A frescura de uma monarquia

Em boa verdade, um Rei saberá desempenhar o seu papel com valor e com sucesso independentemente de ser uma figura muito sociável, muito intelectual ou muito inteligente ou arguto. Um Rei desempenhará bem o seu papel desde que saiba bem representar o seu povo e bem defender os interesses do seu País. E para tal…

por Pedro da Costa Mendes
Sócio Partner da Cerejeira Namora Marinho Falcão Sociedade de Advogados

Vamos lá ver: a pura razão de ser da variedade de regimes políticos é o desejo de a sociedade no seu todo viver melhor e construir uma arquitectura que a permita viver melhor. Daí que o que verdadeiramente interessa é vermos de que modo tal felicidade social pode ser atingida.

Escrevo numa altura em que a mais célebre Monarquia do Mundo celebra a coroação de um novo Rei. Todo o “hype” à volta deste evento no Reino Unido da Grã-Bretanha é demonstrativo da influência que esta forma de regime tem ainda em largos sectores da sociedade.

Há uns tempos um conhecido analista social dizia que a maior vitória do republicanismo português não foi conseguir o golpe de estado de 1910 e manter essa forma de regime durante já uns (longos) 113 anos mas, sim, conseguir fazer perpassar a ideia de que os defensores dos regimes monárquicos (e, pior, os defensores de um regime monárquico em Portugal) ou são completamente patetas ou, pior ainda, defendem-no por desejarem desvios à liberdade e democracia.

Esforçar-me-ei, nestas breves linhas, por sublinhar, com serenidade, a falsidade moral do racional acima expandido.

Em primeiro lugar, nunca é demais começar por bem sublinhar que o regime monárquico que se debate é um regime monárquico com base constitucional / parlamentar. Ou seja, as monarquias absolutas já passaram à história e, hoje em dia, todos os Reis na Europa têm funções representativas do Estado, deixando as tarefas da governação para governos nomeados e controlados pelos parlamentos. O Rei é um símbolo do País e a usa a sua capacidade de influência e de representação em prole do povo do seu País. O Rei actua sujeito à constituição, isto é, de acordo com a lei. Não toma decisões baseado na sua livre vontade. Ao soberano cabe o papel de Chefe de Estado, e sua função é garantir o normal funcionamento das instituições da Nação.

Em segundo lugar, convém não esquecer que, só na nossa Europa, mais de 167 milhões de pessoas vivem em países com regimes monárquicos livremente instituídos e aceitam-no com esmagadora maioria. É praticamente um quarto da população europeia, da mais economicamente e sociologicamente desenvolvida do Mundo.

A tal contabilidade não será estranho o facto de serem exactamente esses países que, na Europa e no Mundo, têm maiores índices de literacia e educação, melhor nível de vida, economias das mais estáveis e performantes e ocupam os lugares cimeiros no que respeita a regimes com maior liberdade e maior nível consolidado de democracia.

Será seguramente a estabilidade que a Monarquia aporta à vida e desenvolvimento económico e social desses países que ajuda ao atingimento de tais altos índices.

Em terceiro lugar, a monarquia permite estabilidade pois os Reis não têm de se “vender” em cada período de cinco anos (ou quatro anos), para serem eleitos/reeleitos. Em monarquia, o Rei existe e é preparado para desempenhar o cargo desde a nascença, aceitando a exposição pública e crescendo a defender a sua Nação. O Rei compreende a Nação e o seu povo melhor que qualquer particular que haja conseguido reunir os fundos financeiros e a influência política para organizar com sucesso uma campanha política tendente a uma eleição com Presidente da República.

Em boa verdade, um Rei saberá desempenhar o seu papel com valor e com sucesso independentemente de ser uma figura muito sociável, muito intelectual ou muito inteligente ou arguto. Um Rei desempenhará bem o seu papel desde que saiba bem representar o seu povo e bem defender os interesses do seu País. E para tal passará a preparar-se a sua vida toda. Clara vantagem face ao republicanismo.

Em quarto lugar, um Rei será tanto mais independente das forças políticas e económicas quanto não depender delas para ser o que é. Ao contrário dos Presidentes das Repúblicas, que serão sempre muito mais susceptíveis a estarem condicionados relativamente a tomadas de posição contra as forças de que dependeram para serem eleitos.

Em quinto lugar, em um regime monárquico, o Rei é unificador da sociedade e neutro face às forças políticas em jogo – um Rei não se imiscui no xadrez partidário. Ao contrário, em Portugal os Presidentes da República ou foram militares ou foram antigos líderes partidários…. Quod erat demonstrandum

Em sexto lugar, debaixo de um regime monárquico, os assuntos são tratados com um maior horizonte e continuidade estratégica, ficando livres do imediatismo e pressão de resultados coincidentes com o mandato presidencial.

Em sétimo lugar, o elemento histórico e simbólico: nos últimos anos da nossa monarquia parlamentar, ainda sob El-Rei Dom Carlos, a liberdade de expressão, no parlamento, na rua e na imprensa era muito maior do que com a I República em que padres, católicos e monárquicos e de uma maneria geral todos os que não concordavam com o novo regime, foram amordaçados pela censura e perseguidos impiedosamente. Terá sido, aliás, essa tal liberdade de expressão e de reunião que permitiu, paradoxalmente a difusão dos ideais anarquistas republicanos que mais tarde seriam os impulsionadores do golpe republicano.

E desenganem-se os que pensam que hoje a república já não é tão castradora da liberdade: o artigo 288º da Constituição da República Portuguesa em vigor (de notar que, com a República, o nosso Pais deixou de se chamar Portugal para se chamar República Portuguesa…) proíbe de forma radical que se possa submeter sequer à votação da população, em referendo, a escolha entre um regime monárquico e um regime republicano….

Todos os argumentos acima no sentido de ser preferível uma Monarquia a uma República são facilmente perceptíveis como sendo de molde a potenciar uma maior frescura à nossa democracia, permitindo-me parafrasear Miguel Esteves Cardoso quando escreveu que a Monarquia é uma respiração (cito de cor).

Falta a frescura à República que sobeja à Monarquia. Só será surpresa para alguns….