Buscas a padre revelam pornografia infantil e revólver

PJ recolheu registos informáticos que implicam padre Albino Meireles no acesso a sites de pornografia infantil. Na casa paroquial foi também apreendido um revólver e munições ilegais. Factos apontam para crimes sexuais com pelo menos cinco vítimas.

O padre Albino Meireles, das paróquias de Calvos e Serzedo, em Guimarães, que há uma semana foi detido pela Polícia Judiciária e depois constituído arguido por crimes sexuais contra menores, é suspeito de ter abusado de cinco vítimas, desde pelo menos 2019. Em declarações ao Nascer do SOL, a mãe da vítima que deu origem a esta investigação aponta o dedo ao antigo arcebispo de Braga, D. Jorge Ortiga, e desabafa: «A Igreja deixou-me durante três anos completamente sozinha. Ninguém acreditou em mim. Finalmente foi feita justiça».

 A sua implicação nestes crimes tinha sido revelada por uma reportagem do Nascer do SOL em setembro do ano passado, em que a mãe de uma das vítimas denunciou os abusos do padre relativamente aos seus filhos e se queixou de o então arcebispo de Braga, José Ortiga, a ter ignorado, não tendo feito nada para abrir um processo e afastar Albino Meireles da paróquia ou denunciá-lo às autoridades judiciais. Só três anos depois, a dias de ser substituído por José Cordeiro no cargo, chamou esta mãe, e para lhe fazer um estranho pedido: «Queria que eu dissesse, no caso de alguém me questionar, que sempre tinha tido o seu apoio, o que não é verdade».

Só com a chegada de D. José Cordeiro é que o caso de Albino Meireles acelerou. José Cordeiro, sucessor de Ortiga, encaminhou de imediato o caso para o Ministério Público.

A denúncia desta mãe também chegou, após a reportagem do Nascer do SOL, à Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa. O nome de Albino Meireles é o único de um padre no ativo em Braga que consta da célebre lista entregue pela Comissão Independente.

 

Padre confessou

Segundo o Nascer do SOL apurou, na passada quarta-feira, 29 de março, a PJ fez buscas em três residências: a casa paroquial em Serzedo, a residência do sacerdote e a da sua mãe, ambas em Lousada.

Nessas diligências, a Judiciária recolheu diversas provas, nomeadamente, registos informáticos que implicam o padre no acesso a sites de pornografia infantil. Na casa paroquial foi também apreendido um revólver e munições ilegais.

Albino Meireles, de 45 anos, seria constituído arguido dois dias depois, pelo Ministério Público, por indícios de crimes de abuso sexual de menores, pornografia infantil e posse de arma proibida.

Interrogado pelo Ministério Público, o sacerdote assumiu ter tido sexo com uma das vítimas em causa, mas defendeu que esta já era adolescente à época dos factos, contrariando o que a mesma afirmara.

 Segundo o Nascer do SOL apurou, foram entretanto reunidos factos que incriminam o padre em crimes sexuais com pelo menos cinco vítimas.

Mas, por considerar não estarem preenchidos os requisitos para poder aplicar medidas de coação mais gravosas, o MP decidiu que Albino Meireles vai aguardar em liberdade o desenvolvimento da investigação.

 

José Ortiga poderá ser ouvido

O relato da mãe de uma das vítimas sobre a conduta de José Ortiga poderá levar o antigo arcebispo a ser ouvido no inquérito. A sua inação, e o pedido que fez à mãe para dizer que tratara adequadamente do caso, configura uma situação de eventual encobrimento de crimes.

 No arcebispado de Braga, decorre, entretanto, um inquérito. Albino Meireles está suspenso, impedido de rezar missa, aguardando-se também pela investigação policial.

 Depois da reportagem do Nascer do SOL, em setembro – que além do caso de Alberto Meireles revelou então também os abusos cometidos durante pelo menos duas décadas pelo cónego Fernando Sousa e Silva no confessionário, contra dezenas de crianças de Joane, uma aldeia do distrito de Vila Nova de Famalicão –, o arcebispado de Braga emitiu um comunicado a «pedir perdão» a todas as vítimas. E o arcebispo, José Cordeiro, foi pessoalmente à paróquia de Joane, onde Fernando Sousa e Silva exercera, pedir também perdão e assumir que a Igreja falhara no seu dever de proteção dos menores em causa.

 Esta semana, em entrevista ao jornal i, e quando confrontado com estes dois casos, o arcebispo José Cordeiro escusou-se a comentar, por os processos ainda estarem a decorrer. Mas sempre adiantou: «A Igreja tem de retirar todas as consequências que daí advierem e de ser coerente, ou então não faria sentido. O que vai acontecer ainda é segredo de ofício. Mas na ‘Vos estis lux mundi’ do Papa Francisco (versão atualizada das normas para prevenir e combater os abusos sexuais contra menores e adultos vulneráveis, que introduz mudanças, nomeadamente no que diz respeito à responsabilização dos bispos) fica tudo muito claro. E tudo isso entra em vigor já a partir de 30 de abril».