Mário Ferreira vai-se tornar o primeiro turista espacial português. O voo está marcado para hoje (para as 14h30 de Portugal) e vai durar cerca de 10 minutos. A partir do Texas e, se seguir o exemplo dos outros voos, os tripulantes vão passar a barreira que separa o limite da atmosfera terrestre e o espaço, sentindo a microgravidade. O empresário de 54 anos vai estar acompanhado por mais cinco tripulantes: a engenheira egípcia Sara Sabry, a alpinista anglo-americana Vanessa O’Brien, o cofundador do canal desportivo do YouTube Dude Perfect Coby Cotton e o ex-executivo do setor das telecomunicações Steve Young e o especialista em tecnologia Clint Kelly III.
Este é o sexto voo suborbital da Blue Origin, empresa aeroespacial dirigida pelo norte-americano Jeff Bezos – fundador da Amazon e que, de acordo com a Forbes, a fortuna está avaliada em 171 mil milhões de dólares (mais de 168 mil milhões de euros) – que em 20 de julho de 2021 apostou nas viagens espaciais.
Nas redes sociais, o empresário português tem feito o relato do dia de treinos que tem realizado. Ontem disse apenas que foram 13 horas de treinos, “uma repetição para memorizar pequenos detalhes”. Mas no dia anterior desenvolveu, um pouco mais, a experiência: “Foi um dia de teoria sobre segurança, de ajustes do fato e roupa a levar no dia da missão Shepard 22. Visitámos o centro de treinos, iniciámos o ajuste das cadeiras que cada um terá e já encontrámos o nosso locker room. Foi o dia de verificação de peso e verificação de saúde em geral. Foi fechada a caixa de material que podemos levar até ao espaço dentro da nossa cápsula, muitos objetos, pequenos, pessoais e de familiares, assim como quatro bandeiras”.
Mas é aí que refere a grande surpresa: “Conseguir autorização para levar ao espaço uma garrafa de vinho do Porto Vintage de 50 cl, com rolha de cortiça, vamos ver como se vai comportar o vinho sujeito a grandes forças G e ausência de gravidade. Os parceiros de viagem são todos muito divertidos e motivados para este voo, em especial o Coby com quem passei grande parte da tarde a treinar, seremos os dois autorizados a levar câmaras para recolher fotografias e vídeo no espaço, também requer autorização e treino específico… longo e interessante dia”.
Já no início deste mês, a empresa tinha garantido que havia um português entre o grupo de pessoas que pagaram para poder realizar uma viagem de apenas 10 minutos, ou seja, o suficiente para lhe dar o estatuto de astronauta. Não é revelado o preço que foi pago pelo empresário, mas há quem tenha avançado que o voo pode custar entre 200 mil e 300 mil dólares (195 mil a 293 mil euros).
Há mais de dez anos que o dono da TVI e CEO da Douro Azul comprou uma viagem espacial. Nessa altura tinha comprado o voo através da Virgin Galactic, concorrente da Blue Origin. No entanto, os atrasos no desenvolvimento dos aparelhos da empresa de Richard Branson fizeram Mário Ferreira mudar de ideias. O multimilionário britânico Richard Branson, acabou por experimentar a 11 de julho do ano passado a microgravidade, num voo igualmente suborbital a bordo do avião VSS Unity.
A Virgin Galactic, no entanto, esperava arrancar com as viagens comerciais já este ano, em que uma viagem de 90 minutos poderá custar 450 mil dólares (440 mil euros).
O astrónomo Miguel Gonçalves explica que Mário Ferreira será o primeiro português a conhecer a altitude acima dos 100 km, “o que faz do próprio turista e não um astronauta, sem que haja qualquer sentido pejorativo em tal qualificação”. E garante que quem tem acompanhado as suas posições sobre o turismo espacial percebe que não tem “qualquer posição dogmática, ferrenha ou moralista/capitalista sobre tal atividade comercial”, referindo que “é uma oferta turística como outra qualquer, tabelada nos seus preços, com vantagens e riscos”. E acrescenta: “Como bem nos conta a história da tecnologia, serão sempre os mais recheados financeiramente a colherem os frutos de tal revolução mas para fazer crescer tal indústria será preciso alargar o ‘funil’ de potenciais clientes”. Mas para isso lembra que “isso só se faz com preços e serviços cada vez mais acessíveis”, referindo que “não tem a mínima dúvida que isso venha a acontecer”.
E para o astrónomo não há margem para dúvidas: “Um acesso mais rápido, fácil e acessível às condições de microgravidade é um passo fundamental para mais e melhores investigações em tantas áreas fundamentais para a evolução e conforto da humanidade – desde a medicina à engenharia dos materiais. Sem o sabermos, muito provavelmente todos já usufruímos de utensílios ou técnicas que nos ajudaram e nasceram nesses contextos espaciais”, daí defender que “todo e qualquer passo para construir autoestradas ‘lá para cima’ é benéfico. E se há um português que tem a possibilidade de ver a fragilidade e beleza do nosso planeta sob um outro ponto de vista então só posso sentir aquilo que os russos definem como ‘inveja branca’: inveja por não ser eu no seu lugar mas branca porque, não sendo eu, então que seja um outro português. E desejo que cumpra aquilo que me pareceu dar a entender de que também vai investir na área da indústria aeroespacial”.