Vitória moral

 A acreditar no voto de confiança dado aos governos socialistas nos últimos anos, os portugueses parecem acreditar que estamos a ganhar.

Por Pedro Ramos 

Nova Iorque, julho 2022

«When you’re Singapore and your existence depends on performance – extraordinary performance, better than your competitors – when that performance disappears because the system on which it’s been based becomes eroded, then you’ve lost everything…». 

Lee Kuan Yew, primeiro-ministro de Singapura 1959-1990

«To get Rich is Glorious».

Deng Xiaoping, Líder da República Popular da China 1978-1992

«Aquilo que esta crise demonstra é que precisamos de um Estado Social forte».

António Costa, primeiro-ministro de Portugal 

Queridas Filhas,

Muitas vezes me ouviram dizer que a palavra saudade é de difícil tradução em outras línguas. Algo que mostra quão única a cultura e experiência portuguesas são. Outra expressão muito portuguesa, apesar de ser utilizada noutros países, é a ‘Vitória Moral’. Trata-se de encontrar atenuantes, explicações, e racionalizações que nos fazem sentir bem com o não atingir dos objetivos a que nos tínhamos proposto.

Ninguém gosta de perder. Ninguém gosta de estar numa equipa que perde. Em futebol, os media e os dirigentes muitas vezes culpam os árbitros ou mesmo o ‘sistema’ quando as coisas não correm bem. Várias vezes em competições internacionais, em jogos em que somos eliminados, a nossa seleção parece mais preocupada em discutir com os árbitros e acumular amarelos do que em ganhar o jogo. Um selecionador saiu do relvado a dizer que havia ‘porcaria’ na federação. Acredita-se que se se controlar a narrativa mediática, então nada se perde. Temos uma ‘Vitória Moral’…

O campo do desporto não é muito relevante para o bem-estar das populações. Embora em Portugal, muita da cultura de trabalho e competição, e até mesmo alguma autoestima, advém dai. Note-se a quantidade de receções pelo Governo e Presidente da República de qualquer português que tenha um sucesso desportivo. 

O sucesso económico, esse afeta o bolso de todos. Assim como a educação que podemos oferecer, a saúde a que podemos aspirar e as carreiras com que podemos sonhar. A acreditar no voto de confiança dado aos governos socialistas nos últimos anos, os portugueses parecem acreditar que estamos a ganhar. Mas o que diz o marcador? Vejamos a Figura 1 (escala logarítmica em que retas equivalem a taxas de crescimento % constantes)

Em 1980 Portugal tinha uma produção per capita semelhante à Singapura e várias ordens de grandeza superior à Polónia que nessa altura tinha uma economia de subsistência como parte da União Soviética. Desde então a Polónia e a Singapura cresceram rapidamente. Portugal acompanhou esse ritmo na década de 1980, mas tem-se atrasado desde 1990. De tal forma que a Polónia está próxima de nos apanhar, e talvez até ultrapassar. Repare-se na estagnação de Portugal nos últimos 10 anos.

Com estes fatos, só mesmo vitórias morais nos podem consolar. Como membro da geração responsável por estes resultados eu sinto vergonha de vos deixar este legado. Felizmente, ainda estamos no intervalo. E não vale a pena queixar do penalty que não foi marcado. Quer a Polónia quer a Singapura mostraram o que se pode atingir numa geração, com ambição, trabalho e humildade. 

Está na hora de jogar a segunda parte. Eu ainda tenho pelo menos 30 anos de carreira pela frente até o treinador me substituir. Vamos dar a volta ao resultado? Eu acredito que sim, mas não com a tática dos últimos 30 anos. Quem sabe ainda apanhamos um treinador como o Lee Kuan Yew.