– Não está avariada, está desligada -foi a resposta seca da mulher.
– Desligada? – surpreendi-me. – Porquê?
– Tem de ser – respondeu outra vez laconicamente a mulher, enquanto metia na boca outra colher de iogurte.
Fiquei sem perceber a razão do ‘tem de ser’. Por causa dos assaltos? Mas então não deveriam retirar a máquina em vez de estar ali a fazer figura de corpo presente e a enganar os incautos?
E, para a funcionária, não seria preferível ser mais amável em vez de afivelar uma cara de poucos amigos? Eu sei que atender o público deve ser muito chato e que há pessoas insuportáveis. Mas então, quando aparece uma pessoa mais simpática – como tentei ser – a fazer uma pergunta com bons modos, não era uma oportunidade para a funcionária mostrar o seu lado amável?
Lembrei-me de outra situação recente relacionada com o atendimento público. Fui a um departamento do Estado tratar de um assunto do meu interesse. Telefonei antes e perguntaram se não queria marcar.
– Claro que sim! – respondi. – Não sabia que podia marcar-se; mas sendo possível, tanto melhor.
Cheguei antes da hora marcada, disse na receção ao que ia, esperei uns 5 minutos e o segurança mandou-me subir:
– Ainda não está na sua hora, mas como a marcação anterior faltou…
Num pequeno gabinete estava uma funcionária dos seus 50 e tal anos, cabelos grisalhos, rosto macerado, ar sofrido.
Cumprimentou-me com amabilidade. Expliquei o que pretendia. Consultou o computador, viu uns dados, fez-me umas perguntas e depois informou:
– Preciso de uma fotocópia do seu Cartão de Cidadão e de uma declaração bancária. Ao virar da esquina há uma casa de fotocópias e do lado contrário, depois do quiosque dos jornais, há uma agência do seu banco.
Saí. Passados uns dez minutos voltei com a documentação pedida. A senhora estava à minha espera. Recebeu os papéis, deu-me uns documentos para assinar, informou-me sobre o desenvolvimento do assunto que me levara ali. Pouco tempo depois eu estava despachado. À despedida, achei-me na obrigação de dizer:
– A senhora foi muito eficiente e muito simpática.
Ao que ela respondeu:
– O senhor também foi muito simpático.
Ficámos assim.
E se fosse assim com toda a gente, penso que andaríamos muito mais felizes. Se houvesse um esforço por parte dos funcionários para serem agradáveis, prestáveis, usarem o sorriso, também possivelmente os utentes não seriam tão chatinhos, impertinentes ou mesmo malcriados. Tudo correria melhor.
Ora, talvez isto se possa treinar. Na formação dos funcionários (públicos e privados) deveria haver uma alínea especificamente dedicada ao comportamento a ter no atendimento ao público. E já agora, no processo de seleção, deveria existir a preocupação de identificar as pessoas com melhores condições naturais para o desempenho dessa função.
Pelo menos, deveria haver o cuidado de não selecionar pessoas com mau feitio. Pessoas zangadas com a vida. Propensas a atenderem clientes enquanto comem displicentemente iogurtes e a responderem por monossílabos a perguntas educadas. Como se estivessem a fazer um grande favor a quem, depois de se dirigir a uma máquina desligada porque “tem de ser”, se vê obrigado a recorrer ao pagamento manual. Pagamento manual que, diga-se de passagem, é a razão de ser do posto de trabalho que aquela funcionária ocupa…