Perguntei-lhe o que achava do Governo, sabendo de antemão que não me responderia: Cavaco, em sociedade, sempre foi muito reservado, não se expondo a dar abertamente opiniões sobre política.
Assim, disse-me apenas: «Sabe, no Governo, o importante são os sinais que se dão…».
E não adiantou mais nada.
Percebi que a frase era uma crítica velada ao Governo.
Ou seja, Cavaco achava que o Governo estava a dar ao país os sinais errados.
A situação financeira era muito frágil, Durão Barroso e Manuela Ferreira Leite tinham tomado medidas duras de contenção orçamental, e o Governo de Santana Lopes transmitia a ideia de que era possível começar a desapertar o cinto.
Ora, se Santana Lopes, deu os sinais errados, António Costa está a dar os sinais erradíssimos.
Por convicção própria e por pressão da extrema-esquerda, Costa passa a mensagem de que é possível ou mesmo necessário andar para trás em tudo, desde a eliminação dos exames à reposição dos rendimentos.
Alguns cortes e aumentos de impostos que tinham levantado grande contestação mas já estavam ‘assimilados’ vão ser estupidamente revertidos.
A privatização dos transportes públicos urbanos vai ser denunciada.
A da TAP idem.
A última bola a sair do saco foi a capitalização do Novo Banco à custa dos chamados ‘investidores seniores’, isto é, dos grandes fundos de investimento, onde estão aforradores de todo o mundo.
É certo que esta medida foi determinada pelo Banco de Portugal – e, se calhar, não havia alternativa.
Mas corre o risco de ser vista lá fora como um gesto hostil do Estado português em relação ao capital estrangeiro.
Julgo que a Europa (e o mundo) começa a olhar para Portugal com perplexidade.
Depois de uma inusitada solução de Governo assente nos votos do Partido Comunista e de um partido de esquerda radical, vem a decisão de reverter todas as medidas de austeridade.
Todas as privatizações.
O capital estrangeiro é maltratado – o que já suscitou protestos diplomáticos.
Num dia, Mário Centeno vai a Bruxelas sossegar os parceiros europeus – mas no dia seguinte António Costa, na mesma capital belga, diz que a TAP voltará para as mãos do Estado a bem ou a mal.
Quem pode acreditar em Portugal?
E há mais.mmmmmmmmm
Sempre que aparece um problema num setor, como aconteceu agora nos hospitais, culpa-se o Governo anterior por ter feito cortes ‘que não devia’ – como se a poupança de dinheiros públicos fosse um crime.
E a seguir devolve-se o que foi ‘roubado’ aos trabalhadores.
Os médicos e os enfermeiros exigem mais dinheiro – e tê-lo-ão.
E atrás deles virão outros.
Virão os polícias, os militares, os professores, etc.
Os preços dos transportes públicos não subirão – mas os salários dos respetivos trabalhadores serão aumentados, para não fazerem greves.
Onde é que isto vai parar?
Os sinais que o Governo está a dar, para dentro e para fora, estão todos errados.
E julgo que o próximo Orçamento, cuja entrega foi adiada, já vai ser um exercício dificílimo.
Claro que o atordoado ministro das Finanças pode sempre, a cada nova despesa que aparece, dizer que ela será coberta pelo aumento da cobrança de impostos decorrente de um maior crescimento da economia.
É assim que ele tem feito todas as contas.
Aplica um fator multiplicador maior nos resultados da atividade económica – e tudo dá sempre certo.
Qualquer dia estamos a crescer a dois dígitos ao ano, como a China nos anos dourados.
Mas para lá dos riscos enormes que este exercício comporta – porque, se o crescimento económico previsto não se confirmar, haverá um buraco gigantesco nas contas do Estado –, dificilmente passará em Bruxelas.
A Comissão Europeia já veio dizer que a periclitante situação financeira portuguesa «ainda não permite políticas expansionistas», isto é, ainda exige medidas de austeridade e não pode assentar no crescimento da economia.
António Costa continuará a apostar na fuga para a frente – e ainda só vai no princípio.
Mas vai chegar a um ponto em que, tal como Sócrates, à sua frente só terá o abismo.
P.S. – Os debates presidenciais têm sido de uma pobreza franciscana. O PR não governa, mas tem de ter uma ideia sobre as grandes questões do país e do futuro. Se não, de que serve um Presidente? Ora os candidatos ou têm andado a discutir questões que não são da sua competência (como o Banif) ou dizem o que fizeram: «Eu sou empresário e assinei contratos», «eu sou professor e ensinei alunos», «eu sou gestora e geri grandes organizações»… Ridículo! O único debate aceitável (entre Nóvoa e Marcelo) não teve, ainda assim, grande substância.