Sinais

Era primeiro-ministro Pedro Santana Lopes quando, numa festa de casamento, fiquei sentado ao lado de Cavaco Silva – que na altura estava fora da política.

Perguntei-lhe o que achava do Governo, sabendo de antemão que não me responderia: Cavaco, em sociedade, sempre foi muito reservado, não se expondo a dar abertamente opiniões sobre política.

Assim, disse-me apenas: «Sabe, no Governo, o importante são os sinais que se dão…».

E não adiantou mais nada.

Percebi que a frase era uma crítica velada ao Governo.

Ou seja, Cavaco achava que o Governo estava a dar ao país os sinais errados.

A situação financeira era muito frágil, Durão Barroso e Manuela Ferreira Leite tinham tomado medidas duras de contenção orçamental, e o Governo de Santana Lopes transmitia a ideia de que era possível começar a desapertar o cinto.

Ora, se Santana Lopes, deu os sinais errados, António Costa está a dar os sinais erradíssimos.

Por convicção própria e por pressão da extrema-esquerda, Costa passa a mensagem de que é possível ou mesmo necessário andar para trás em tudo, desde a eliminação dos exames à reposição dos rendimentos.

Alguns cortes e aumentos de impostos que tinham levantado grande contestação mas já estavam ‘assimilados’ vão ser estupidamente revertidos.

A privatização dos transportes públicos urbanos vai ser denunciada.

A da TAP idem.

A última bola a sair do saco foi a capitalização do Novo Banco à custa dos chamados ‘investidores seniores’, isto é, dos grandes fundos de investimento, onde estão aforradores de todo o mundo.

É certo que esta medida foi determinada pelo Banco de Portugal – e, se calhar, não havia alternativa.

Mas corre o risco de ser vista lá fora como um gesto hostil do Estado português em relação ao capital estrangeiro.

Julgo que a Europa (e o mundo) começa a olhar para Portugal com perplexidade.

Depois de uma inusitada solução de Governo assente nos votos do Partido Comunista e de um partido de esquerda radical, vem a decisão de reverter todas as medidas de austeridade.

Todas as privatizações.

O capital estrangeiro é maltratado – o que já suscitou protestos diplomáticos.

Num dia, Mário Centeno vai a Bruxelas sossegar os parceiros europeus – mas no dia seguinte António Costa, na mesma capital belga, diz que a TAP voltará para as mãos do Estado a bem ou a mal.

Quem pode acreditar em Portugal?

E há mais.mmmmmmmmm                 
   Sempre que aparece um problema num setor, como aconteceu agora nos hospitais, culpa-se o Governo anterior por ter feito cortes ‘que não devia’ – como se a poupança de dinheiros públicos fosse um crime.

E a seguir devolve-se o que foi ‘roubado’ aos trabalhadores.

Os médicos e os enfermeiros exigem mais dinheiro – e tê-lo-ão.

E atrás deles virão outros.

Virão os polícias, os militares, os professores, etc.

Os preços dos transportes públicos não subirão – mas os salários dos respetivos trabalhadores serão aumentados, para não fazerem greves.

Onde é que isto vai parar?

Os sinais que o Governo está a dar, para dentro e para fora, estão todos errados.

E julgo que o próximo Orçamento, cuja entrega foi adiada, já vai ser um exercício dificílimo.

Claro que o atordoado ministro das Finanças pode sempre, a cada nova despesa que aparece, dizer que ela será coberta pelo aumento da cobrança de impostos decorrente de um maior crescimento da economia.

É assim que ele tem feito todas as contas.

Aplica um fator multiplicador maior nos resultados da atividade económica – e tudo dá sempre certo.

Qualquer dia estamos a crescer a dois dígitos ao ano, como a China nos anos dourados.

Mas para lá dos riscos enormes que este exercício comporta – porque, se o crescimento económico previsto não se confirmar, haverá um buraco gigantesco nas contas do Estado –, dificilmente passará em Bruxelas.

A Comissão Europeia já veio dizer que a periclitante situação financeira portuguesa «ainda não permite políticas expansionistas», isto é, ainda exige medidas de austeridade e não pode assentar no crescimento da economia.

António Costa continuará a apostar na fuga para a frente – e ainda só vai no princípio.

Mas vai chegar a um ponto em que, tal como Sócrates, à sua frente só terá o abismo.

               

P.S. – Os debates presidenciais têm sido de uma pobreza franciscana. O PR não governa, mas tem de ter uma ideia sobre as grandes questões do país e do futuro. Se não, de que serve um Presidente? Ora os candidatos ou têm andado a discutir questões que não são da sua competência (como o Banif) ou dizem o que fizeram: «Eu sou empresário e assinei contratos», «eu sou professor e ensinei alunos», «eu sou gestora e geri grandes organizações»… Ridículo! O único debate aceitável (entre Nóvoa e Marcelo) não teve, ainda assim, grande substância.

jas@sol.pt