua vida atrás das grades, por lá ter conseguido encontrar paz, também recentemente havia partilhado um dos segredos que fez com que a sua vida melhorasse substancialmente. Nada mais nada menos do que… veneno de sapo. O ex-lutador revelou que nos últimos quatro anos tem consumido veneno de um sapo do Deserto de Sonora, no México, e admitiu que este hábito lhe trouxe vários benefícios. «Fi-lo como um desafio. Estava a usar drogas pesadas como cocaína, então por que não? É outra dimensão. Antes disto estava um caco. O adversário mais difícil que já enfrentei fui eu mesmo. Tinha baixa autoestima, algo que costuma acontecer com pessoas que têm grandes egos. Mas isto tira-te o ego», afirmou ao The New York Post em novembro de 2021. «As pessoas veem como mudei. A minha mente não entende o que se passou, mas a minha vida melhorou por completo. O único objetivo do sapo é que alcances o teu potencial máximo e vejas o mundo de outra maneira, que somos todos iguais e tudo é amor». Palavras de campeão.