Empresas pensam em aumentar salários em 2,8% em 2023 mas fica aquém da inflação

Cenário de incerteza também está a comprometer recrutamento. Se este ano cerca de 43% admitiu estar a pensar em reforçar as suas equipas, o valor desce para 31% em relação às perspetivas do próximo ano.

A previsão média de aumentos salariais de 2,8% para 2023 supera em 0,5% o que tinha sido perspetivado em 2021, mas revela-se insuficiente para acompanhar a escalada da inflação. As contas são feitas por um estudo realizado pela Mercer. ”Apesar de se observar um aumento, este é insuficiente para acompanhar a escalada da inflação, podendo traduzir-se numa perda de poder de compra para os colaboradores”, diz ao i Marta Dias, rewards leader da consultora.

Mas dá uma justificação para esta tendência: “As empresas também estão ainda um pouco cautelosas naquilo que é a sua análise do crescimento da inflação”, lembrando que “temos tido historicamente taxas de inflação baixas, uma tendência que tem mudado nos últimos dez meses e, face a isso, as empresas estão um bocadinho expectantes sobre o que vai ser o futuro, ou seja, não sabem se irá se manter nos próximos meses ou se irá se esbater no próximo ano, o que faz com que haja alguma cautela nestas decisões”.

De acordo com os resultados do estudo, uma grande parte das organizações (83%) realiza uma revisão salarial anual. A segunda tendência mais comum é revisão salarial sem períodos estabelecidos, feita por 10% das entidades inquiridas. As restantes empresas fazem-na duas vezes (5%) ou três ou mais vezes por ano (2%). Os meses preferenciais para a revisão salarial são janeiro, abril e março (29%, 15% e 13% respetivamente).

 

Cautela na contratação

Este cenário faz com que também haja alguma cautela no que toca à contratação. De acordo com o estudo da Mercer, cerca de 43% das empresas admitiu reforçar o seu número de colaboradores ainda este ano, mas apenas 31% assumem, para já, manter esse crescimento para 2023. Por outro lado, enquanto 9% das organizações demonstrou intenção de reduzir o número de colaboradores em 2022, a percentagem diminui ligeiramente, para 6%, em 2023. Verifica-se ainda um maior nível de incerteza face ao próximo ano, uma vez que cerca de um terço (34%) das organizações admite que ainda não decidiu se pretende alterar o número de colaboradores.

De acordo com a responsável, o mercado de trabalho continua dinâmico e, como tal, admite que as empresas continuam a manifestar uma vontade de rotatividade, particularmente em algumas áreas, mas também aqui há dificuldade em reter trabalhadores, como é o caso das áreas de engenharia e de tecnologias de informação. “Vemos o setor das tecnologias de informação que têm vindo a instalar-se e a crescer no nosso país que continuam a recrutar ativamente, mas nem sempre conseguem reter os seus colaboradores”, diz a responsável ao nosso jornal. Daí, o estudo admitir que 53% das empresas sentirem dificuldade em reter profissionais, “em que os salários em geral aumentaram face ao ano anterior e a situação macroeconómica parece não transmitir às organizações confiança para planear e assumir o crescimento a médio prazo”.

Já quando questionada em relação à dificuldade de reter trabalhadores, Marta Dias esclarece que isso não significa necessariamente que optem por sair do país. “O mercado nacional tem muita oferta”, lembrando que o trabalho remoto também veio alimentar a possibilidade de os trabalhadores poderem estar em Portugal e trabalhar para organizações internacionais”.

E afirma que a pandemia “ensinou-nos” que a produtividade não decresceu pelo facto de os trabalhar adores estarem a a trabalhar remotamente. “Um dos resultados de um estudo que fizemos no ano passado é que as empresas não identificam que a produtividade das suas pessoas ou o desempenho das suas pessoas tenha diminuído pelo facto de estarem a trabalhar com formato mais flexível ou formato mais remoto”, e daí acreditar que há “uma maior predisposição e um maior à vontade das empresas em adotar este tipo de formatos e de soluções até para responderem à expectativa dos seus colaboradores”.

Marta Dias diz mesmo que, quando um colaborador começa a analisar a possibilidade de mudar de trabalho à parte das questões da compensação, um dos fatores que surgem no top três é a questão da flexibilidade. “Esta questão surge pela primeira vez, mas é um fator cada vez mais valorizado pelos colaboradores na hora de decidir em aceitar ou não um novo desafio”, diz ao i.

 

Incentivos ditam escolhas

De acordo com o mesmo estudo, 88% das empresas atribui formas de remuneração variável (bónus) à totalidade ou a parte da sua estrutura, maioritariamente de acordo com uma periodicidade anual. A prevalência deste incentivo vai diminuindo à medida que vamos analisando grupos com níveis de responsabilidade menores. A maioria das empresas (62%) concede incentivos relacionados com as vendas dos seus colaboradores. Estes incentivos de vendas são maioritariamente atribuídos com uma periodicidade anual ou trimestral.

E à semelhança dos anos anteriores, os incentivos de longo prazo são menos praticados, sendo apenas atribuídos por 32% das empresas. Entre os principais benefícios que as empresas oferecem aos seus colaboradores passam por: plano médico (90% das empresas), sendo que destas, 70% abrange a cobertura do plano ao cônjuge e filhos dos colaboradores; política automóvel (88%); seguro de vida (cerca de 70%). Já o plano de pensões, complemento de subsídio de doença e o seguro de acidentes pessoais são menos comuns, atribuídos por 35%, 38% e 39% das empresas, respetivamente.

“São incentivos maioritariamente ligados ao resultado da organização e ao desempenho do próprio colaborador. Tipicamente, são estas as duas componentes que entram aqui na equação para calcular os incentivos ou a remuneração variável a pagar aos colaboradores”, garante a responsável, referindo que “ainda que podem servir como uma das alavancas em termos de retenção. Não só na ótica do curto prazo, porque o bónus refere-se tipicamente a um ano de performance, mas também na ótica de longo prazo, porque são estes que definem os objetivos, num prazo, de três anos, o poderá representar uma ferramenta de retenção para as organizações

A responsável admite que esta prática de incentivos não está generalizada, mas tem vindo a ganhar terreno. “É uma prática que começa a ganhar cada vez mais maior relevância pelo papel que pode ter na componente de retenção e, por isso, é natural, que haja cada vez mais olhares interessados nesta componente”. Trata-se de algo que está ser implementado por organizações que estão num estado mais maduro, o que “não significa que sejam necessariamente multinacionais”.