Portugal é último no índice da transparência

Um instituto alemão que analisa a transparência sobre o apoio que os diversos países dão à Ucrânia coloca Portugal no último lugar da lista. O primeiro é ocupado pela Suíça, enquanto os EUA ficam em terceiro lugar. Mas atenção: trata-se da informação que os Estados prestam sobre o assunto e não do auxílio efetivamente concedido.…

por Felícia Cabrita e Maria Moreira Rato

Portugal não gosta de ser escrutinado. Esta é a conclusão que se retira do estudo ‘The Ukraine Support Tracker: Which countries help Ukraine and how?’, publicado em fevereiro pelo Kiel Institute for the World Economy – instituto alemão que se dedica ao estudo de temáticas relacionadas com a globalização e que, desta vez, foi verificar como é que as boas intenções e anúncios de apoio à Ucrânia têm sido levados à prática.

Entre Entre 41 países analisados, Portugal surge nos últimos lugares e é dos menos transparentes, porque praticamente não divulga informações sobre as ajudas ao país de Volodymyr Zelensky.

«O ataque da Rússia à Ucrânia causou sofrimento humano e destruição impressionantes. Desde que a invasão em grande escala começou, muitos líderes ocidentais prometeram ‘ficar com a Ucrânia’ e anunciaram um grande apoio militar e humanitário», recorda-se na introdução do estudo, que vai depois pesquisar números que permitam avaliar qual tem sido a escala do auxílio à Ucrânia, os governos que mais têm ajudado e que tipo de apoios prestaram.

Para isso, o Kiel Institute criou o ‘Ukraine Support Tracker’, um banco de dados relativos ao período compreendido entre 24 de janeiro de 2022 e 15 de janeiro de 2023. Este banco é «baseado exclusivamente em compromissos conhecidos publicamente, portanto, as informações só podem ser tão boas quanto as fontes públicas disponíveis». Tem, porém, um problema: não fica registada a ajuda que não é oficial. Ainda assim, salienta-se que, depois dos primeiros meses de guerra, em que vários governos anunciaram que não partilhariam esta informação – como aconteceu com Finlândia, França, Itália, Japão, Espanha e Portugal –, «a abrangência e a qualidade das informações oficiais desses e outros países aumentou significativamente» ao longo do tempo.

 

Suíça em 1º lugar e EUA em terceiro

Para melhor comparabilidade entre os países, o instituto criou um índice de ‘transparência de dados’, baseado em cinco subíndices, sendo os dois primeiros qualitativos (0-1) e os outros três quantitativos (parcela de itens com informações detalhadas). Deste modo, foi buscar a existência ou não de um site oficial sobre ajuda governamental à Ucrânia, o valor total dos apoios concedidos, informações dos governos, valores de itens anunciados e números de armas divulgados.

A pontuação final do índice por país é a soma desses cinco subíndices. Uma pontuação de 5 é a mais elevada, e sugere total transparência dos dados, enquanto 0 é naturalmente a mais baixa. A pontuação média é de 3,03 pontos, significando já um alto nível de transparência.

A Suíça ocupa o primeiro lugar do ranking, com 5 pontos em 5 possíveis. Quando se pesquisa informação sobre o apoio prestado à Ucrânia desde o início da invasão russa, encontra-se uma quantidade significativa no portal oficial do governo helvético, com separadores a indicar temas distintos, como as relações bilaterais Suíça-Ucrânia ou ‘Questões e respostas acerca da crise na Ucrânia’.

À Suíça segue-se a Dinamarca, com 4,69 pontos. Também este país tem um site sobre a ajuda à Ucrânia que é atualizado regularmente, com links para comunicados do governo.

Os EUA surgem em terceiro lugar, com 4,61 pontos, devido à extensa documentação relativa à sua ajuda à Ucrânia. Não conseguem uma pontuação máxima de 5 porque, por vezes, não divulgam o número exato de itens militares doados.

 

Espanha e Portugal na cauda da tabela

Considerando apenas os países da União Europeia, a média é de 2,84. Na cauda do ranking de transparência estão os países que permanecem opacos na sua comunicação: Espanha e Portugal têm apenas 1,45 e 1,21 pontos, respetivamente, ficando atrás de nações como a Grécia, Roménia (e ainda da Turquia, Índia e China). Os dois países da Península Ibérica não partilharam informações detalhadas sobre os seus pacotes de ajuda e os governos não comunicaram os valores totais de compromisso.

A Polónia, um dos países que mais têm dado a mão à Ucrânia, também tem uma classificação reduzida. Os dados sobre a ajuda do governo polaco são difíceis de encontrar e, muitas vezes, contraditórios. Não há comunicados detalhados do governo nem um site designado, e muitas das informações do Kiel Institute são baseadas em declarações verbais de altos funcionários. «Isto foi anteriormente também válido para a Finlândia ou o Japão, por exemplo, mas estes mudaram a sua política e agora divulgam informações detalhadas, resultando numa pontuação de índice acima da média», explica o relatório.

 Reflexo da opacidade portuguesa foi o que aconteceu esta semana em Estocolmo, onde a ministra da Defesa, Helena Carreiras, numa reunião informal com os homólogos da União Europeia, anunciou que os três carros de combate Leopard 2-A6, que Portugal se comprometera a enviar para a Ucrânia, já estão na Alemanha.

 Na verdade, estes veículos do Exército português saíram do país uma semana antes, num processo envolto em grande secretismo. Estacionados no campo militar de Santa Margarida, os Leopard seguiram para a base aérea de Beja, onde os esperavam dois Antonov AN124, aviões de carga que a Alemanha contratara para o efeito. Em Portugal, não houve então uma palavra sobre o assunto.

Fonte militar contactada pelo Nascer do SOL não estranha: «Este Governo esconde tudo e não se percebe porquê. Os contribuintes portugueses, que pagaram estes carros de combate, só têm conhecimento destas notícias quando os governantes se deslocam ao estrangeiro. Os EUA, por exemplo, todas as semanas publicam as ajudas financeiras ou militares que estão a prestar à Ucrânia».