Eu, fumador me confesso

Mas agora o Estado, ou melhor, a corja que se apoderou da sua cúpula, resolveu pôr os olhos em mim e naqueles que, como eu, se divertem a poluir o planeta, avançando com uma série de medidas que visam tornar os fumadores nuns fora-da-lei.

Reconheço que não tenho emenda. Sou monárquico, conservador, católico, amante das Corridas de Touros e apreciador de um bom bife e de um bom vinho!

Sou, portanto, um proscrito à luz do pensamento que uma minoria, com a cumplicidade da maioria silenciosa, nos procura impor.

Para ajudar à festa, ainda por cima sou branco e heterossexual.

Ou seja, e até prova em contrário, a qual terei que ser eu próprio a apresentar o seu ónus, sou um racista e um homofóbico!

E, claro está, um pervertido, por admirar a beleza feminina, fazendo com que ao passar por uma banca de revistas, daquelas que ainda existem em muitas das nossas ruas, seja para as capas enfeitadas por mulheres que olho, não prestando qualquer atenção às que dão esse protagonismo a homens.

Enfim, sou um caso perdido para os guardiões dos novos dito bons costumes a que nos querem subjugar à força.

No entanto, esses sacrilégios de que sou diariamente acusado de praticar em nada se comparam ao pior de todos, aquele que faz de mim um verdadeiro perigo para a sobrevivência dos meus pares: sou um fumador!

Sim, ponho em perigo a vida de qualquer inocente que se cruze comigo, porque o infecto com a baforada que exalo por via do maldito tabaco que insisto em exibir.

Mas, pior ainda, não me contento em poluir o planeta com cigarros, coisa a que nunca liguei, mas sim cometo os meus pecados mortais com o recurso a charutos.

Pois, é verdade, sou fumador, mas de charutos!

Esta constatação faz de mim um ser ainda mais execrável do que se poderia imaginar, porque, não satisfeito em tentar inviabilizar um crescimento saudável dos nossos jovens, condenando-os a uma doença de cujos efeitos deveria ser apenas eu, e os outros pecadores do meu timbre, a carregar, me delicio com um produto que não está ao alcance da bolsa de qualquer um.

Por isso, apesar de não o ser, com grande pena minha, ainda sou rotulado de rico!

E masoquista, porque fumando apenas charutos, faço-o somente por prazer e não por vício.

Delicio-me com um charuto quando me apetece, normalmente para desfrutar de um momento que me satisfaça a alma, e não por uma qualquer obrigação a que esteja agarrado, do tipo daquelas a que os viciados em drogas duras estão presos.

Se fosse um dependente do fumo e dele não me conseguisse libertar, ainda poderia ser alvo de alguma comiseração por parte de todos quantos sofrem com os meus desvarios, mas como o que me move é apenas e só o prazer, não passo de um maníaco que se diverte à custa do sofrimento alheio.

Mas agora o Estado, ou melhor, a corja que se apoderou da sua cúpula, resolveu pôr os olhos em mim e naqueles que, como eu, se divertem a poluir o planeta, avançando com uma série de medidas que visam tornar os fumadores nuns fora-da-lei.

Vamos ser condenados a fumar apenas às escondidas e longe das autoridades, caso não queiramos ser capturados pelos tentáculos da justiça.

O Estado proteccionista e omnipresente está apostado em que os cemitérios sejam habitados exclusivamente por gentes saudáveis, pelo que a sua obsessão passa pela erradicação do fumo venenoso que uns tantos tarados insistem em inalar.

O mesmo Estado que permite que uma Mãe, arrependida de carregar dentro de si uma criança, possa terminar com a vida desta, antes mesmo que ela possa ver a luz do dia, na maioria dos casos só porque sim.

O mesmo Estado que consente e presta assistência a quem queira pôr termo à sua própria vida.

O mesmo Estado que deixa que um adolescente, confuso quanto à sua sexualidade, possa provocar danos irreversíveis no seu corpo, com o propósito irrisório de o dotar de características opostas às que recebeu à nascença.

O mesmo Estado que confia crianças de tenra idade à guarda de casais homossexuais, somente com a finalidade de satisfazer a estes o capricho de serem pais, impossibilitando que aquelas possam ser educadas e crescerem no seio de uma família tradicional.

O mesmo Estado que autoriza que se consumam drogas duras, criando espaços onde os toxicodependentes o possam fazer livremente.

E tudo isto, porque este mesmo Estado entende que a cada um deve ser concedida a liberdade de fazer o que bem lhe apetece quando o comportamento escolhido viole as leis da natureza, mas recusa-se a autorizar que os seus súbditos disponham do livre arbítrio de fumar, vício ou prazer que apenas os afecta a eles, se praticado ao ar livre ou em locais exclusivos e destinados para esse efeito.

Mas há um subterfúgio tenebroso por detrás destas manobras governamentais para reduzir drasticamente a venda e o consumo de tabaco que, na maioria dos localidades, pelo seu afastamento dos grandes centros urbanos, implica, na prática, uma proibição, que mais não é do que pôr em prática a obsessiva ideia ideológica de que somos todos iguais.

Se muitos não podem fumar, então ninguém fuma!

Visão que vai na mesma linha do pensamento de nivelar a sociedade por baixo, partindo-se do pressuposto de que se não podemos ser todos ricos, nesse caso teremos que ser todos pobres.

É o triunfo da sociedade sem classes, preconizado por Marx!

Da minha parte, dispenso a carinhosa protecção estatal que generosamente me é oferecida. Não me quero tratar, quero apenas que me deixem fumar em paz, desde que, obviamente, o faça sem prejudicar a saúde de quem não comunga dos mesmos prazeres daqueles que me satisfazem!

Fumar é um direito igual a todos os outros constitucionalmente protegidos.

Deixem-se de proibições!