Mariana Mortágua “deixou claro a manifestação do desejo de cavalgar a onda de insatisfação da rua”

Nova líder do BE diz que “recuperação eleitoral do Bloco de Esquerda será feita à custa do Partido Socialista e do Partido Comunista Português”. 

Mariana Mortágua é o novo risco de liderança do Bloco de Esquerda, substituindo Catarina Martins.  Eleita este domingo, durante a XIII Convenção Nacional do partido, no domingo, afirmou estar preparada para "resgatar o país deste jogo vicioso" que atribuiu à maioria absoluta do Partido Socialista, assumindo que o compromisso do partido será "a luta pela vida boa", vida essa "que não seja consumida pelo esforço inglório do mínimo dos mínimos, que é ter uma casa, um salário decente, cuidados na doença, quando tivermos filhos, quando a idade pesar aos nossos pais".

A nova coordenadora arrecadou 67 dos 80 mandatos no órgão máximo do BE entre convenções, enquanto a moção adversária, de Pedro Soares, amealhou apenas 13. Uma vitória que não causou surpresa ao politólogo José Filipe Pinto. “Mariana Mortágua chega a Coordenadora do Bloco de Esquerda através de um processo de sucessão anunciada, uma vez que contou com o apoio não só da esmagadora maioria dos delegados, mas também da líder cessante, Catarina Martins, e dos pais fundadores do partido referidos por um deles, Fernando Rosas, como a sua infantaria. Este apoio decorre, sobretudo, da sua presença assídua no espaço mediático e da imagem de rigor que construiu enquanto deputada, sobretudo no que concerne à sua participação nas Comissões Parlamentares de Inquérito. Será caso para dizer que o Bloco de Esquerda concedeu uma espécie de estágio a Mariana Mortágua e como o resultado foi positivo, aposta na sua combatividade como energia renovadora”, disse ao i.

O especialista refere ainda que Mariana Mortágua recebe o partido “numa situação quase dramática porque a perda de mais de metade do eleitorado em 2022 consubstanciou-se na passagem de 19 deputados para apenas cinco”. Uma quebra que, no seu entender, tem “inevitáveis reflexos negativos nos cofres do partido e que levou à dispensa de um número significativo de funcionários e de prestadores de serviços”. E acrescenta: “A dificuldade sentida na campanha para angariar os fundos necessários para a realização da Convenção constitui prova dessa dificuldade financeira. Longe vão os tempos em que o Bloco de Esquerda tinha capacidade financeira para assumir a responsabilidade pelos saldos negativos dos seus candidatos presidenciais. A título de exemplo, em 2006, o BE pagou 66.948,06 euros relativos à candidatura de Francisco Louçã”.

Desafios que se seguem

Ao nosso jornal, José Filipe Pinto refere que no seu discurso de tomada de posse, “apesar de identificar as sementes de ódio do populismo de direita como o principal inimigo, Mariana Mortágua deixou implícito que a recuperação eleitoral do Bloco de Esquerda será feita à custa do Partido Socialista e do Partido Comunista Português. Daí a atitude muito crítica da atuação do Governo de António Costa e também, por isso, a manifestação do desejo de cavalgar a onda de insatisfação da rua”.

E face a esse cenário, o politólogo acredita que “se a isso for adicionado o ativo que o BE reivindica relativamente à sua participação na geringonça, torna-se difícil acreditar que a estratégia de Mariana Mortágua passe por um relacionamento potencializador da formação de um projeto da responsabilidade de uma maioria de esquerda que inclua o BE. Aliás, o discurso é marcado por inegáveis marcas utópicas, pois Mariana Mortágua apresenta-se como a condutora do novo projeto”.

Já em relação ao lema da nova Coordenadora que assenta em duas ideias-chave: levar o país a sério e lutar pela vida boa, o especialista defende que a sua estratégia passará por aquelas que têm constituído as principais bandeiras do Bloco de Esquerda, designadamente: a aposta na valorização da escola pública, a revitalização do Serviço Nacional de Saúde, a alteração das leis laborais, no sentido do combate à precariedade e aos baixos salários, e a proteção às minorias, aos imigrantes e aos refugiados.

E não fica por aqui. “Além disso, continuará a cultivar a imagem de defensora intransigente do interesse público e trará para o plano da discussão pública todos os assuntos suscetíveis de serem classificados como fraturantes ou que contribuam para delapidar a imagem do Governo”, conclui ao i.

Reações

António Costa felicitou Mariana Mortágua, afirmando que um "diálogo construtivo e uma ação comum para o progresso de Portugal e a melhoria da vida dos portugueses".

Já André Ventura defendeu que o partido elegeu "o pior que a política tem", afirmando que, "além da apropriação ilegal de dinheiro público (que teve de devolver), Mortágua tem um profundo ódio às empresas e aos empresários, desprezo pelos portugueses comuns e uma obsessão doentia com minorias".

Por seu vez, Rui Tavares elogiou o Bloco "pela sua convenção e pela determinação renovada nas causas de progresso, justiça e igualdade".