com as sondagens em paris a apontar para uma derrota de nicolas sarkozy na segunda volta das presidenciais francesas, o governo de passos coelho mantém-se distante da contenda, mas desconfiado dos efeitos da entrada de um socialista no palácio do eliseu. à partida, passos coelho e a máquina diplomática do governo mostram uma preocupação com a agitação que tal vitória pode provocar nos mercados: «frança está hoje sob vigilância dos mercados e tem que atingir os seus objectivos para que o seu rating não desça novamente. e não pode deixar isso acontecer», sob pena de criar uma enorme turbulência não só em paris, mas em toda a europa.
o caso francês é, de facto, delicado – o que tem sido acentuado na imprensa internacional durante toda a semana, depois da vitória de hollande na primeira volta, realizada domingo. com um nível de endividamento próximo dos 90% e uma despesa pública de 53% do pib, paris ficou nos últimos meses também sob observação dos mercados – sofrendo já uma inédita redução do ‘rating’ da república.
hollande, o candidato socialista, apostou tudo numa mensagem de mudança. na quarta-feira anunciou que enviará, se vencer, uma carta aos líderes europeus pedindo um “pacto para o crescimento”, a emissão de obrigações europeias para grandes projectos e também uma austeridade menos acentuada na europa. a questão da semana foi esta: a linha de hollande criará instabilidade? as bolsas agitaram-se já no início da semana mas, acentuava o socialista manuel maria carrilho ontem no dn, o teste decisivo está marcado para dia 6 de maio, numa 3ª volta das presidenciais, que é «a volta dos mercados».
por tudo isto, em são bento há uma expectativa: a de que, apesar do tom da campanha, hollande acabará ‘preso’ pela situação financeira de frança. ou seja, que a um duo ‘merkozy’ se seguirá um ‘merkollande’, sem que o rumo austero da europa mude uma linha. «qualquer que seja o resultado não vejo que nas grandes questões possa ter hoje um posicionamento diferente», diz ao sol fonte de s. bento.
sem constrangimentos diplomáticos, outros dirigentes da maioria afinam pelo mesmo tom: «não acredito que haja uma alteração profunda se hollande vencer», diz ao sol luís montenegro, acrescentando que «um novo governo francês não vai, com certeza, rasgar o tratado». nuno magalhães, do cds, corrobora: «quem valoriza de forma excessiva essas eleições pode vir a ter uma desilusão, quer pelos resultados em si, quer porque as consequências dos resultados que mais lhes agradariam podem não ser as esperadas».
já o vice-presidente da assembleia da república guilherme silva considera que «mesmo que haja uma reviravolta o espaço de manobra de um novo governo será muito reduzido no contexto actual» e «as exigências europeias vão impor-se dominantemente».
hollande: apoiantes surpresa
mas à direita, também há quem torça pela vitória de hollande. «para a europa, pode ser benéfico», defende ao sol o deputado miguel frasquilho, realçando que o socialista francês defende um reforço do papel do banco central europeu (bce) e é contra «a austeridade colectiva» nos vários países europeus. «só o bce pode salvar a europa», insiste, porque uma mudança em frança abalaria a «intransigência da sra. merkel».
no fundo, frasquilho diz subscrever as palavras de marcelo rebelo de sousa, que no domingo deixou um surpreendente «felizmente não sou francês» no habitual comentário de domingo. uma forma de assumir que poderia acabar por votar à esquerda.
europa fora, os vários governos – esmagadoramente de direita – têm mostrado prudência semelhante à de lisboa face a mudanças em paris. mas com variantes no tom. em espanha, o governo de mariano rajoy tem deixado nas entrelinhas que uma vitória do socialista hollande podia dar outro conforto à estratégia espanhola de pedir mais tempo para a consolidação orçamental. de itália surgem mensagens idênticas.
na quarta-feira, hollande chamou a si uma vitória depois do presidente do bce ter apelado a um pacto para o crescimento na europa. mas o discurso foi lido por merkel como um apoio à sua estratégia de reformas nos países do euro para estimular a competitividade e não para novos estímulos orçamentais, como os que pedem os socialistas europeus.
david.dinis@sol.pt, helena.pereira@sol.pt e sofia.rainho@sol.pt