O crescimento e o futuro do país

Nestes seis meses, assistimos à sucessão de casos e polémicas envolvendo ministros e o primeiro-ministro, e à falta de estratégia, de reformas, e de ambição de dar um melhor nível de vida aos portugueses.

Luís Filipe Pereira
Gestor e ex-ministro da Saúde

São numerosos os indicadores que documentam a estagnação da economia portuguesa, nos últimos 20 anos, e consequentemente o constante e progressivo atraso de Portugal face aos países da UE (União Europeia) e nomeadamente em relação aos países saídos da ex-União Soviética, em condições de pobreza e de atraso económico e social.

Em 2002, Portugal detinha a 15ª posição, em termos de PIB per capita (pc), na UE e, em 2021, desceu para a 21.ª posição (dados do Eurostat).

Em 2000, Portugal tinha atrás de si (em termos de PIB pc) os 10 países do ex-Bloco do Leste e, em 2020, quatro desses países já nos ultrapassaram e mais quatro estão em vias de o fazer (fonte: World Bank).

Esta tendência de atraso relativo do país acentuou-se desde a tomada de posse do Governo socialista em 2015, pois neste ano o PIB pc português representava 78% da média da União Europeia e, em 2021, desceu para 74% (dados do Eurostat).

Estes indicadores provam o atraso relativo do país apesar dos responsáveis políticos do PS continuarem a afirmar que Portugal cresce acima da média europeia.

É certo que se estima que o crescimento económico para este ano de 2022 seja de cerca de 6% o que se deve à reacção à elevada quebra do PIB verificada no período da pandemia (de que recuperamos mais tardiamente do que a grande parte dos países europeus) mas a previsão para 2023 é a de um retorno ao crescimento medíocre, à volta de 1%, e isto se não forem confirmados os receios de uma possível e próxima recessão motivada pelas crises energética e alimentar, resultantes da guerra na Ucrânia, e pelas politicas monetárias restritivas dos Bancos Centrais (em especial do FED americano e do BCE (Banco Central Europeu) como forma de combater os mais elevados níveis de inflação de há 40 anos.

Esta situação de atraso do país, que não pode ser negada, significa a manutenção de condições de vida cada vez mais difíceis para grande parte da população portuguesa, (agora ainda mais agravadas pelas crises energética e alimentar) em especial, a mais desfavorecida e vulnerável, condenada a baixos salários e baixas pensões com perpetuação da pobreza (que se estima atingir hoje cerca de 25% dos portugueses) e levando à emigração dos mais qualificados e dos mais jovens.

Um estudo recente da Fundação Francisco Manuel dos Santos, ‘Os Jovens em Portugal, Hoje’ relativo aos jovens, entre 15 e 34 anos, revela que 72% recebem menos de 950 euros líquidos mensais (e 30% querem emigrar se surgir uma boa oportunidade) ao mesmo tempo que o salário mínimo nacional, em percentagem do salário médio, é agora de 63% quando em 2014 era de 53% (fonte: Pordata e INE)

Este atraso de Portugal não é uma fatalidade e pode e deve ser combatido por politicas públicas que favoreçam o crescimento e por uma estratégia de desenvolvimento que possa mobilizar a sociedade portuguesa e que passa inevitavelmente por reformas profundas nas várias áreas:

– na economia através de um modelo económico assente no setor privado, (e não no setor público que recebeu a maior parte dos fundos europeus no PRR – Plano de Recuperação e Resiliência), no investimento nos setores de bens transacionáveis, no aumento das exportações e com medidas que aumentem a competitividade e produtividade da economia portuguesa;

– na justiça, com o objetivo fundamental de aumentar a rapidez das decisões judiciais e encurtar drasticamente o tempo de resolução dos processos, essencial para as famílias e empresas;

– na educação, para uma maior e melhor qualificação dos recursos humanos (em 2021, 41% da população portuguesa não possuía o ensino secundário, o nível mais baixo da EU);

– na saúde, para dar resposta aos problemas estruturais de acesso ao SNS e para melhorar a resposta às necessidades da população (hoje temos mais pessoas em listas de espera, sem médico de família e crises na urgência dos hospitais, apesar de nos últimos 4 anos o SNS ter aumentado em cerca de 20.000 o número de profissionais e ter mais cerca de 3.000 mil milhões de euros);

– na segurança social, para assegurar a sustentabilidade do sistema de pensões;

– na fiscalidade, para a diminuição da carga fiscal das empresas e das famílias (temos das maiores cargas fiscais da EU com piores serviços públicos);

– no sistema politico e eleitoral, para a escolha pelos eleitores dos seus representantes no Parlamento e não pela designação exclusiva pelos diretórios partidários;

– na legislação laboral, alinhando-a com a existente nos países europeus mais desenvolvidos.

Nos últimos 20 anos, o PS que governou 13 desses anos e impôs a troika ao país, durante quatro anos, devido à situação de bancarrota que deixou ao Governo do PSD, em 2011, foi incapaz de levar à prática as reformas fundamentais de que o país necessita e de criar as condições para um crescimento sustentado de Portugal.

De 2015 a 2019, o Governo do PS teve condições externas especialmente favoráveis (forte expansão da economia europeia; juros muito baixos devido à politica do BCE; grande crescimento do turismo; preços baixos do petróleo) que desperdiçou, e o que assistimos até hoje é à contínua descida do país no ranking europeu, como atrás se documentou. É certo que houve uma situação pandémica em 2020 e 2021 mas esta situação também se registou nos outros países em relação aos quais nos continuamos a atrasar. Aliás, Portugal, no período da pandemia, teve um dos piores desempenhos a nível económico, sendo o país com a segunda maior queda do PIB face a 2019, dos 38 países da OCDE (fonte: OCDE-Economic Outlook – Dez-2021).

Num artigo anterior há 6 meses, no inicio do atual Governo de maioria absoluta, formulei a opinião de que não poderíamos esperar uma mudança de rumo na ação deste Governo, pelos motivos então apontados, no sentido de colocar o país num patamar de riqueza e de bem estar mais elevado, aproximando-nos dos países mais avançados da UE.

Na realidade, nestes 6 meses, o que assistimos foi à sucessão de casos e polémicas envolvendo ministros e o primeiro-ministro, e à falta de estratégia, de reformas, e de ambição de dar, de forma sustentada, um melhor nível de vida aos portugueses.

É sintomático que tenha sido a sociedade civil (a Associação SEDES) num livro publicado recentemente, a colocar na opinião pública a Ambição de Duplicar o PIB em 20 anos.

Sem ambição, sem ímpeto reformista, gerindo o dia-a-dia na comunicação social para dar a ilusão de que o país está a ser (bem) governador, sem um propósito e uma estratégia que possam mobilizar os portugueses, este Governo continuará apenas a sobreviver e a deixar uma herança pesada para o futuro.